SINDICALISMO DE LOBBY
NÃO FAZ MEA-CULPA
DANIEL LIMA - 13/12/2024
Veja só a situação dos metalúrgicos de São Bernardo, berço histórico do sindicalista Lula da Silva e bravos companheiros de jornadas: entre desfilarem uma mistura de verdades, meias-verdades e mentiras inteiras, e, alternativamente, assumirem mea-culpa no processo de desindustrialização continuada e grave do Grande ABC, a opção preferencial e única é pela primeira alternativa.
O diversionismo em forma de negacionismo subjacente da derrocada regional está na mídia descuidada, quando não despreparada, caso não seja militante ou cumplice. A ordem unida nestes tempos abusados de polarizações cegas é levar à sociedade informações enviesadas e protetivas a interesses específicos.
Informação com ponto e contraponto, com versão e contraditório, virou preciosidade, uma relíquia de malucos dispostos a enfrentarem incendiários de reputações pagos em muitas situações com dinheiro público de gestores medíocres. Poderiam, esses malucos, entregar os anéis, os dedos e a própria alma, inclusive para encher os bolsos.
ASSUMIR OS EXCESSOS
Não custaria nada aos sindicalistas dizerem o que todo mundo sabe: o experimento do capitalismo de grandes corporações no Brasil, tendo o Grande ABC como palco da indústria automotiva protegidíssima pelo Estado, gerou sim relações estressantes sob diversos pontos de vista no campo trabalhista.
Por isso, vivenciamos rescaldos permanentes tanto do que se configurou cobrança exacerbada por um padrão trabalhista minimamente decente nos chãos de fábricas quanto também pelos efeitos colaterais de desindustrialização aguda.
O capital sempre esperto desloca-se a endereços mais diplomáticos nas relações trabalhistas e festivos em vantagens locacionais. Tudo que o Grande ABC perdeu em termos de vantagens comparativas e competitivas.
Traduzindo tudo isso? É absolutamente estúpido fazer malabarismos semânticos, quando não contraproducentes à realidade dos fatos, para dizer ao distinto público que o Grande ABC é um paraíso da indústria nacional porque seria, seria, seria, seria (repito propositadamente) o segundo “município” industrial do País, um métrica sem bases de coerência.
DANOS IRRECUPERÁVEIS
Só não rio dessa bobagem comprada pelos jornais descuidados (é um direito dos sindicalistas defenderem suas cores, mesmo com caradurismo, mas a mídia precisa tomar vergonha na cara e trabalhar tecnicamente para não levar descaramento aos leitores) porque respeito a mortandade e a fuga de milhares de empregos e empreendimentos que deixaram vazio irrecuperável na região. Sobremodo pequenas empresas.
O que se vê em seguida, com o noticiário que reproduzo, é que se trata de um movimento deliberadamente doutrinado a fundamentar duas premissas incompatíveis com os fatos históricos. Primeiro, que a indústria de transformação nacional é uma maravilha. Segundo, que o Grande ABC, particularmente o Grande ABC, é um quase-paraíso industrial.
No primeiro caso, estudos nacionais e internacionais apontam com severidade quanto a indústria de transformação do produto foi reduzida no País nos últimos 40 anos. Uma barbaridade. A participação relativa interna nas matrizes de riqueza caiu mais que à metade.
No segundo caso, como palco iluminado no interior dessas perdas por falta de investimentos privados e públicos, ou seja, de competitividade nacional e internacional, o Grande ABC se tornou um estudo à parte.
DUPLO DESABAMENTO
O PIB do Grande ABC, tanto Geral quanto Industrial, não caiu por obra e graça do acaso. Desabamos ao longo dos anos tanto em participação relativa quanto em participação absoluta.
Houve breve alvorada durante o segundo mandato de Lula da Silva, recuperando praticamente tudo que foi levado pelos oito anos destrutivos de Fernando Henrique Cardoso de 85 mil baixas industriais com carteira assinada.
Entretanto – e não há sinais do noticiário oficialesco de que se tenha dado destaque ao que se segue – vieram os danos de Dilma Rousseff , antecedidos de rescaldos dos excessos de gastos de Lula da Silva. Conhecemos a maior recessão da história, com recorde nacional: perdemos 22% do PIB entre 2015-2016, enquanto a média nacional mal passou de 7%.
O material reproduzido pelos jornais híbridos (papel e digital) ou apenas digital não faz qualquer referência à cronologia dos fatos e dos números que o embate democrático de informações exige. Como estou acionando a Internet e vou ter acesso ao documento, não deixarei de promover uma devassa no final de semana.
CONCEITO ENGANOSO
O conceito geoeconômico utilizado nos estudos para caracterizar o Grande ABC como segundo “município” com maior poder de fogo da indústria de transformação do País é coisa do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Propagandismo puro. Sem condicionantes das relações entre capital e trabalho.
Ao mesmo tempo em que juntam os sete municípios locais como município único (não se trata de um equívoco, muito pelo contrário), o estudo não segue a mesma metodologia em outras geografias igualmente ou até mesmo mais conversíveis ao critério de metropolização ou aglomerado econômico. Faz-se portanto uma jogada mais que manjada de dois pesos, duas medidas, que, aliás, o jornalismo regional usa e abusa quando se trata de PIB e mesmo de outros indicadores.
Vou dar um exemplo prático: as regiões metropolitanas de Campinas, Sorocaba e São José dos Campos (só para ficar nos casos interioranos) extraíram do Grande ABC caudalosos investimentos industriais, tanto das unidades que aqui estavam instaladas quanto de novos players. Nossa competitividade logística é um desastre. Estou cansado de escrever sobre isso.
MUITO DESPREPARO
Ainda há gente despreparada em posição de comando ou mesmo de auxiliar de comando que não se atualizou sobre o conceito de logística ligada à competitividade. Acham que logística é a menor distância entre dois pontos. Logística é a maior competividade entre dois ou mais pontos.
A tentativa mais que evidente de conceber ao Grande ABC o título de “segundo município mais industrializado do País” é uma jogada de subjetividade defensável por parte de quem a utiliza para limpar a barra do passado que se espalhou pelo presente, no caso os metalúrgicos, mas que, comprada pela mídia, acriticamente, só revela o despreparo ao contraponto exigido pelos leitores.
Sorte de muitos fraudadores informativos é que nem sempre o leitor que reclama de 10 centavos de acréscimo irregular numa conta em supermercado tem o mesmo grau de exigência ao acompanhar passivamente as malandragens do noticiário viciado.
Pior que cair no conto da carochinha de “segundo município industrial mais importante do Pais” é, sem base histórica, sem apetrechamento cultural, transformar a informação enviesada em breve análise repleta de lantejoulas triunfalistas. Mas é assim que a banda toca.
EIXO EXISTENCIAL
Portanto, os leitores de publicações enfeitiçadas por versões alinhadas com o poder do momento e, portanto, sem compromisso com a própria história, que se danem. Mesmo que esses leitores, embora sem a frequência imperativa dos acontecimentos, tenham sido contemplados aqui e ali, ao longo dos tempos, com noticiário inteiramente contrários aos enunciados sindicais mais que tortuosos.
O que alguns pouco lúcidos na interpretação histórica do movimento sindical do Grande ABC ainda não perceberam, e não perceberam porque são estúpidos ou porque são de caráter duvidoso, é que tanto CapitalSocial quando LivreMercado, revista de papel que circulou durante 20 anos na região, e que estão unidas neste site, jamais chegaram ao cúmulo de afirmar que a indústria de transformação não é importante para o Grande ABC.
Diferentemente disso: por provar ao longo de uma trajetória de 35 anos que a indústria é o eixo existencial de um Grande ABC invejável nos bons tempos e preocupante desde muitos anos, o tema reveste-se de pauta crítica obrigatória e também civilizatória.
“Desindustrialização”, utilizada pela primeira vez neste endereço e na mídia nacional em referência à situação do Grande ABC na edição inaugural de LivreMercado, em 1990, foi reiteradamente negada durante muito tempo. E até hoje, na subjetividade de manchetes, torna tudo muito patético. Cair no lobby sindical é uma coisa. Cair em contradição é muito pior. Ainda mais quando a contradição é a negação do próprio espelho de fragilização provocada pela perda do viço industrial da região.
Repassamos em seguida duas das reportagens publicadas em veículos locais. O primeiro do Repórter Diário e o segundo do Diário do Grande ABC.
‘Cidades Industriais Brasileiras’
destaca relevância do setor para o ABC
REPORTER DIÁRIO
Regiões compostas por cidades industrializadas apresentam dinâmicas mais complexas devido aos laços criados pela indústria com diferentes setores econômicos. Para analisar de modo mais detalhado a trajetória industrial e os processos de desindustrialização/reindustrialização no Brasil no período recente, é lançado nesta quinta-feira (12/12) o estudo Cidades Industriais Brasileiras: Emprego, renda e níveis de atividade no período 2002-2022.
A publicação, produzida pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (Smabc) e pela Federação Estadual dos Metalúrgicos (FEM/CUT-SP), tem como premissa o caráter estratégico desse setor para o país e busca analisar a trajetória da indústria de transformação nas principais cidades industriais brasileiras, para mostrar a dinâmica do emprego formal, da remuneração e da atividade econômica ao longo de duas décadas.
A indústria de transformação tem grande relevância no Brasil, com números que ressaltam essa condição. Com a 14ª posição no ranking global de países mais industrializados, representa 1,32% do valor total da produção industrial global e é responsável por 24% da arrecadação de impostos federais e 2/3 dos investimentos empresariais em pesquisa e desenvolvimento, além de contribuir diretamente com 11,3% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e gerar 8,7 milhões de empregos diretos (15,4% do total).
O estudo apresenta uma análise da trajetória da indústria de transformação brasileira, indicadores de emprego formal, remuneração média e valor adicionado bruto (VAB). De acordo com o coordenador da Subseção do Dieese no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Luís Paulo Bresciani, “o trabalho mostra o movimento oposto de dois diferentes períodos, um com grande expansão da atividade e do emprego industrial entre 2002 e 2012, e outro de retração expressiva até 2021, afetando a maioria das principais cidades industriais brasileiras”.
No ABC, houve forte crescimento do emprego industrial (26%), do salário médio na indústria (15%) e do valor adicionado (28%) entre 2002 e 2012, seguido de forte regressão da atividade, característica da economia nacional até 2021, e que marca o curso das chamadas regiões maduras da indústria brasileira. Entre 2012 e 2021, foram reduzidos 59,8 mil postos de trabalho na indústria do ABC, o que resultou, em 2021, em 183,7 mil trabalhadores.
No momento atual, ao considerar a soma das sete cidades, a região do ABC ainda é o segundo maior “município industrial” do país em termos de emprego, com quase 190 mil trabalhadores ao final de 2022, distribuídos por pouco menos de 7 mil fábricas, o que representa 23% do emprego formal da região. Essa retomada da atividade industrial claramente contribui para os níveis mais elevados de crescimento econômico verificados no biênio 2023/2024, além de o emprego industrial no país alcançar novo patamar histórico, superando 8,7 milhões de postos de trabalho em 2024.
O estudo trata também da importância das ações do Consórcio Intermunicipal Grande ABC e da Agência de Desenvolvimento Econômico ABC para a manutenção do parque industrial na região.
De fato, a contraposição ao processo de desindustrialização, que afetou o país no período recente, orientou a concepção e implementação da nova política industrial federal a partir de 2024, com o desenho da Nova Indústria Brasil (NIB). A construção dessa política contou com ampla participação do movimento sindical.
O diagnóstico trazido pelo estudo indica que o sucesso da Nova Indústria Brasil (NIB) também passa pela contribuição dessa política para o desenvolvimento das cidades industriais brasileiras, com apoio a esses municípios na modernização, reconversão industrial e adaptação às mudanças tecnológicas e às demandas de descarbonização impostas pela transição energética. Um processo que deve priorizar a geração de novos empregos, o aumento da renda e o fortalecimento do desenvolvimento local.
Grande ABC forma o 2º ‘município’
mais industrializado do País
Nilton Valentim
12/12/2024 | 20:40
Se fosse um único município, o Grande ABC seria o segundo mais industrializado do País, atrás apenas da Capital paulista. É o que mostra o estudo Cidades Industriais Brasileiras: Emprego, renda e níveis de atividade no período 2002-2022, produzido pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e Federação Estadual dos Metalúrgicos, que foi lançado nesta quinta-feira (12).
A região terminou 2022 com quase 190 mil trabalhadores, distribuídos por pouco menos de 7.000 fábricas, representando 23% do emprego formal local.
“O trabalho mostra o movimento oposto de dois períodos distintos: um de grande expansão da atividade e do emprego industrial entre 2002 e 2012, e outro de retração expressiva até 2021, afetando a maioria das principais cidades industriais brasileiras”, afirmou o coordenador da Subseção do Dieese no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Luís Paulo Bresciani.
No Grande ABC, houve forte crescimento do emprego industrial (26%), do salário médio na indústria (15%) e do valor adicionado (28%) entre 2002 e 2012. No entanto, o período foi seguido de uma significativa regressão da atividade, característica da economia nacional até 2021, marcando o curso das chamadas regiões maduras da indústria brasileira. Entre 2012 e 2021, a indústria do Grande ABC perdeu 59,8 mil postos de trabalho, resultando, em 2021, em 183,7 mil trabalhadores.
“É fundamental estarmos atentos às transformações pelas quais o setor tem passado e aos impactos na vida dos trabalhadores”, afirmou o presidente do Sindicato, Moisés Selerges.
O Brasil ocupa a 14ª posição no ranking global de países mais industrializados, o setor representa 1,32% do valor total da produção industrial global e é responsável por 24% da arrecadação de impostos federais e dois terços dos investimentos empresariais em pesquisa e desenvolvimento. Além disso, contribui diretamente com 11,3% do PIB (Produto Interno Bruto) nacional e gera 8,7 milhões de empregos diretos (15,4% do total).
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