Quem faz uso de propaganda enganosa e transforma Santo André em paraíso de riqueza em forma de consumo mal sabe o que está acontecendo. Imaginar ou propagar que Santo André é algo como um Bairro Jardim gigantesco é uma anedota de custo elevado para um endereço que precisa reagir para não cair ainda mais pelas tabelas. É um crime de lesa-cidade sugerir que o Bairro Jardim de noitadas festivas reflete Santo André como um todo.
Agora vem o choque do politicamente incorreto, porque a ordem geral é mascarar os fatos. Do que se trata, afinal?
Ainda estamos longe de concluir se o enunciado aí em cima poderia ser respondido com segurança, mas em matéria de composição socioeconômica de classes mais desfavorecidas, Santo André e Diadema têm praticamente o mesmo desenho matemático, que já foi muito diferente há 30 anos.
Entre famílias de Classe Média Precária, Santo André e Diadema são muito semelhantes. A diferença para efeitos sensoriais é que Diadema não tem um Bairro Jardim para enganar o distinto público. É fato também que o urbanismo de remendos de Diadema é prevalecentemente mais terceiro-mundista do que Santo André. Mas isso tudo é apenas impressão visual.
JOGO EMPATADO
Querem ver? Nada menos que 49,18% do total de moradias de Santo André abarcam a Classe Média Precária. Em Diadema, esse mesmo estrato socioeconômico corresponde a 51,50%. São, sem exagero, irmãs gêmeas. Ou irmãs metades gêmeas. As outras metades, que reúnem Classe Rica, Classe Média Tradicional, Pobres e Miseráveis são mais favoráveis a Santo André. Como já está sendo demonstrado e será completado nos próximos capítulos desta série.
Depois de mostrar na edição passada, a terceira desta série, que Santo André conta com um pouco mais de famílias de Classe Rica e de Classe Média Tradicional, mas com perda de fôlego desde 1995, base dos estudos deste jornalista, agora entra em campo a Classe Média Precária. Essa camada social representa metade das famílias dos dois municípios, separação entre Ricos e Classe Média Tradicional de Pobres e Miseráveis.
Qualquer um sabe o que são pobres e miseráveis numa composição social. Já a Classe Média Precária é denominação de CapitalSocial. Seria a Classe C, mas Classe C não é necessariamente a melhor configuração identitária social, porque foi deformada ao longo dos tempos. Preferimos Classe Média Precária. Os dados comprovam que se trata de um estrato social cada vez mais distante da Classe Média Tradicional e mais próximo da Classe Pobre, antessala da Classe de Miseráveis.
Mais que isso: no caso de Santo André, especialmente, a Classe Média Precária saiu do ventre da Classe Média Tradicional. Foram famílias que perderam mobilidade social a cada nova temporada gregoriana. Ou mais precisamente aumentaram a desmobilidade social.
MOBILIDADE DESATIVADA
Há empate técnico entre o total de famílias de Santo André e de Diadema classificadas como integrantes da Classe Média Precária, como se pode observar nos números. A diferença é mínima, mas já foi bastante favorável a Santo André. Quando a participação relativa de Classe Rica e Classe Média Tradicional cai no conjunto de famílias residentes num determinado endereço, a Classe Média Precária ganha terreno.
Tradução: Santo André é cada vez mais semelhante a Diadema quando se trata de ocupação territorial que separa Ricos e Classe Média Tradicional de Pobres e Miseráveis. O time da Classe Média Precária é o retrato do rebaixamento de qualidade de vida médio das famílias de Santo André. Em Diadema, a curva descendente foi mais suave, mesmo com a desindustrialização neste século.
Mais que isso: a desindustrialização de Diadema neste século desativou o processo de mobilidade social comprovado até os anos 1990, quando Santo André já exibia sinais exteriores de decadência econômica.
NÚMEROS RELATIVOS
Trinta anos atrás, em 1995, quando a Consultoria IPC do pesquisador Marcos Pazzini iniciou estudos socioeconômicos dos municípios brasileiros, e que CapitalSocial sempre desvendou no Grande ABC, havia funda diferença de composição de famílias de Classe Média Precária envolvendo Diadema e Santo André. A diferença era robusta e vale a pena conferir.
Enquanto em Santo André havia 61.223 residências, que correspondiam a 35,68% do total que integravam a Classe Média Precária, em Diadema eram 47,14% do total. Eram 39.667 famílias de Classe Média Precária. Notem os leitores que os resultados levam em conta valores relativos, que não podem ser confundidos com números absolutos. Santo André tem numericamente mais famílias de Classe Média Precária porque tem mais habitantes do que Diadema. Era assim em 1995 (637.594 ante 329.986) e segue assim em 2025 (782.124 habitantes ante 403.075 de Diadema).
Havia uma diferença de 13,50 pontos percentuais de vantagem de Santo André sobre Diadema em 1995 nessa competição de Classe Média Precária. Ou seja: a diferença era relativamente larga a favor de Santo André, ainda menos vulnerável aos efeitos da desindustrialização.
Na ponta do estudo, em 2025, essa distância caiu para apenas 4,36 pontos percentuais. O número relativo de famílias de Classe Média Precária em Diadema evoluiu negativamente bem menos que em Santo André. Em Diadema o aumento foi de apenas 4,36 pontos percentuais, enquanto em Santo André o crescimento registrou 13,50%.
DIFERENÇA ESTREITA
Transformando esses dados em percentuais, os resultados são os seguintes: em 1995, Diadema contava com 37,83% mais de Classe Média Precária que Santo André. Já em 2025, a diferença caiu para 4,71%. Quem não considerar esse resultado final um resultado de empate técnico não entende de resultado final. Principalmente porque o viés entre os dois números percentuais é um viés em que Diadema vai comendo Santo André pelas beiradas. Não tem como deixar de chegar à conclusão de que a Classe Média Precária de Santo André e a Classe Média Precária de Diadema são resultados do mesmo ambiente de crônica perda de vigor da economia regional.
Na próxima edição desta série será mostrado e analisado o quadro envolvendo os dois municípios do Grande ABC relativos às categorias de Pobres e Miseráveis. Santo André se mostrará menos problemática que Diadema, mas nem por isso acena com qualquer possibilidade de situar-se longe da zona de rebaixamento contínuo dos rendimentos da população.
É preciso levar em conta – é disso que se trata – que o PIB de Consumo que mede o que a população dos dois municípios tem para gastar nesta temporada é um indicador econômico de parentesco próximo ao do PIB Tradicional.
A diferença entre PIB de Consumo, que está em pauta, e PIB Tradicional é que os valores não são necessariamente obtidos nos respectivos municípios. Podem ser frutos de rendimentos alcançados fora do território municipal de cada endereço doméstico, caso do PIB de Consumo. Já o PIB Tradicional mede o que se transforma em produção de riqueza exclusivamente de cada Município.
PIBs APROXIMADOS
O emprego numa fábrica em Santo André gera PIB Tradicional para Santo André. Mas o morador de Santo André que trabalha fora de Santo André gera PIB de Consumo para Santo André. A dinâmica vale para todos os municípios.
Os resultados envolvendo Produção e Consumo têm sim certo grau de sincronismo por habitante. Quando os resultados divergem além de determinada margem de erro, a provável resposta é que há mais trabalhadores atuando fora do Município em combinação com riqueza acumulada.
O caso da disputa entre Santo André e Diadema é exemplo dessa sincronia. Os números por habitante do PIB Tradicional e de PIB de Consumo em Santo André guardam distância diferença mais elástica do que os registrados em Diadema, mas nada alarmantes.
Em Santo André, o PIB de Consumo por habitante neste 2025 é de R$ 52.784,71 enquanto o PIB Tradicional por habitante, ou seja, de geração de riqueza, é de 45.067,56. Mas há um fator temporal que não pode ser esquecido: o valor correspondente ao PIB de Consumo é de 2025, enquanto do PIB Tradicional está defasado, com limite restrito a 2021.
De qualquer forma, mesmo assim, é possível estabelecer a comparação não necessariamente nos dois montantes, mas na distância entre os dois montantes.
O caso de Diadema guarda a mesma lógica. E nesse caso a distância é menos elástica. O PIB Tradicional de 2021 registra R$ 43.031,91 por habitante, enquanto o PIB de Consumo de 2025 registra R$ 41.268,36.