Sociedade

Só Forças Armadas (e olhe lá!)
têm a confiança da sociedade

  DANIEL LIMA - 28/09/2021

Demorou para o Datafolha (ferramenta supostamente científica da Folha de S. Paulo explorada à exaustão pela Grande Mídia) dar uma medida relativamente exata do grau de confiança, ou seja, de credibilidade, de algumas das principais instituições do País. Os dados não são surpreendentes. De fato, ocupam um andar acima: são vexatórios. Você vai entender o que pretendo explicar.  

A pesquisa do Datafolha mirou o tempo todo o presidente da República. Resultado? Nada que fosse impactante mas, vejam só, acertou (no sentido de alvo) em cheio os demais poderes que a Grande Mídia passou a descartar de uns tempos para cá como fontes de desconfiança. Mais que isso: chega à santificação dos demônios. Renan Calheiros que o diga.  

O Brasil do problemático Jair Bolsonaro se descobriu (quanta surpresa, não é verdade?) um País igualmente ou até mais problemático em outros setores-chave da sociedade.  

Caindo pelas tabelas  

Os dados conclusivos da pesquisa envolvendo os poderes preservados pela Grande Mídia poderiam estar piores do que estão porque foram o tempo todo protegidos no amplo questionário. Mas o que é do homem da realidade dos fatos o bicho da esperteza estatística não come. Muito pelo contrário: entrega de bandeja para quem não é cego ideológico.  

Vejam como o está o que chamaria de Ranking de Credibilidade de várias instituições do País: 

1. Presidente da República – 16%. 

2. Supremo Tribunal Federal – 15%. 

3. Congresso Nacional – 4%. 

4. Partidos políticos – 3%. 

5. Judiciário – 15%. 

6. Ministério Público – 15%. 

7. Forças Armadas – 37%. 

8. Imprensa – 18%. 

9. Grandes Empresas Brasileiras – 17%. 

10. Redes Sociais – 6%.  

É claro que a edição de sábado da Folha de S. Paulo fez acrobacias sadomasoquistas para dar a interpretação que mais lhe convinha. A linha editorial da Folha de S. Paulo é aquela coisa que todo mundo com equilíbrio e tolerância às sacolejadas de pontos e contrapontos sabe do que se trata.   

Sem pluralidade  

Aliás, a própria Folha de S. Paulo, numa autocrítica saudável, embora omitida porque condenatória, já não se utiliza mais da muleta marquetológica de que é um jornal de pluralidades. Seria demais acreditar que os pouco mais de 70 mil leitores diários da versão impressa sejam um bando de capadócios. 

Como escrevi ainda outro dia, com a chegada de Jair Bolsonaro ao Palácio do Planalto o que prevalece na Grande Mídia é o ‘Tudo Agora’, como se o Brasil houvesse sido descoberto recentemente. Antes, especialmente nos anos dourados de Lula da Silva, comprava-se com facilidade o ‘Nunca Antes”.  

O que existe na ponta da agulha do Datafolha é que não há nada a contestar nos números da Presidência da República (os quais trato em seguida). Nas demais instituições, exceto Forças Armadas e redes sociais, subsiste o que chamaria de contenção programada da realidade.  

Ou seja: os resultados para valer mesmo são piores do que os que se apresentam.  O contexto estrutural da macropesquisa ameniza o quadro.  

Consórcio mostra a cara 

Chego a essas conclusões com a singeleza de quem entende como funcionam pesquisas do Datafolha e de tantos outros institutos.  

No caso específico desses resultados, o que temos é o complemento de uma macropesquisa divulgada ao longo da semana passada pela Folha de S. Paulo (e a Grande Mídia) e que ouviu mais de três mil pessoas em todos os cantos do País – segundo o Datafolha.  

Os questionários (e a ordem das perguntas) apresentados aos entrevistados (é aí que mora um dos pilares do vício de um trabalho supostamente científico) foram todos direcionados a confirmar a linha editorial da Folha de S. Paulo e da chamada Grande Mídia, também conhecida como Consórcio de Imprensa que deixou a clandestinidade editorial ao decidir dar as caras públicas sob o pretexto de oferecer balanço diário dos danos do Coronavírus. Retirou-se a máscara em nome de uma causa nobre: uma resposta à política errática do governo federal.    

Favorito da critica 

Confirmar a linha editorial significa, simplificadamente, enviesar tudo que se refira ao presidente da República. Enviesar significa que qualquer resquício de ponto positivo do governo federal sempre será desconsiderado ou minimizado. Guerra é guerra.  

Isso quer dizer que a leitura do desempenho do presidente ganha tonalidade específica, por assim dizer. Quem trata as manifestações de Sete de Setembro como delitos cívicos, na forma de atos antidemocráticos, é capaz de tudo. Inclusive de escrever muitas verdades sobre os erros do presidente. E de negar ou omitir acertos, que existem. 

Por exemplo? O caso de invasões de domicílio do Supremo Tribunal Federal em várias questões, a começar pelo combate à pandemia que alguns caras de pau isentam os togados porque dão conotação extravagantemente hermenêutica, de fato farsesca, ao conceito de “concorrentes”.   

Repararam no ranking acima que a Imprensa tem praticamente o mesmo nível de credibilidade do presidente da República? Noves fora a margem de erro, empatam.  

Contaminação sequencial  

O carregamento crítico embutido nas questões elaboradas pelo Datafolha tendo a atuação do presidente da República como carro-chefe torna o processo de incursões complementares naturalmente contaminado.  

Vou explicar, porque pesquisas precisam sempre de explicação nos conceitos que as regem, sob pena de o leitor não entender bulhufas.  

Os resultados de pesquisas do gênero a que o Datafolha se lançou são vasos comunicantes. Perguntas e respostas têm encadeamento complementar, de mensagens subliminares, de emissões de juízo de valor induzidas. É uma engenharia de perscrutação de percepções da sociedade. Nada é por acaso.  

Dessa forma, até que o questionário chegue à avaliação das demais instituições, o cargo de presidente da República já passou por dura sabatina. Quando se pergunta, como se perguntou, sobre aprovação e reprovação do presidente, e, logo adiante, sobre a possibilidade de impeachment do presidente, o que se pretende é a consumação do esfacelamento gradual da qualificação do comandante da República.  

Tudo relativizado  

Seguindo esse roteiro, quando se chega às questões relativas às demais instituições, como o Datafolha chegou, de alguma forma se reduz a carga de responsabilidades dessas mesmas instâncias. Tudo passa a ser relativizado pelo cargo presidencial.  

Agora, a razão de afirmar que os resultados em geral são vexatórios é o seguinte: se mesmo com essa manta de proteção tática dos produtores da pesquisa do Datafolha os dados são comprometedoras à maioria das instituições, ou quase da totalidade, para não dizer da totalidade, imaginem os leitores se houvesse pesquisa específica para dar uma dessas organizações sem a contaminação presidencial. Seriam resultados aterradores.  

Notem que não estou fazendo juízo de valor específico sobre cada uma dessas instituições no sentido que poderia, com profundidade. Estou apontando exclusivamente uma situação sensorial da sociedade.  

Três cenários  

O Datafolha ofereceu aos entrevistados três cenários de avaliação a cada uma das instituições listadas. Optei pelo “confio muito” porque me parece mais próxima da realidade das ruas. E que pode sim ser traduzida em forma de Ranking de Credibilidade.  

A segunda alternativa na cartela apresentada por cada entrevistador refere-se ao conceito de “confia um pouco”. E a terceira se refere a “não confio”. Nesses quesitos, há variações mais abruptas, por assim dizer. Faço um ranking do “confia um pouco”:  

1. Presidência da República – 33%. 

2. Supremo Tribunal Federal – 44%. 

3. Congresso Nacional – 46%. 

4. Partidos políticos – 35%. 

5. Judiciário – 51%. 

6. Ministério Público – 53%. 

7. Forças Armadas – 39%. 

8. Imprensa – 48%. 

9. Grandes Empresas Brasileiras – 51%. 

10. Redes sociais – 40%. 

Olhem para as instituições e respectivos percentuais. E não esqueçam de que se trata do critério “confia um pouco”. Agora vamos para o critério “não confia”:  

1. Presidência da República – 50%. 

2. Supremo Tribunal Federal – 38%. 

3. Congresso Nacional – 49%. 

4. Partidos políticos – 61%. 

5. Judiciário – 31%. 

6. Ministério Público – 30%. 

7. Forças Armadas – 22%. 

8. Imprensa – 32%. 

9. Grandes Empresas Brasileiras – 29%. 

10. Redes sociais – 53%.  

Me recuso a considerar positiva qualquer derivação além do “confia muito” escolhida pelos entrevistados do Datafolha. O que se pode aceitar no espaço intermediador entre “confia muito” e “não confia”, no caso “confia um pouco” é um certo grau de flexibilidade à adoção de um dos dois extremos de avaliação. O “confia um pouco” é algo semelhante ao “regular” quando se pretende avaliar uma determinada gestão. Ou dos “indecisos” em pesquisas eleitorais.  

Trata-se de espécie de subida no muro do não comprometimento. Na situação específica da cauda da pesquisa do Datafolha sobre as instituições, optaria pela desconfiança e, portanto, por uma avaliação que não teria intimidade com o respaldo à credibilidade.  

Parece que o mais importante de tudo isso é que temos para valer sequência prolongada de crise institucional, cujo berço é de difícil detecção temporal. O Brasil parece destinado a mergulhar em permanentes crises de competência geral.  

Alguns períodos de bonança ao longo de décadas não passaram de exceções à regra, em muitos casos turbinados pelo conluio entre podres poderes e podres mídias. 

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