PESQUISAS ELEITORAIS
ALÉM DOS NÚMEROS (29)
DANIEL LIMA - 05/12/2024
Talvez não exista no jornalismo brasileiro um profissional que tenha se dedicado tanto ao longo dos tempos não só a analisar pesquisas eleitorais e variáveis de pesquisas eleitorais como também a escrutinar andanças contraditórias, quando não falseadoras, da Folha de S. Paulo e do Instituto Datafolha. Nada pessoal. Nem profissional que não seja preocupação obrigatória com consumidores de informação. Nesse novo capítulo desta série que está caminhando para o encerramento, mostramos mais um tropeço dessa dupla que condiciona parte do eleitorado e dos leitores em geral a pegar estradas esburacadas do mundo político. Só negacionistas defensores seletivos de pesquisas eleitorais colocam a Folha e o Datafolha numa plataforma de intocabilidade no mundo dos números e das interpretações plásticas dos números.
Governo Lula coloca Folha e
Datafolha em rota de colisão
DANIEL LIMA -- 21/09/2023
Esse governo Lula da Silva é mesmo incrementador de contradições. Nem a Folha nem o Datafolha, que sempre se mostraram irmãos siameses, até porque o são, estão fora da rota de colisões. Não é fácil defender ou tentar defender um governo de esquerda num País dividido ao meio pela direita. Nem seria diferente se os sinais fossem trocados na presidência, com a direita de um lado mandante e a esquerda do lado dos mandados.
A Folha e o Datafolha são fregueses de caderneta crítica. Não acredito na Folha e no Datafolha como fontes seguras de noticiário político e variantes. E entre as variantes estão pesquisas eleitorais e assemelhadas. Há sempre muita manipulação em nome da Ciência.
A Folha de S. Paulo tem a decência editorial de não se proclamar pluralista. É de esquerda e estamos conversados. Mas deveria substituir o mote de primeira página. Ao invés de “Um jornal a serviço do Brasil” deveria ser “Um jornal a serviço da esquerda do Brasil”. Não há problema nisso. Tampouco se a Jovem Pan fizer algo parecido e declarar alto e bom som que está a serviço da direita.
Há diferenças entre a Folha de S. Paulo e a Jovem Pan, cada uma a serviço de uma causa, mas não vou escrever sobre isso hoje.
DIMENSÃO AMPLA
Volto ao que interessa. Acho que o ponto máximo de incongruências da Folha e do Datafolha quando se trata de pesquisa eleitoral foi a projeção final do resultado do primeiro turno das eleições presidenciais do ano passado. O Datafolha e a Folha deram vitória de Lula da Silva por 14 pontos de diferença (50% a 36%) estimulando a definição da disputa no primeiro turno. A diferença foi de quatro pontos percentuais. Pior que o furo nágua foi a tentativa de explicar o inexplicável.
Nunca esqueçam que o Datafolha não serve exclusivamente à Folha. O Datafolha também é insumo importante da Organizações Globo. A repercussão de dados é intensa nos veículos dos Marinhos.
Quem disser que o Grupo Globo, e todos os demais meios de comunicação de papel e digital, não pesa entre os eleitores indecisos ou pouco convictos, quem disser isso precisa de reciclagem ideológica ou prática.
DIREITA VERSUS ESQUERDA
O Datafolha da Folha e a Folha do Datafolha sempre caminham juntos, uníssonos, tanto nas explicitudes de dados obtidos pelos entrevistados (em pesquisas enviesadas na maioria das vezes) quanto nas omissões propositais para não desgastar a imagem dos parceiros ideológicos.
Quem não entendeu que a Folha e o Datafolha são de esquerda também é tão ignorante quanto não detectar que a Jovem Pan é de direita.
Chamar de esquerdistas e de direitistas quem o são de fato não é pecado. É esclarecimento.
Sou comprovada e longamente de direita na economia e de esquerda no social. Quem escarafunchar o acervo desta revista digital, que conta 34 anos, vai constatar uma linha serena, indestrutível, monolítica, do quanto estou dizendo a verdade.
Sou contrário às estatais, ao Estado inchado e improdutivo, como também sou crítico do capitalismo bigucciano, que todos conhecem aqui na região. Pior que o socialismo rastaquera defendido por larga parcela da esquerda é o capitalista aviltante de uma direita usurpadora do Estado fragilizado.
ESTABILIDADE?
Dito isso, vamos ao que interessa. Na edição de sexta-feira passada, 15 de setembro, o Editorial da Folha de São Paulo (espaço nobre no qual a publicação exara seu ponto de vista oficial) foi condescendente com o governo Lula da Silva ao tratar da pesquisa do Instituto Datafolha. O título “Lula estável”, complementado pela linha fina “Datafolha mostra aprovação razoável do petista, mas eleitor dá sinais de que espera mais”, batia de frente com o que se lia mais adiante, à página A8, sob o título “Aprovação de Lula estabiliza e reprovação sobe, diz Datafolha”, complementado pela seguinte linha fina: “Expectativa negativa acerca do futuro do governo do petista vai de 21% para 28%, segundo pesquisa.
Agora vou expor o Editorial e a reportagem da Folha de São Paulo. Também vou registrar minha opinião ao que foi exposto:
EDITORIAL DA FOLHA
A avaliação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) praticamente não se alterou desde o início de seu terceiro mandato. O governo é tido como ótimo ou bom para 38% dos entrevistados pelo Datafolha, ante os 37% em junho e 38% em março. É ruim ou péssimo para 31%, pouco acima dos 27% de junho. A estabilidade parece compreensível. Não houve alterações relevantes na vida do país, na política, na economia ou em outras áreas que pudessem modificar de forma sensível a opinião pública. Pode-se dizer, na verdade, que a mudança maior foi certa estabilização do clima político e, para o bem ou para o mal, das condições de vida.
REPORTAGEM DA FOLHA
Passados oito meses de seu terceiro mandato, o presidente Lula (PT) tem aprovação estável, mas viu a reprovação subir. Consideram o petista bom ou ótimo 38%, 30% o acham regular e 31%, ruim ou péssimo. O dado está na nova pesquisa acerca do governo Lula 3, feita pelo Datafolha, que havia tomado o mesmo pulso nos primeiros três e cinco meses de gestão. (...). O único índice que oscilou acima da margem de erro ante o levantamento de junho passado, considerando que números iguais nos limites superior e inferior não configuram empate, foi a reprovação, que era de 27%. Não se trata, portanto, de uma disparada da reprovação.
OS FATOS
A Folha e o Datafolha esconderam ou procuraram minimizar o que os dados da pesquisa apontam. O ambiente nacional não pode ser medido a partir de qualquer data que não seja a disputa pela presidência da República. Entre o primeiro e o segundo turno e os dados agora de setembro, a expectativa de sucesso da Economia nacional caiu de 62% para 41%. Ou seja: 40% dos brasileiros entrevistados perderam o entusiasmo. São dados do Datafolha.
O contingente de eleitores entrevistados pelo Datafolha que disseram em outubro do ano passado que, pessoalmente, esperavam melhora econômica, caiu de 70% para 55% neste setembro.
CONCLUSÃO
Outros dados do Datafolha configuram processo de deterioração do ambiente político e econômico do País. Não vou fazer incursão mais detalhada porque esse não é o propósito dessa análise. O propósito dessa análise é simplesmente desmascarar mais uma vez essa combinação de interesses que, desta feita, caiu do andaime.
Não estou querendo politizar a questão de governo federal. Entendo, aliás, que fosse outro o resultado das urnas (e prefiro não entrar em detalhes sobre isso porque correria riscos) as dificuldades seriam semelhantes, mas não necessariamente as mesmas. A diferença é que o tratamento da Velha Imprensa, especialmente da Folha de S. Paulo, seria diametralmente oposto.
O que quero dizer com isso é que não confio na Folha de S. Paulo porque sei ler jornal, mas não deixo de ler a Folha de S. Paulo porque não posso perder o viço crítico como ombudsman não autorizado que sou e faço questão de continuar sendo.
Aliás, os leitores em geral deveriam ler com muito mais cuidado e senso crítico tudo o que ocorre neste País especialmente na área política. O que temos são atentados permanentes ao pudor ético.
MAIS DESCONFIANÇA
Só para completar: a Folha daquela mesma sexta-feira publicou no pé de página, da mesma página de reportagem, o que provavelmente seria manchetíssima do jornal (manchete das manchetes de primeira página), porque o fizera anteriormente, durante o então governante federal de plantão, a seguinte matéria: “42% dizem nunca confiar no que presidente diz, aponta pesquisa”.
Mas não é só isso que preocupa quem quer um País menos instável e, portanto, longe da “estabilidade” enganadora da Folha de S. Paulo. Trata-se do seguinte: o Datafolha e a Folha trataram outros 34% dos eleitores entrevistados a respeito da confiança em Lula da Silva como algo neutro, mas o enunciado “confiam pouco” é denunciador de uma desconfiança estendida, embora menos assertiva e radical do que os 42% que “não confiam” no que diz o presidente.
A Folha e o Datafolha, e isso não é de hoje, prestam desserviço ao jornalismo nacional quando tratam de questões políticas. O enviesamento da linha editorial torna tudo que se refere ao Datafolha extremamente suspeito. E olhem que não conhecemos a cozinha dos dados, ou seja, as entranhas da metodologia e da aplicação da metodologia no campo de jogo.
Aqueles 14 pontos percentuais de diferença entre Lula da Silva e Jair Bolsonaro no primeiro turno são apenas a ponta do iceberg dessa dupla do barulho e da doutrinação ideológica mais despudorada do jornalismo nacional. A esquerda não precisa disso para combater a direita num regime democrático. O consumidor de informação não é bobo. A Folha quer agradar a maioria de leitores de esquerda que a consomem. É uma Jovem Pan de papel e digital com mais radicalismo.
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