Política

Largada eleitoral para
valer vai começar agora

  DANIEL LIMA - 06/09/2024

Pode se dizer sem medo de errar porque errar diante do óbvio seria o fim da picada: a partir deste fim de semana o bicho vai pegar em busca de votos dos indiferentes, quando não dos indecisos,  se não forem também dos descrentes e de tudo o mais. As mais recentes pesquisas do Instituto Paraná apontam que em média 60% dos eleitores não sabem ou não querem saber dos candidatos quando respondem de forma espontânea. Por que, então,  este fim de semana e a marca de corte para novo período de decisões? Vou explicar.

São apenas quatro finais de semana até as eleições de seis de outubro e os fins de semana são o período mais convidativo a botar o bloco das campanhas eleitorais nas ruas. É o momento-chave para dar visibilidade aos principais candidatos. Principalmente num Grande ABC de muita mobilidade ocupacional para dar conta das demandas profissionais cada vez mais limitadas numa região em que o emprego de qualidade escasseia e a Capital é o melhor endereço à oxigenação quando não à sobrevivência financeira.

Para se ter ideia do quanto há de mobilidade ocupacional no sentido geográfico na região, Santo André, São Caetano e Mauá excedem a margem de 30% da população Economicamente Ativa que se manda todo dia  rumo  à Capital. Rumo a outros municípios locais, fora a Capital, são muitos outros.

EVASÃO DE CIDADANIA

Esses dados são de mais de uma década, não foram renovados mas possivelmente estão desatualizados para baixo. A desindustrialização não para de correr solta e os empregos no setor de serviços são de baixa remuneração, porque são desprovidos de qualidade.

Sem exagero, muitas cabeças que poderiam ser pensantes e pujantes na construção de cidadania crítica evaporam das cidades da região, internamente ou principalmente rumo à Capital, e deixam vazio enorme de capital social.

Se você não sabe o que significa capital social, além do melhor jornalismo regional do País, vou ser breve: trata-se do equilíbrio produtivo, restaurador, transformador e tudo o mais nas relações entre empreendedores, sociedade e poderes públicos.

O Grande ABC, como se sabe, conta com o domínio econômico cada vez maior do Estado, no formato de instituições municipais, e grupamentos de interesses no interior desse mesmo Estado.  

Somente nos fins de semana a mão de obra evadida e escassa em cidadania no sentido mais amplo mantém convívio nas cidades locais. São cidadãos pela metade, de moradores e influenciadores com tempo   delimitado. A outra metade, a metade econômica, é questão de vida ou morte. Na maioria dos casos, sobrepõe-se à metade domiciliar no sentido contribuinte e crítico de ser. 

TEMPO DECISIVO

Feito esse reparo indispensável para, entre outras coisas, explicar também as razões que levam mandachuvas e mandachuvinhas próximos dos poderes poderosos a deitarem e a rolarem na região, lembro que faltarão apenas 30 dias para o primeiro turno.

É nesse período que a zona do agrião pega fogo. É o período em que há brigas de foice no escuro em busca dos votos de mais de 50% em média dos eleitores municipais da região. Esse é o contingente de quem não sabe, ainda, em quem votar.

Em Diadema, segundo a última pesquisa do Instituto Paraná, são 48,7% do eleitorado no escuro  -- dos quais, 41% não souberam ou não quiseram responder. Em São Caetano possivelmente haveria semelhança numérica. Nas demais cidades, até outro dia, os perdidos no espaço eleitoral registravam quase 70%  e vem caindo para algo em torno de 50%. Perguntados -- sem o estímulo do voto na cartela arredondada  -- simplesmente fizeram cara de paisagem.  

CAÇA AOS VOTOS

Já expliquei várias vezes aqui que voto espontâneo tem  força de tração enorme. Quem diz que vai votar em determinado candidato sem que se lhe apresente o cartão arredondado estimulativo, é quem garante mesmo voto ao candidato mencionado. Quem não se decide sem o cartão e passa ao estágio seguinte, de voto estimulado, representa a turma do voto vulnerável.

Se mesmo com o cartão de voto estimulado o eleitor segue irredutível, é sinal de que as urnas vão estar recheadas de votos desperdiçados em forma de nulos e em branco. Sem contar as abstenções.

A temporada de caça aos votos que se inicia para valer neste final de semana vai determinar o rumo dos resultados, ensaiados até agora mas não assegurados. É claro que o voto estimulado carrega sim uma força de confirmação em forma de voto nas urnas, mas, repito, está longe de ser garantia de fidelidade nos dias que restam.

JOGO EM DIADEMA

Exposto isto, e começando por Diadema, cidadela onde o Instituto Paraná, em pesquisa encomendada pelo Diário do Grande ABC, aponta empate técnico entre o tetraprefeito José de Filippi Júnior (39,3%) e o triconcorrente Taka Yamauchi (40,1%).  

Numericamente, o peemedebista está à frente de Filippi, mas isso não significa nada diante da margem de erro de 3,7 pontos percentuais. Uma margem de erro elástica demais, convidativa a protecionismos e privilégios.

Não deveria levar a sério a pesquisa do Instituto Paraná, mas como é possivelmente a única empresa que se salva no mercado atual explorado no Grande ABC, não se pode jogá-la na lata do lixo. Até porque o instituto tem prestígio nacional. Isso não quer dizer muita coisa, sabendo-se como se sabe o grau de credibilidade da instituição chamada pesquisa eleitoral. Mas, repito, é o que temos para a temporada de votos.

O empate técnico em Diadema não sustenta projeção sem risco. Ainda há quase 50% de eleitores na margem de dúvida, omissão, despreparo ou seja lá o que for, ou seja, que não decidiram o voto quando instados à revelação na rodada espontânea. Parte desse universo só saiu da escuridão ante a rodada de voto estimulado, dos tais cartões arredondados com a identidade dos concorrentes.

Há duas forças contrárias que poderiam se anular mutuamente envolvendo os dois primeiros colocados.

Todos sabem que o trem de jogo do PT ganha velocidade eleitoral na reta de chegada. A militância petista geralmente tem a forma de um cavalo paraguaio reverso, ou seja, apura musculatura e força quando a fita de chegada aparece no horizonte próximo.

CAVALO PARAGUAIO

Cavalo paraguaio convencional e autêntico é um estouro de sucesso na largada e mingua na medida em que o término da corrida avança. O Botafogo do Campeonato Brasileiro do ano passado foi um cavalo paraguaio. Já o Botafogo do Brasileiro deste ano tem todo o jeito do reverso do cavalo paraguaio.

Contrabalançando o que seria um fator de favoritismo do PT de José de Filippi Júnior, o adversário Taka Yamauchi conta com rejeição inferior a do petista – 24,9% ante 37,5% . Será que uma coisa compensaria mesmo a outra a ponto de se neutralizarem? Se houver algo desse tipo, e como há empate técnico e quase numérico, tudo indicaria que as urnas em Diadema vão ser uma torrente de emoções. Até porque, linhas auxiliares de convencimento de voto, o presidente Lula da Silva e o governador Tarcísio de Freitas,  empatam tecnicamente nos critérios de aprovação e reprovação do eleitorado.

Como Taka Yamauchi perdeu as duas última eleições  -- a segunda, em 2020, por margem estreitíssima -- não estaria fora de cogitação uma troca de poder numa socialista Diadema que há 42 anos, desde a vitória do metalúrgico Gilson Menezes, ficou apenas oito anos fora do comando do Paço Municipal, ocupada pelo conservador Lauro Michels. Os 51,35% a 48,65% do resultado final de 2020 sinalizariam o fim do sonho de José de Filippi Júnior torna-se o primeiro pentaprefeito da região ou com o reforço do presidente da República petista a dramaticidade passada não se repetiria? 

JOGO EM SANTO ANDRÉ

Em Santo André, têm-se a impressão de que o candidato do Paço Municipal, Gilvan Júnior, acelerou antes da hora a corrida eleitoral e botou o bloco na rua, em todas as ruas, com volúpia extraordinária. Há duas versões complementares sobre a movimentação frenética dos últimos dias. Primeiro,  a pretensão de criar um ambiente favorável à pesquisa do Instituto Paraná que estaria programada para esta semana, mas que teima em demorar. Segundo, tentar decidir o jogo no primeiro turno.

Quem lê Gilvan Júnior precisa compreender que é melhor seguir o bom-senso e ler Paulinho-Gilvan. Eles se comportam como irmãos siameses. É um caso de absorção de identidade ou de personalidade. Gilvan fala como se fosse extensão do prefeito Paulinho Serra. E Paulinho Serra fala como se Gilvan fosse sua extensão. É um caso de possessão eleitoral quase surrealista. O que os une é o prestigio populista do prefeito.  

Trata-se de estratégia que daria certo como força eleitoral? Gilvan é um nome certo no segundo turno. O populismo  tem o outro lado da moeda, o lado de maus resultados para quem enxerga a Santo André do futuro que jamais chega, mas  encanta o eleitorado.

Santo André, como já registrei, perdeu em larga escala os valores de cidadania. Grandes contingentes de trabalhadores passam a semana inteira fora do território mais arrasado pela desindustrialização nos últimos 50 anos.

BARBEIRAGEM

Talvez a partir deste fim de semana a campanha de Paulinho-Gilvan use algum freio de arrumação. Afinal, o vice-prefeito dissidente Luiz Zacarias calou os situacionistas e todos que duvidavam de seus poderes junto ao ex-presidente da República Jair Bolsonaro.

Zacarias ganhou espaço especial no site de Jair Bolsonaro como candidato com seu apoio. Aqueles que ridicularizaram Zacarias recentemente, por duvidarem desse apadrinhamento partidário, e entre eles estão os situacionistas, precisarão mesmo refazer as contas de probabilidades eleitorais tendo Zacarias como  possível alvo preferencial de votos dos conservadores.

Ainda mais que aquela patacoada da campanha de Gilvan Júnior no Calçadão da Oliveira Lima avalizou antes mesmo de Bolsonaro o grito de Bolsonaro de apoio a Zacarias.

Uma barbeiragem que exigiu reação do comando  da campanha de Gilvan Júnior. Na festa oficial da campanha, ontem à noite no Clube Atletico Aramaçan, recorreu-se a uma mensagem em  audiovisual do governador Tarcísio de Freitas em apoio à candidatura do Paço Municipal.

CONTRADIÇÕES

A iniciativa revela duas contradições. A primeira é que ainda outro dia Gilvan Júnior afirmou que a disputa em Santo André não seria polarizada a reboque do ambiente nacional.  Ou seja: não seria necessário chamar reforço, nem se temia por reforços dos adversários. Tarcísio de Freitas significa tanto uma quanto outra coisa.

Segundo, o prefeito Paulinho Serra parece duvidar da própria força de reproduzir em Gilvan Júnior a motoniveladora de votos que a suposta aprovação de 80% da população asseguraria. Quem tem tanto prestígio popular não precisa de estranhos no ninho. Mesmo um Tarcísio de Freitas, cuja avaliação, embora elevada, estaria abaixo da do prefeito.

Claro que a mensagem é uma corrida em busca da reparação ao “Fora Bolsonaro” na Oliveira Lima, semana passada. Foi preciso resgatar a imagem de centrista do prefeito e de seu pretenso sucessor. Até o PT e partidos de esquerda, que convivem com a Administração Paulinho Serra, foram hostilizados nos discursos no Aramaçan. 

JOGO EM SÃO BERNARDO 

Para completar essa nova rodada do Placar Eleitoral, São Bernardo terá reta de chegada de primeiro turno extraordinária. Tudo indica que a candidata do Paço Municipal,   Flávio Morando, vai colocar com mais força e cores a campanha nas ruas.

Há sinalizações de que os opositores estariam tensos por causa de incômodos gerados por possíveis pesquisas eleitorais não publicadas  -- e que são pesquisas mais confiáveis porque reúnem mais que informações, mas um compêndio de estratégias.  

Tanto é verdade que numa sabatina e em dois debates envolvendo três dos quatro concorrentes, o ambiente de tranquilidade na verbalização de propostas e ideias parece soterrado. Nos comícios ao vivo e em cores, em diversos bairros, Alex Manente, Marcelo Oliveira e Luiz Fernando Teixeira passaram a proferir frases ácidas, duras, às vezes até mesmo ofensivas, ao prefeito Orlando Morando e sua indicada.

A literatura eleitoral manda dizer que quando concorrentes a determinados cargos começam a atacar  adversários, tudo indicaria que os resultados das pesquisas não publicadas são desfavoráveis. Quando direcionam ataques a apenas um concorrente, a situação seria ainda pior, porque a margem de salvação seria estreita.

NOVOS NÚMEROS

No caso de São Bernardo, das duas vagas à finalíssima, uma já estaria reservada a Flavia Morando, como em Santo André a  Gilvan Júnior. A segundo vaga em Santo André seria tão enigmática pelo andar da carruagem eleitoral como em São Bernardo.

Na edição de hoje o Diário do Grande ABC publica uma nova pesquisa do Instituto Paraná. Nos votos estimulados, Alex Manente mantém a liderança com 27,9%,  votos, ante 22,6% de Marcelo Lima, 18,0% de Flávia Morando e 17,3% de Luiz Fernando Teixeira. Com margem de erro de 3,7 pontos percentuais e 54% dos eleitores sem saber ou não dispostos a responder em quem votariam, além de 7,9% que votariam em branco, nulo ou simplesmente não votariam, o melhor mesmo é ter cautela antes de construir cenários com ares de sabedoria.

Temos um ambiente eleitoral semelhante a um quarto escuro que se observa pelo buraco da fechadura no critério de voto espontâneo. O voto estimulado, que se decompõe nos resultados da rodada do Instituto Paraná, significa uma lâmpada acesa e uma porta aberta. A escuridão foi embora, mas prevalece uma penumbra.

Os próximos 30 dias e, principalmente, os próximos fins de semana, vão ser eletrizantes nas ruas da região. Finalmente o eleitorado começará a entender que há disputa pelo comando das sete prefeituras. A metropolização periférica da política, estrangulada pela grandiosidade da Capital, cobra preço elevado em forma de desinteresse e variáveis.

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