Administração Pública

Troféu Celso Daniel: Paulinho
recebe zero em Transparência

  DANIEL LIMA - 27/06/2023

O prefeito de Santo André, Paulinho Serra, está reprovado no quesito Transparência do Troféu Celso Daniel de Gestão Pública. Diferentemente dos prefeitos Orlando Morando (São Bernardo) e José Auricchio Júnior (São Caetano) que recebem nota sete. A escala é de zero a dez.  

Este é o quarto vetor analisado por CapitalSocial de um total de seis. Faltam as dimensões de Desenvolvimento Econômico e Regionalidade, que somam seis pontos entre os 10 do total.  

O Troféu Celso Daniel é uma criação simbólica desta revista digital. São avaliados apenas os três prefeitos que estão em segundo mandato seguido. Quem está no primeiro mandato não teria condições gerais para alcançar melhores resultados.  

O que diferencia a atuação de Paulinho Serra depois de quase sete anos completos dos dois concorrentes ao Troféu Celso Daniel é que o titular do Paço de Santo André usa e abusa da liberdade de informar a sociedade. Paulinho Serra tem uma política de comunicação que choca quem está atento ao andar da carruagem da sociedade regional. 

MESMA METODOLOGIA  

De maneira geral, os três prefeitos (e os demais também) praticam a mesma metodologia de comunicação social. O centro da engrenagem são as redes sociais.  

Eles se manifestam diariamente com série de atividades. Praticamente tudo que as três prefeituras realizam em políticas públicas integra as ações dos três tucanos.   

A dinâmica de comunicação se espalha por praticamente todos os veículos de imprensa impressos e digitais da região e mesmo, em situações especiais, na mídia eletrônica da Capital.  

Não faltam publicações digitais que distribuem os pacotes diários e inclusive ao vivo das atividades dos prefeitos. Há mesmo uma profusão de dados, sempre sob a ótica de feitos das administrações.  

Esse adensamento de trabalhos das assessorias de comunicação das prefeituras nas redes sociais ganha cada vez mais fôlego e ramificações. Todos os meios digitais são utilizados numa competição que chega a ser frenética. Nem Rio Grande da Serra abre mão dessas plataformas.  

A desvantagem flagrante até outros tempos de desempenho midiático dos administradores locais frente à enxurrada do noticiário estadual e principalmente federal num País polarizado já não é tão acentuada. Agora as mídias sociais já comportam porção de informações locais.  

A pergunta que salta à vista dos mais críticos diz respeito à realidade avaliativa.  CapitalSocial teria supostamente discriminado os prefeitos dos três municípios ao não atribuir a eles a nota máxima, já que o desempenho seria semelhante. 

É aí que mora o perigo da generalização por semelhança ou igualdade de ações. Os prefeitos José Auricchio Júnior e Orlando Morando perderam três pontos nesse que é o quarto critério entre os seis que demarcam o Troféu Celso Daniel de Gestão Pública porque abriram apenas parcialmente as portas da transparência.  

MUDAR PERFIL  

Morando e Auricchio (assim como praticamente a totalidade de autoridades públicas do País) optaram por não realizar encontros presenciais com a mídia em geral, o que os submeteria a pautas específicas, principalmente as provavelmente mais incômodas e que estão na penumbra de informações valiosas.  

Um erro crasso porque nem tudo que parece incômodo a um gestor público o é de fato. Há situações em que a falta de explicações gera idiossincrasias que elevam o grau de desconfiança.  

Querem um exemplo de temática desconfortável? O crescimento real (ou seja, acima da inflação) da arrecadação do IPTU (Imposto Predial Territorial e Urbano) desde o início dos respectivos mandatos.  

Tratam-se de dados de pouco acesso aos veículos de comunicação. Mais que isso: o IPTU é uma caixa-preta no sentido de que não se identificam detalhes da arrecadação levando-se em conta especificidades, inclusive quanto à dosimetria de valores em bairros de distintas ocupações econômicas. 

DESCASAMENTO  

Traduzindo em miúdos: o IPTU e tantos outros impostos e dados municipais em geral não fazem parte da cartilha de relacionamento transparente dos prefeitos da região (e do País como um todo) porque provavelmente causariam sim algum desconforto.  

E um dos principais desconfortos seria o descasamento entre o comportamento da economia de cada Município, medido pelo PIB Geral e o PIB per capita, e os valores arrecadados com determinados impostos locais, ou seja, sob o comando da Administração Municipal.  

Esse é apenas um dos exemplos que poderiam servir de referência à queda da dinâmica de nota máxima dos prefeitos eleitos em 2016. Por essa razão, os três prefeitos em questão perderam três pontos.  

A nota sete atribuída a Orlando Morando e a José Auricchio Júnior significa mais 0,7 ponto na classificação geral. O peso de Transparência é de 1,0 ponto na grade de notas.  

EXPLICANDO O ZERO  

Finalmente, chegamos à nota zero dedicada ao prefeito Paulinho Serra. Como o tucano se descolou tanto dos outros dois concorrentes se praticamente todos optaram pela mesma estratégia de transformar informações em política de marketing político – o que não é nada nocivo, porque também contempla responsabilidade de informação à população. 

O caso de Paulinho Serra é especialíssimo. Há por um lado um limite que separa propaganda oficial mesmo que disfarçada de informação do dia a dia de uma Administração Pública e, por outro lado,  o que poderia ser rotulado de desrespeito à sociedade como um todo. 

E foi exatamente esse o ponto que levou a gestão de Paulinho Serra à autodestruição em Transparência. Desde o primeiro ano de mandato Paulinho Serra excede-se em ultrapassar a linha de meio de campo de compromisso informativo.  

Produz desconexões entre realidade ponderada e ficção transgressora ao combinar insumos da Administração de Santo André. 

SECRETARIA DE PREMIAÇÕES  

Não é exagero ter apontado de forma sarcástica, porque necessária, que Paulinho Serra criou uma espécie de Secretaria Municipal de Premiações e Indicadores.  

Ao longo dos anos Santo André colecionou série de títulos de melhor Município em determinadas modalidades. Muitas das conquistas foram forjadas.   

Até um prêmio internacional na área esportiva foi arranjado em dupla com uma pequena cidade do Sul do País. Tudo concatenado por um agente especializado em negociar programas públicos. Um vendedor de troféus, por assim dizer. O case vitorioso de esportes de Santo André surpreendeu tanto que motivou anedotas de dirigentes e atletas da própria cidade. Veja alguns trechos do que escrevi em março do ano passado:  

 

Paulinho Serra cria Secretaria

de Premiações e Indicadores 

 DANIEL LIMA - 28/03/2022

 

À falta de soluções ou encaminhamentos de soluções provisórias ou consistentes no campo do Desenvolvimento Econômico da cidade mais desindustrializada do Estado nos últimos 40 anos, o prefeito Paulinho Serra inova.  (...). Paulinho Serra criou sem que ninguém atentasse o que chamaria de Secretaria de Premiações e Indicadores. O compartimento burocrático não consta do organograma oficial. Por essas e outras deve ser atentamente observado. É uma secretaria invisível aos olhos puros e ingênuos.  (...). É claro que, de acordo com os projetos políticos do prefeito de Santo André, é mais interessante criar a Secretaria de Premiações e Indicadores do que ceder à lógica de contratar uma consultoria especializada em competitividade econômica para formular planejamento estratégico cada vez mais urgente.  (...). Trata-se a Secretaria de Premiações e Indicadores de uma farsa incensada pela mídia chapa-branca. O desfecho, em forma de resultados práticos para a sociedade, não passaria de um sopro de vela de aniversário sem força suficiente para que que a fumacinha sobrevenha à chama ainda resiliente. É preciso assoprar mais para ter algum efeito -- mesmo que efêmero.  (...). A ordem emanada do prefeito e dos assessores diretos, secretários e entorno político, é industrializar a produção de prêmios e indicadores, filtrando-os de acordo com determinadas especificidades de interesse do grupo.  Fez-se um alarde extraordinário à homenagem internacional realizada semana passada na Itália. Santo André recebeu o prêmio de Cidade Sul-Americana do Esporte de 2022, em Turim. Paulinho Serra chefiou uma comitiva barulhenta. O prêmio é oferecido pela Aces Europe, entidade ligada ao Parlamento Europeu. Agora vamos aos fatos. Escondeu-se no noticiário regional que além de Santo André, também Indaial, cidadezinha de 70 mil pessoas em Santa Catarina, recebeu a mesma homenagem. Igualmente festejada por um grupo chefiado pelo prefeito.  Não se deu a informação relevante de que os dois municípios foram indicações políticas, costuradas no governo federal. Há informações seguras de que outros municípios foram convidados a participar da premiação, mas os custos seriam altos demais.  Mais um aspecto: premiação no sentido qualitativo do verbete pressupõe disputa, concorrência, essas coisas do mundo real. Santo André e Indaial não disputaram a premiação. Negociaram a premiação. Pagaram pela premiação. Não há meritocracia endógena.    

MAIS DEVANEIOS 

Mas os devaneios de marketing da gestão Paulinho Serra não param por aí. Há preocupação imensa em manipular dados de emprego, por exemplo. Faz-se esforço monumental para transformar valores absolutos em importância suprema, desprezando-se valores relativos.  

Santo André é muito maior que Mauá, por exemplo, e em condições normais sempre gerará mais empregos em números absolutos que a vizinha , mas nem sempre a correlação com o estoque segue a mesma trilha. É assim que se fazem as contas.  

Quem apresentar melhor saldo relativo de estoque num determinado período está em vantagem. A regra vale para tudo que procure homogeneizar o que é desigual. Como se deu no caso do Coronavírus.  

Quantidade dividida por população resulta em um índice de fato demarcador da gravidade de óbitos. Paulinho Serra introduziu ou disseminou como ninguém, em várias plataformas de dados, a política de propagar vantagem quando de fato registrava perda. Esse é apenas um dos muitos exemplos reiteradamente utilizados ao longo dos anos.  

Há dois anos o prefeito Paulinho Serra, num sintoma de febre triunfalista, comemorou o anúncio de investimento (longe de se confirmar) de um entreposto na Avenida dos Estados --- e declarou que com aquele investimento o PIB da cidade cresceria 10% na temperada. Um vexame estatístico. Fosse assim, não faltariam entrepostos na região. A desindustrialização seria superada num passe de mágica. Reproduzo os primeiros trechos daquela matéria:  

 

Chineses podem sequestrar a

genialidade de Paulinho Serra 

 DANIEL LIMA - 27/09/2021

 

O prefeito Paulinho Serra precisa redobrar a segurança. Tucano em vias de se bandear às pretensões eleitorais da coalizão formada por Geraldo Alckmin, Gilberto Kassab e Paulo Skaf, Paulinho Serra corre o risco de ser sequestrado por chineses que o querem em substituição ao presidente-ditador Xi Jinping que, dizem as más línguas, já deu o que tinha de dar com a revolução socialista em forma de capitalismo de Estado.   O que causa o interesse dos chineses é a promessa de que o PIB de Santo André vai crescer 10% no ano em que for inaugurada a Nova Ceasa ABC, uma miniatura da Ceagesp da Capital.  O mais recomendável mesmo, diante da improvável aventura chinesa, é que usem uma camisa de força em Paulinho Serra. Ele endoidou de vez.  O que significa em termos numérico-históricos o que o prefeito de Santo André sugeriu no discurso para lá de enganador diante de uma plateia mirrada? Dez por cento numa cacetada apenas é mais que 12 vezes mais que o crescimento médio do PIB Geral de Santo André neste século, contando-se a partir de 2000 e chegando a 2018. Isso mesmo: 12 vezes mais, pois a média anual no período é de 0,83%.   

LOGÍSTICA PERDIDA   

O prefeito de Santo André também insiste em propagar supostas vantagens logísticas na região por conta de obras na Avenida dos Estados e mesmo em alguns puxadinhos de efeitos estritamente locais.  

Paulinho Serra parece fazer questão de exercitar uma grandiloquência verbal certo de que a sociedade consumidora de informações acreditaria em tudo.  

A Avenida dos Estados é o maior entrave ao crescimento econômico de Santo André. Trata-se de um corredor de transporte praticamente sem dono e sem organização. É um trambolho que a classe política não dá a devida atenção como dependência explícita de ação coletiva.   

Um viaduto aqui, uma nova alça de viaduto ali, como é o caso da Avenida dos Estados no território de Santo André, fazem uma versão mixuruca em determinados perímetros, sem influir no caos geograficamente mais amplo.   

É claro que há uma tendência de os administradores públicos testarem a resistência da sociedade com as informações que transmitem nas redes sociais ou mesmo em veículos tradicionais. Faz parte do jogo.  

MINISTÉRIO PÚBLICO 

Mas há condicionantes que não podem ser desativados. No caso de Paulinho Serra, há uma aura de intocabilidade como se a ofensiva de dizer o que pensa, de fazer o que bem entender de informações, não provoque qualquer constrangimento.  

Houvesse algo como um Ministério Público do Consumidor de Informações de Autoridades Públicas, o prefeito de Santo André teria sofrido punições severas por transgressão ética.  

Se para a sociedade em geral eventual rigor no trato de informações não tem prioridade como ferramenta de avaliação de um prefeito, para CapitalSocial é questão inalienável. Paulinho Serra construiu ao longo de dois mandados um castelo de areia de meias verdades e mentiras inteiras que não resiste a uma lufada de seriedade jornalística.  Nota zero, portanto, não é diferencial a ser contestado ante a nota sete dos dois concorrentes. É uma sinalização lúcida de que é preciso interromper esse circuito de desprezo aos consumidores de informações.  

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