Clique aqui para imprimir




Administração Pública

DANIEL LIMA - 12/06/2025

A experiência nacional mais longeva do modelo esquerdista de governar está localizada no Grande ABC e tem nome de joia preciosa: Diadema. Desde 1982, quando o metalúrgico Gilson Menezes foi eleito e festejado como primeiro prefeito petista do País, Diadema está sob o controle da esquerda. Excetuam-se os oito anos de Lauro Michels, de linha populista-conservadora, e agora o aparentemente de centro-conservador Taka Yamauchi. Tanto um quanto outro lidaram e lidam com as digitais do Partido dos Trabalhadores em forma de heranças.

Portanto, essas exceções não alteram o ritmo estrutural da regra geral, ou seja, de que Diadema é prevalecentemente esquerdista com todos os significados que isso representa.

Tanto é de esquerda que resiste como o maior reduto eleitoral do Partido dos Trabalhadores no Grande ABC e entre os cinco maiores entre os municípios brasileiros. O petismo em Diadema é muito superior à média do petismo no Brasil. A dinastia de esquerda petista e de assemelhados é a mais resiliente do País. 

CERTO E ERRADO

Afinal de contas, por que Diadema não deu certo? Mais que isso: Por que Diadema deu errado? Ou existiria uma vertente qualificadora que tornaria Diadema dualística,  como metade que deu certo e metade que deu errado?

Diadema deu relativamente certo sim senhores e senhoras, no que compete a indicadores sociais, rivalizando-se com endereços mais antigos e prósperos, no passado, no Grande ABC. Santo André, por exemplo. Mas Diadema deu tremendamente errado relativamente aos indicadores econômicos.

No fundo, visto de perto, o resultado final está aquém das expectativas históricas. O dirigismo estatal, no caso do que chamaria de Estado Municipal, é o centro difusor de ideias esquerdistas. Os bons e promissores resultados dos primeiros tempos se esvaem na medida em que há descasamento de conquistas sociais e refluxo econômico em forma de desindustrialização. A equação não fecha. E abre crateras no poderio esquerdista municipal.

TESTE AOS HIPÓCRITAS

Os petistas do começo dos anos 1980 prometiam o céu, e o que temos em Diadema, goste-se ou não, não é exatamente o sonhado. Muito pelo contrário. Quem acha que estou sendo cruel, principalmente os socialistas metidos a besta, que deixe, por exemplo, o confortável Bairro Jardim, em Santo André, meca de supostos endinheirados, e mude de mala e cuia para Diadema. A hipocrisia não resiste a um banho de realidade social.

Aliás,  os sugeridos socialistas do Bairro Jardim, em Santo André, endereço frequentemente utilizado pela Prefeitura de Santo André para enaltecer o lado cor-de-rosa de uma economia destroçada, não precisam ir a Diadema para conhecer o fracasso econômico do Grande ABC pós-desindustrialização.

A geografia de Santo André está coalhada de pedaços sociais típicos de Diadema. Não custa lembrar, para reforçar essa constatação, que Santo André conta com PIB per capita na posição 1.321 no País, enquanto Diadema se coloca na posição 1.107. Nos indicadores sociais mais rigorosos, Diadema também é superior a Santo André.

Diadema deixou escapar entre os dedos da opção preferencial pelos deserdados uma boiada de Desenvolvimento Econômico provavelmente mais evolutivo e ajustado do Grande ABC. A evasão industrial de Santo André, São Caetano e São Bernardo em determinados períodos significou migração interna de investimentos em Diadema.

DOSE EXAGERADA

O destino do desgarramento do território antes incorporado por São Bernardo colocou o Município na cara do gol da Rodovia Anchieta, da Rodovia Imigrantes e em seguida do Rodoanel. Querem mais fortuna logística, um dos fatores essenciais ao crescimento econômico?

Com tanto encaminhamento à riqueza, entre o mercado consumidor mais poderoso e o maior porto do País, não havia espaço a outra coisa senão correr para o abraço. Diadema fez um gol contra economicamente porque preferiu privilegiar de olhos fechados os vetores sociais, inclusive com a distribuição de terras à ocupação migratória sem eira nem beira. O que era um caos urbano se tornou um caos urbano ainda pior. A velocidade de ocupação foi célere.

O fator logística perdeu, com isso,  muita potencialidade. A menor distância entre dois ou mais pontos é relativa como mantra de eficiência logística. Quando há impedimentos estruturais que tornam a mobilidade urbana um inferno, logística passa a ter outro nome. Diadema é um trambolho logístico, além de caos urbano.

Diadema exagerou na dose de um socialismo tupiniquim sob o vezo de ideologia estatista e abrasivasaída do chão de fábrica. Conflitos entre capital e trabalho sedimentaram a alma de Diadema.  

VOO PANORÂMICO

Não vou descer a detalhes estatísticos sociais e econômicos de Diadema porque os tenho apresentado aos montes ao longo dos anos. Estou longe de ser especialista em Diadema se o medidor forem detalhes varejistas que se somam na construção de um mapeamento que, colocado à prova de choque, num questionário de 100 questões, provavelmente responderia a poucas com a certeza de estar certo.

Mas, quando se trata de voo panorâmico e mesmo histórico, acho que estou habilitado a tentar explicar o que se passa nesse território. E é isso que interessa quando se estuda determinado espaço urbano. Prefiro a floresta às arvores.  Assim como no futebol. Vejo as disputas pelo prisma do coletivo e desço às individualidades. O inverso é subalternidade interpretativa.

Tenho o privilégio curricular de ter sido e primeiro jornalista em nível nacional a vasculhar as entranhas sociais, econômicas e políticas de Diadema sob o controle da esquerda. A reportagem de capa para o Jornal da Tarde, do Grupo Estadão, e para toda a rede da Agência Estado, naquele 1986, dissecou o que se passava após 48 meses de gestão de Gilson Menezes.

Ali estava plantada na prática a estrutura doutrinária do Partido dos Trabalhadores. Que ganhou territórios municipais e estaduais até se instalar em Brasília, agora na quinta gestão do PT. Diadema é, portanto, o prólogo do petismo consagrador de Lula da Silva nos dois primeiros mandatos presidenciais, e também os fracassos que sobrevieram com Dilma Rousseff e mesmo agora com a volta de Lula da Silva.

LIMITES ULTRAPASSADOS

Há limites para o avanço estatal. E há muito esse limite foi rompido.  Diadema que o diga com uma dívida astronômica e refluxo econômico alarmante.

Ao longo da circulação da revista de papel LivreMercado ( e também desta revista digital) Diadema se tornou pauta permanente de análises. Muitas foram produzidas, carregando na algibeira da sensatez esse antagonismo entre o social e o econômico. Diadema jamais conseguiu conciliar uma coisa e outra de modo que uma coisa não atrapalhasse a outra.

Não poderia dar outra coisa senão os indicadores que a colocam com relativo sucesso no campo social e decepção na área econômica. Sobretudo porque o privilégio logístico do território impunha o sucesso como única estrada a ser percorrida.

É preciso levar em conta quando se coloca Diadema e a esquerda de Diadema contra a parede de resultados práticos  tanto no social quanto no econômico que, inversamente aos privilégios geoeconômicos, o Município acoplou em sua gênese ocupacional o suprassumo das complicações nacionais. 

CORRIDA DEMOGRÁFICA

No caso, uma velocidade recordista de ocupação demográfica predominantemente de nordestinos em busca de sobrevivência em primeiro lugar e, com a ajuda de todos os deuses, de mobilidade social em seguida.

Sair da miséria em busca da pobreza e da pobreza em busca de uma vaga como classe média precária eram etapas desafiadoras para Diadema. E continuam sendo. Até porque, vizinha ao  extremo sul da Capital, Diadema também recebeu levas de moradores de uma metrópole incontrolável.

Nos tempos em que atuava na sucursal do Estadão em Santo André, foram várias minhas idas e vindas a Diadema para acompanhar o movimento das pedras de pequenas e médias indústrias, principalmente. Produzi muitas reportagens durante aqueles anos. E isso já passa de 40 temporadas.

Diadema recebia muitas indústrias, de todos os setores. Mas não demorou, já nos anos 1990, por razões macroeconômicas e também locais, puramente locais, o estalar de dedos do processo de desindustrialização, agravado nos anos 2000.

MATAR A CHARADA

Como não tenho mais que algo próximo de 1,2 mil palavras para este texto, limite que me imponho diariamente, mas nem sempre obedecido porque o entusiasmo pela regionalidade muitas vezes fala mais alto, diria resumidamente que existe um fator, entre tantos, a debilitar permanentemente o potencial de Diadema.

Será que o leitor é capaz de matar a charada que ajuda a, também, explicar por que Diadema não se tornou economicamente o que poderia alcançar e também por que Diadema conta com um dos maiores exércitos de moradores de classe miserável e pobre da região, em dissonância aflitiva com os indicadores econômicos mesmo debilitados mas nem por isso desprezíveis?

A resposta é delicadíssima, sugere precaução, exige cuidados, determina diplomacia verbal, mas precisa ser exposta ao invés de tratada como tabu. O fato, senhoras e senhores, é que Diadema carrega no ventre do senso comum regional, metropolitano e nacional a pecha preocupante e desestimulante de constituir-se endereço de elevada criminalidade não tanto nas estatísticas mensuráveis, mas na subjetividade sensorial. E criminalidade sensorial muitas vezes é pior que a real porque sugere algo à beira de uma recaída.  

SENSORIALIDADE CRIMINAL

Vou traduzir. O que pretendi dizer nos trechos escritos imediatamente anteriores é que existe um peso discriminatório justificado,  fundamentado no passado e alimentado no presente,  de que Diadema não é endereço que se preze para empreendedores industriais que pretendam contar com competitividade.

Além de dificuldades à seleção de mão de obra produtiva, o ambiente criminal impõe alternativas à busca de outros endereços, sobretudo de municípios que conjuguem qualidade de vida objetiva e subjetiva e diversidade prática de logística. Ou seja: uma combinação incapaz de se encontrar em Diadema e, a bem da verdade, na quase totalidade dos municípios do Grande ABC. A metropolização ensandecida nos custa caro.

Há muito mais a escrever sobre a frustração com Diadema, além do que já foi escrito. O pedaço mais apurado de governos petistas vinculados ao sindicalismo é um caso especialíssimo e não pode ser confundido com o petismo inspirado por Celso Daniel em Santo André. Quem confunde as bolas não entende nada de socialismo tupiniquim. Não é necessariamente uma besta quadrada, mas também está distante de ser especialista no assunto.  Quaisquer semelhanças entre Diadema e Santo André nos indicadores sociais e econômicos têm explicações distintas na maioria das situações. Principalmente ideológicas.



IMPRIMIR