Política

MANENTE PERDEDOR
BARRA PENSAMENTO

  DANIEL LIMA - 27/06/2024

O deputado federal Alex Manente não gostou do resultado da Pesquisa Eleitoral Sensorial que publiquei em forma de análise anteontem envolvendo 14 candidatos mais cotados a cinco das sete prefeituras do Grande ABC. E recorreu à Justiça Eleitoral de São Bernardo. Conseguiu uma decisão liminar: o texto que você pode ler nesta revista digital vai ser retirado do acervo às 16h15, quando vence o prazo estabelecido pelo juízo eleitoral.

Manente estuprou a privacidade de pensamento deste jornalista e o direito à informação da sociedade. A ficção que publiquei foi levada à Justiça Eleitoral como material sabotador da democracia. Uma inversão de papeis que conta com amparo preliminar e acreditamos precário da Justiça Eleitoral.

Os ficcionistas do mundo das letras que se cuidem. Os termos do recurso levado ao Judiciário por Alex Manente seriam devastadores a quem se metesse na área criminal assumindo identidade de eventual assassino em série. Ficção lastreada por estruturas de realidade vivida ou apenas como fruto da imaginação pode custar caro.

O juízo eleitoral deu prazo de 24 horas para a retirada do texto cujo título é “Zaca, Flávia, Tite, Filippi e Marcelo lideram corrida”.

QUARTA COLOCAÇÃO

O meritíssimo da 409ª Zona Eleitoral de São Bernardo atendeu, dessa forma, liminarmente, uma ação fantasiosa movida pela candidatura de Alex Manente, eterno perdedor de eleições municipais.

Meus pensamentos transpostos aos leitores em forma de liberdade de imprensa colocaram Alex Manente em quarto lugar entre os quatro mais fortes concorrentes à Prefeitura de São Bernardo.  Claro que, se estivesse na liderança, Alex Manente estaria soltando fogos de artifício.

Manente está atrás de Flávia Morando, Marcelo Lima e Luiz Fernando Teixeira. A análise deixa evidenciado, também no caso da disputa em São Bernardo, além das demais cidades, que os números atribuídos aos candidatos  são uma obra de ficção ou de eventual realidade futura. Por isso são precários por conta não só da metodologia aplicada, como também porque  ainda há mais de três meses a separar a disputa de fato.

CREDIBILIDADE CONTROVERSA

Alex Manente e seus advogados acreditaram na exequibilidade dos resultados a ponto de o argumento-chave levado ao meritíssimo da Zona Eleitoral de São Bernardo pontuar que o conjunto de informações conflita com os dispositivos legais das pesquisas eleitorais. Ou seja: não souberam distinguir (ou fingiram não o saber) o autêntico, as pesquisas eleitorais convencionais, do meramente criativo, especulativo, a pesquisa eleitoral sensorial.

Repetindo: muito mais que o tempo disponível e a especificidade metodológica, enfatizo reiteradamente a inexistência de conexão com o conceito de pesquisa eleitoral empírica, por mais que pesquisa eleitoral empírica sofra contundentes, quando não constrangedores reveses  diante da realidade das ruas e das unas.  

No texto a ser expurgado do acervo nesta tarde cito a disputa presidencial de 2022. Os 14 pontos percentuais de diferença entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro, segundo o Datafolha  do dia da disputa nas páginas da Folha de S. Paulo, não passaram de quatro pontos percentuais. Quem conhece estatística sabe que há um oceano de distância entre pontos percentuais e percentagem.

TRADIÇÃO EDITORIAL

É tradição desta revista digital , reflexo da paixão deste jornalista por pesquisas eleitorais, esmiuçar resultados de institutos pretensamente especializados, tanto antes quanto após as eleições. Mais que isso: ao longo dos anos cheguei a publicar pesquisas eleitorais não sensoriais com base em pesquisas eleitorais convencionais de terceiros. Criei inclusive como mecanismo de compreensão o que chamei de DataLima. Tudo não passava de uma crítica às pesquisas convencionais na maioria dos casos de baixíssima credibilidade.

Trata-se, minha análise censurada preliminarmente, do quadro eleitoral desta temporada na região, de um exercício de liberdade de pensamento inquieto e criativo conjugado com a liberdade de imprensa. São dois elementos protagonistas de um pacto jornalístico de atendimento à curiosidade do público sobre a temperatura eleitoral na região – uma temperatura, assegura o texto,  confessadamente arbitrária, discricionária, passível de equívocos e tudo que lembre ou sintetize o direito de percorrer uma variante de texto sem passar pelo crivo de obrigatoriedades legais determinadas por autoridades eleitorais.

RESPONSABILIDADE CÍVICA

Nada, portanto, de contestador às regras do jogo. Apenas e tão somente um caminho alternativo e pedagógico a despertar mais atenção à responsabilidade cívica no processo eleitoral. A essa operação se pode grudar várias etiquetas. Uma das quais, certamente, de comprometimento com a democracia.

 Pesquisa Eleitoral Sensorial não é uma exposição despretensiosas de três palavras divorciadas entre si. Pesquisa Eleitoral Sensorial é a interdependência de três palavras que traduzem uma expressão de juízo de valor determinado por conceito jornalístico. Ou seja: um mundo à parte das formalidades constitucionais e infralegais da Justiça Eleitoral.

A peça demandada pelos advogados do deputado federal Alex Manente possivelmente tenha brotado de alguma programação de comediantes que a televisão ainda apresenta, ou de um dramalhão mexicano que a televisão também apresenta.

Levar a sério, inclusive ou principalmente à Justiça Eleitoral, algo confessadamente preparado como especulação, sem lastro científico, ou seja, apenas como extrapolação digital de uma cognição criativa, por dizer assim, previamente explicativa,  não é algo que deveria merecer atenção do Judiciário Eleitoral.  

RAIZ ETIMOLÓGICA

Explicito sem manipulação semântica a raiz do conceito de Pesquisa Eleitoral Sensorial. Basta entender o significado etimológico de “sensorial” para compreender a distância de pesquisa eleitoral convencional. E que, portanto, não deveria jamais e em tempo algum ser objeto de questionamento jurídico  -- e se o fosse deveria ser descartado na medida em que cada frase do texto preliminarmente banido fosse mastigado e digerido em busca do conteúdo legítimo.

É por essa e não por qualquer outra razão que afirmo categoricamente na manchetíssima de hoje, o título que encabeça este texto, que se trata de um abuso político-eleitoral que atinge o âmago do revanchismo. Afinal, o que temos é um exemplo clássico de cerceamento ao direito de pensar e explicitar o pensamento fundamentado como matéria-prima jornalística.

Aquela análise prestes a ser enxotada do acervo de CapitalSocial ganhou um puxadinho explicativo de dimensionamento dos números preliminares, de uma primeira rodada, do que poderemos ter no campo da realidade das disputas pelas cinco principais cidadelas da região. Tudo, repetimos, como subjetividade, sem recorrer e sem anunciar qualquer mecanismo científico de quantificação dos principais concorrentes na suposta tentativa de dar ares de realidade às informações. Tudo foi declaradamente ficcional, por mais que supostamente possa ter contato com a atmosfera eleitoral de cada Município abordado.

LIBERDADE DE PENSAR

Trata-se, portanto, apensas de liberdade de pensar e de imaginar o que estaria se passando no eleitorado. Sensorialidade é uma ferramenta que se permite invadir o imaginário coletivo sem qualquer compromisso com a métrica das pesquisas eleitorais convencionais. Tudo isso está registrado no texto barrado do baile.  

Longe de mim insinuar que o meritíssimo em questão não tenha despertado atenção ao texto que publiquei anteontem. Mas não custa lembrar o quanto o verbete pesquisa pode ser objeto de identificação ou mesmo de marketing jornalístico  -- porque é disso que se trata   -- sem cair nas garras da Justiça Eleitoral atenta às nuances de comunicação e menos permeável ao assédio de concorrentes eleitorais avessos a decisões que fogem a seu alcance, como a liberdade de imprensa, no caso.

A expressão Pesquisa Eleitoral é tão particularmente ligada ao campo político como Pesquisa Eleitoral Sensorial estaria relacionada à criatividade informativa e analítica deste jornalista. São territórios individuais, de identidade própria, de cromossomos próprios.

PALAVRA-CHAVE

Tanto é verdade que numa breve consulta no Google, de fontes confiáveis e consagradas, “pesquisa” é definida como “um conjunto de atividades que visam a descoberta de novos conhecimentos em uma determinada área”. E segue: “No meio acadêmico, a pesquisa é um dos pilares da atividade universitária, em que os pesquisadores têm como objetivo produzir conhecimento para uma disciplina acadêmica, contribuindo para o avanço da ciência e para o desenvolvimento social. A palavra pesquisa deriva do termo em latim perquirene, que significa procurar com perseverança”.

Há uma infinidade de artigos na Internet que definem a atividade. No mundo político, a incidência de equívocos, quando não de manipulações, faz das pesquisas eleitorais convencionais uma enxurrada de irregularidades. Um Judiciário rigoroso como o do meu caso só contabilizaria uma diferença profunda entre as duas situações. As pesquisas convencionais lidam com a realidade sob encomenda, na maioria das vezes, enquanto pesquisas sensoriais alertam para as condicionalidades dos dados.

A diferença entre pesquisas eleitorais supostamente lastreadas pela ciência e pesquisas eleitorais sensoriais é que a segunda é confessadamente um exercício de criatividade, de especulação com elevado grau de autodesclassificação como fonte de credibilidade tácita. Já a primeira é majoritariamente manipuladora na diversidade de ofertas e demandas de candidatos loucos por números que os favoreçam. As exceções só confirmam a regra. 

Por essas e tantas outras entendo que, por mais que contrastem, Pesquisa Eleitoral de maneira geral tem limitações e restrições técnico-metodológica semelhantes à Pesquisa Eleitoral Sensorial. A diferença é que Pesquisa Eleitoral Convencional se propaga desde que siga o receituário definido legalmente, o que enseja permissão a inconformidades, enquanto Pesquisa Eleitoral Sensorial é fruto de movimento livre do pensamento em forma de atendimento a uma demanda que, exatamente por ser demanda, não é atendida a contento por leitores e eleitores.

É muito provável que, após mergulhar numa leitura possivelmente mais atenta da demanda dos advogados de Alex Manente, o meritíssimo da Zona Eleitoral de São Bernardo compreenda a necessidade de dar uma reviravolta na avaliação escolhida.  

Equiparar Pesquisa Eleitoral Convencional, regida por normas da Justiça Eleitoral, à Pesquisa Eleitoral Sensorial tem o mesmo sentido de transportar para a tabela de classificação do Campeonato Brasileiro o resultado de um jogo disputado eletronicamente por dois adolescentes, em substituição a um jogo de verdade. É disso que se trata. O resto é choro de quem insiste em ser perdedor em São Bernardo.  

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