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Sociedade

DANIEL LIMA - 24/06/2025

A vasta turma de deserdados temporários dos poderes procura uma terceira via retórica para se encaixar no que imagina ser uma possibilidade de sucesso eleitoral. Esse é um direito inalienável, sujeito que está, também, ao escrutínio crítico. É nesse ponto que mora o perigo da retaliação.

O prefeito Paulinho Serra, tucano à deriva como todos os tucanos que sobraram, faz a pregação idealizada ou massificada pelo governador gaúcho, Eduardo Leite.

Procura-se estigmatizar o que chamam de intolerância e radicalismo de extremismos da direita bolsonarista e da esquerda lulista. Como se o suposto centrismo fosse flor que se cheirasse no campo de ideias e de ações.

O que existe há muito tempo ou quase sempre em comum entre portadores da síndrome de vácuo político é que a disputa pelo território dos poderes sempre foi marcada por embates de semelhantes, embora não parecesse assim entre a pretensa social-democracia tucana e o esquerdismo petista.

DOS TERÇOS ADERENTES

A sinfonia mais que suspeita de que a razão está no centro supostamente mais preparado para lidar com a gestão pública vira uma ladainha que não convence a maioria do eleitorado. É uma musiquinha enfadonha que tocou durante tanto tempo nas paradas de sucessos das urnas controladíssimas por um amplo sistema de interesses cruzados, inclusive da grande mídia e das mídias regionais país afora.

Bolsonaristas e lulistas ocupam dois terços do eleitorado brasileiro, segundo as últimas pesquisas, e o terço restante é majoritariamente pendente a uma das duas bandas, de acordo com as circunstâncias. Essa tomada do espaço é o desafio aos pretensos centristas. Só falta encaixar um discurso que convença o distinto público. A retórica antirradicalíssimos não têm tido sucesso. Provoca mais rejeição ante a maioria formada por petistas e bolsonaristas.

A melhor terapia para começar a colocar em ordem a casa de alvenaria da democracia brasileira e instalá-la num porto seguro em forma de fortaleza edificada com cidadania de verdade passa pelo contraditório. E quem geralmente clama por cidadania, por equilíbrio, conta com regras próprias de execração ao contraditório. O contraditório é observado indistintamente e em todos os sentidos políticos como oposição a ser combatida. O vezo autoritário prevalece também entre os supostos moderados. É claro que não me refiro ao contraditório chulo, ofensivo, típico de milicias de redes sociais e do jornalismo profissional matreiro. 

RITUAL OBRIGATÓRIO

Enquanto prevalecerem a direita e a esquerda defendendo verdades, meias-verdades e mentiras como se fossem sagradas e intocáveis, sempre com o auxilio de larga parcela da mídia comprometida, tanto aqui quanto acolá, nada alterará o ritmo da chuva de espertalhões no marketing político na tentativa de inventar a roda.

E inventar a roda é pretenderem se mostrar diferentes em meio à barafunda de semelhantes mesmo nas diferenças ideológicas.

Defender o contraditório autêntico, fora portanto de flexibilidades para enganar o distinto público, deveria ser um ritual obrigatório a partir das mídias de maior tradição.

Mas é justamente a mídia de maior tradição que explode o conceito de embates sustentáveis como fonte de credibilidade e segurança informativa. Dobram-se repetidamente às conveniências em tempos de esqualidez de receitas publicitárias que se escafederam com a multiplicação de plataformas de comunicação, entre outros fatores.

MUSIQUINHA DE SEMPRE

O que os tucanos e assemelhados representados em Santo André pelo ex-prefeito Paulinho Serra e assessores imediatos pretendem é se apresentarem como desbravadores de um novo modo de fazer política na região, seguindo os ditamos sagrados do governador do Rio Grande de Sul e sua tropa de verniz diplomático.

De fato, e para valer, o que se passa nesses redutos de bons modos vernaculares, mas de infiltrações sociais de arrepiar não é muito diferente dos agentes edificadores dos maneirismos e artimanhas do Centrão velho de guerra. Até desse grupamento estão Paulinho e seus semelhantes fora de jogo, ou na melhor das hipóteses distante das cúpulas, embora não faltem esforços à recuperação do espaço.  Os moderados sem poder político nacional são os centristas que não deram certo. Ou deram certo até darem errado.

Demoraram demais os retardatários do centrismo supostamente civilizado para perceberem que a banda tocava uma modinha diferente da qual não só estavam acostumados como a instrumentalizavam com soberania. A direita antes envergonhada entrou em campo com  excessos, é verdade, mas também com permanente aderência do centro da direita.

NEGAÇÃO DO PASSADO

Ao se recusar a participar de um debate-livro com este jornalista, o mesmo jornalista a quem fez convite pessoal em 2021 para atuar como conselheiro especial, Paulinho Serra não descerrou a fita da unilateralidade. Durante praticamente toda a gestão de oito anos, o então prefeito de Santo André procurou fugir de tudo que representasse contraponto.

Esse mesmo jornalista também, no primeiro ano do primeiro mandato, recebeu um convite de um assessor graduadíssimo da Prefeitura de Santo André. A proposta de integrar o Conselho de Notáveis de Santo André foi aceita de imediato.  Uma ideia interessante, independente de minha participação. Mas não foi levada adiante. Paulinho Serra se deixou enredar por forças imediatistas e extrativistas.

Convém lembrar que a função seria voluntária, colaborativa. Mais tarde, e antes do convite de me tornar conselheiro especial do prefeito, o mesmo Paulinho Serra decidiu aceitar proposta de criação de um Conselho Especial sob minha responsabilidade de escalação. Nomes convidados, Paulinho Serra impôs barreiras burocráticas que retirariam todo o espectro de complementariedade e independência daquele grupamento. Debandamos.

COVA RASA DE PERDAS

Não pense os leitores que conto essas coisas (e tenho mais a contar, inclusive uma colaboração voluntária para que fizesse revolução na cobrança de IPTU residencial, adotando a Tecnologia de Informação como base ampla da planta desajustada e conflitante socioeconomicamente) porque pretenderia me afirmar ou algo parecido.

Já não tenho idade para tamanha estupidez. O motivo é essencialmente outro: Santo André e os demais municípios de uma região bombardeada pela desindustrialização e pela falta de alternativa econômica minimamente compensatória exigem iniciativas reformistas como politica de Município-Estado, ou Região-Estado; ou seja, que ultrapasse a formalidade dos mandatos conferidos pelos eleitores.

A arrogância com que administradores públicos atuam tanto em nível municipal como regional, à frente das prefeituras e do Clube dos Prefeitos, é o cavoucar permanente da cova rasa de improdutividades. A agenda regional de que necessitamos para acalmar o jogo da derrocada que segue firme não comporta encenações. Marketing político ou qualquer coisa que se distancie de definições e ações profiláticas é puro veneno.

FALTA DE APETITE

Ainda outro dia mostrarmos que bastariam 10% dos valores exorbitantes (embora legalmente reservados) consumidos por uma centena e meia de vereadores -- na maioria inúteis, porque ramais do Executivo -- para que o Clube dos Prefeitos impusesse novo padrão de atuação, partindo-se da profissionalização sem apadrinhamentos de suas divisões.

A falta de apetite para dar um tiro de meta nesse processo transformador é um dos sintomas de um organismo social (no amplo sentido da expressão) completamente debilitado como estrutura motivadora a inovações.

O mais lamentável de tudo é que a impossibilidade histórica de mudanças para valer, em constante desfilar de perfumarias administrativas, se deve ao desencaixe de peças do enxadrismo de regionalidade.

Antes fosse essa a questão derivada apenas e exclusivamente da estultice do processo separatista administrativo-territorial em meados do século passado, assunto, aliás, proibido na mídia regional tanto quanto nas instâncias dos poderes.

TERRITORIALIDADE

A inapetência tem raízes mais profundas. A infertilidade a mudanças se dá igualmente nos territórios municipais, locais em que os prefeitos eleitos recentemente e também os anteriores praticamente concentram intenções e ações sempre em busca de votos, não nas próximas gerações.

Então, o que temos como fonte de distribuição de desesperança e desencanto é um casebre de municipalismo e um terreno baldio de regionalismo, sobretudo em Desenvolvimento Econômico.

Com isso, para completar o estrago, eis que temos como suplementação que se transforma em dominação, a composição de um grupo cada vez mais seletivo e monolítico de atores políticos avessos ao debate aberto, produtivo, frutífero.

O tempo está provando que esse tema, o tema do territorialismo em substituição ao regionalismo, ou seja, o domínio institucional e político do espaço territorial por poucos em detrimento de compartilhamento entre muitos, o tempo está provando, repito, que, num futuro não muito distante, todos estarão subjugados independentemente do espaço municipalista. Os bárbaros abençoados pelos territorialistas vão deitar o rolar.

CADEIA DA FELICIDADE

Por isso, entre outros pontos, não há interesse algum em conferir aos meios de comunicação a mais ínfima possibilidade de se estabelecer uma via de mão dupla em forma de questionamentos a configurações previamente definidas entre quadro paredes, a salvo da bisbilhotice da sociedade mesmo que desorganizada.

Nunca os prefeitos da região – e dos demais espaços nacionais – contaram com tanta fartura à interação com a sociedade. Mas o fazem sempre em tom de conquistas, condecorações, festejos, aplausos, como se fossem deuses do Olimpo.

As redes sociais e os jornais de papel e digitais formam uma cadeia da felicidade, por mais que tenham de conviver, diariamente, com notícias de infortúnios de uma região que ousa aprofundar debilidades.

Veja o leitor nos jornais de papel e digitais de hoje, por exemplo, quanto o noticiário policial e de buracos sociais teima em aparecer. Não há discurso de felicidade que se sustente.

MUNICIPAL E REGIONAL

Ao longo de 35 anos da trajetória desta publicação, inicialmente LivreMercado, registramos esse conflito inevitável entre manchetes glorificadoras de gestores públicos locais e desafios quando não desastres sociais que insistem em fugir do encapsulamento dos triunfalistas seletivos.

O ataque frontal às peças que mantêm o Grande ABC como território em decadência permanente não está entre as prioridades e tampouco em segundo plano. O espírito carnavalesco que impera entre os gestores municipais da região sustenta-se como prioridade. A tempestade de dores sociais sempre pode esperar. O que temos é um concerto planejado para o curtoprazismo incapaz de abrandar o sofrimento social. Não há ofensiva em busca de medidas estruturais que conspirem para a redução do estoque de complicações.

Por isso, a ordem unida dos poderosos de plantão é tratar os resilientes a essa política de avestruz como inimigos figadais. Para tanto, principalmente em Santo André, conta-se inclusive com uma espécie de Exército de Brancaleone, de meliantes instalados em redes sociais dispostos a tudo.

O contraditório destas linhas tem um custo elevadíssimo. Mas é cada vez menos suscetível a incômodos porque já se tornou rotina de demonização à crítica fundamentada, provada e comprovada. O centrismo  é habilidosíssimo em etiquetar os resilientes, mas faz uso de  braço armado para manter a pretensa elegância.



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