Sindicalismo de São Bernardo
lidera machismo nas fábricas
DANIEL LIMA - 25/07/2023
São Bernardo do festejadíssimo Sindicado dos Metalúrgicos é o endereço mais machista nas fábricas da região e um dos que mais contam com participação relativa de homens no setor quando se coloca o ranking envolvendo o G-22, Clube dos Maiores Municípios do Estado de São Paulo. O machismo se reflete na direção do sindicato. Ou a direção sindical se espalha nas fábricas. Uma coisa leva à outra.
Apenas 22,75% do total do estoque de trabalhadores industriais de São Bernardo são formados por mulheres, enquanto a média regional é de 26%.
Tanto num caso quanto no outro o que poderia ser chamado de machismo industrial é muito superior à média nacional, de 31,55 de mulheres para grupo de 100 carteiras assinadas.
Uma comparação com a vizinha Capital, maior universo de empregos industriais no País (365.591 carteiras assinadas, ante 183.754 do ABC Paulista) a diferença é ainda maior.
DOBRO DE SÃO BERNARDO
São Paulo registra 41,98% mulheres para cada grupo de 100 carteiras assinadas nas indústrias. Ou 38% acima da média da região. Quando se coloca na mesa um embate entre São Paulo e São Bernardo, a diferença é o dobro de ocupação feminina nas fábricas.
O resultado de São Bernardo (e também da região) não deixa de ser constrangedor ao sindicalismo que ganhou manchetes internacionais a partir de movimentos grevistas no final dos anos 1970, com Lula da Silva à frente.
Por isso, o acerto de contas de igualdade salarial (e ocupacional) de gênero no mercado de trabalho nacional posto em prática pelo governo do presidente Lula da Silva não deixa de ser uma travessura do destino. Pega-se carona nos movimentos internacionais identitários em várias dimensões.
VENTRE PRODUTIVO
É claro que São Bernardo não lidera do dia para a noite esse ranking incômodo na região e tampouco está por acaso entre os mais resistentes às mulheres nas fábricas nos municípios mais ricos do Estado.
Primeiro é preciso entender a flexibilidade do termo “machista”. Trata-se da predominância no ambiente de produção industrial do gênero masculino.
Esse “machismo”, portanto, precisa mesmo estar entre aspas, embora carregue no ventre ocupacional nas fábricas mais que vestígios. São digitais de que o ambiente produtivo na região e no País como um todo é mais masculino.
Entretanto, o machismo nas fábricas tem duas faces que devem ser avaliadas com cuidado.
Há muito mais homens do que mulheres nos ambientes fabris da região e há diferenças significativas nos salários registrados em carteira.
MACHISMO PERMEIA
Em São Bernardo há muito mais trabalhadores homens em relação às mulheres nas fábricas quando comparados aos demais municípios da região e também do G-22. Em São Caetano, menos machista ocupacional, a diferença média de remuneração é a mais elevada. São, portanto, machismos distintos.
Repito que utilizo o verbete “machista” como forma de sintetizar o que poderia mesmo estar subjacente na cultura da indústria nacional, ambiente naturalmente mais inclinado aos homens.
Não me crucifiquem pela simplificação que não é discriminatória porque os homens das fábricas, especialmente de chãos de fábrica, são predominantemente controladores funcionais de mulheres, que em média recebem salários inferiores.
Há sempre a possibilidade de contraposição. Não necessariamente os homens que trabalham nas indústrias são machistas ou as mulheres que trabalham no setor de serviços, onde predominam, são “feministas”
Mas não se pode esconder o inegável: o machismo permeia sim o ambiente industrial porque o ambiente industrial é tradicionalmente o depositário da massa de trabalhadores masculinos arrebanhados pelas grandes e médias empresas.
PLACAR REGIONAL
Tudo isso pode sim provocar ilações quanto a dominância de homens sobre mulheres nas fábricas. São Bernardo e São Caetano são os casos mais latentes na região, mas toda a região vive essa situação.
O que escrevo hoje atualiza o que já foi escrito no passado. Muito antes, portanto, de a pauta de suposta modernidade nas relações sociais fincar-se na igualdade salarial e ocupacional de gênero. Agora os números são igualmente inéditos e foram atualizados. São números oficiais do Ministério do Trabalho.
Nas fábricas de São Bernardo há apenas 22,75% de mulheres enquanto em Rio Grande da Serra são 30,02%, em Diadema são 27,51 em Mauá 27,58%, em São Caetano 35,49%, em Santo André 34,45% e em Ribeirão Pires 20,59%. Há 183.754 trabalhadores industriais registrados em dezembro de 2021 (os dados mais atualizados), dos quais 135.960 homens e 47.794 mulheres.
Se São Bernardo lidera o machismo nas fábricas da região quando a correlação envolve o estoque total de trabalhadores do setor, São Caetano assume a ponta discriminatória ao registrar a maior diferença de salários entre homens e mulheres.
SALÁRIO MÉDIO
O salário médio das mulheres nas fábricas de São Caetano corresponde a 51,48% do que recebem os homens – R$ 2.373,57 ante R$ 4.610,38. Bem abaixo dos 58,62% que recebem as mulheres em média nas fábricas de Santo André – R$ 2.877,45 ante R$ 4.916,78.
São Bernardo machista no estoque de empregos fabris é menos desigual na remuneração: as mulheres recebem 66,98% dos vencimentos médios dos homens – R$ 4.304,03 ante R$ 6.523,00.
Mas é na socialista Diadema, administrada há 40 anos pelo Partido dos Trabalhadores, com intervalo de perda de comando durante apenas oito anos, que a diferença entre homens e mulheres nas fábricas é a mais estreita. As mulheres recebem 74,42% dos vencimentos dos homens – R$ 3.312,76 ante R$ 4.551,54.
Em Mauá, os valores são semelhantes, com participação salarial média feminina de 73,26% ante os homens – R$ 3.621,51 a R$ 4.943,02. Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra atingem médias bem acima dos demais municípios da região: 83,06% na primeira e 80,42% na segunda. O estoque de empregos talvez seja a melhor explicação à aproximação que está longe da média regional e nacional nas fábricas.
MAIS SALÁRIOS
Em termos comparativos salariais, na Capital do Estado as mulheres das indústrias recebem em média 79,23% dos salários médios dos homens.
O resultado é significativo quando comparado aos maiores municípios da região, principalmente a São Bernardo com média de 66,98%.
São Bernardo deve sim ser instalada no ranking como o principal ponto de investigação. A tradição do Sindicato dos Metalúrgicos, que espalhou conceitos e as chamadas conquistas trabalhistas, é espécie de âncora regional. O que o sindicalismo metalúrgico de São Bernardo fez a partir de Lula da Silva os demais sindicados de trabalhadores procuraram mimetizar. É cultural. E machista no sentido já exposto.
Não há como tornar desinteressante ou jogar sob o tapete da omissão um desenrolar histórico que separa o sindicalismo do ABC Paulista, Lula da Silva inicialmente à frente, e o chamado Sindicalismo de Resultados na Capital, com mobilizações menos efervescentes.
MAIOR MÉDIA
À parte ônus e danos, as mulheres da Capital do Estado alcançaram maiores fatias no mercado de trabalho industrial do que os homens. Diferentemente, portanto, do registrado no ABC Paulista.
A média salarial dos trabalhadores industriais da Capital do Estado em 2021 registrava R$ 4.773.21. No ABC Paulista, a maior média salarial é de São Bernardo, com R$ 6.003,36. Nenhum outro Município da região chega à remuneração média da Capital na categoria. A média salarial da indústria de Santo André é de R$ 4.409,46, em Ribeirão Pires é R$ 3.618,90, em Rio Grande da Serra R$ 3.247,07, em Diadema R$ 4.137,73, em Mauá R$ 4.580,33 e em São Caetano R$ 3.816,35.
A média salarial da indústria no País é quase a metade do que recebe também em média os trabalhadores de São Bernardo e quase tanto o que recebem os trabalhadores de Rio Grande da Serra. São R$ 3.265,18 em média para um total de 7.615.740 industriários no País. Uma participação relativa de 15,62% no conjunto dos trabalhadores com carteira assinada. Mais que Santo André, com apenas 12,99% dos trabalhadores atuando no setor de transformação industrial. O pior índice regional e entre os piores em escala nacional.
MACHISMO DIRETIVO
O machismo nas fábricas de São Bernardo é reproduzido nas três instâncias diretivas do Sindicato dos Metalúrgicos, ou o inverso, o machismo da diretoria do Sindicato dos Metalúrgico se reflete nas fábricas: dos 32 cargos de diretoria (Executiva, Conselho e Conselho Fiscal) nada menos que 27 são ocupados por homens. O Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, presidido por Moisés Selerges, conta com a 14ª diretoria desde que Lula da Silva ganhou a presidência em 1975. Nunca, jamais, em tempo algum, uma mulher assumiu o comando diretivo.
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