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Sociedade

DANIEL LIMA - 28/05/2025

Administradores públicos do Grande ABC chegaram a tamanho grau de caradurismo triunfalista que decidi tomar  a decisão de reforçar o plano de voo executado rigorosamente desde sempre como ação  preventiva: buscar e buscar incessantemente macroindicadores, indicadores e microindicadores que desmascarem o festival permanente de mentiras e meias-verdades, quando não de comemorações pontuais em evidentes forçadas  de barra.

Esse painel de controle pode ganhar sim a forma metafórica daquele deslumbrante equipamento de navegação sobre o qual comandante e subcomandante (é isso mesmo?) não desgrudam os olhos, por mais que a tecnologia inovadora pudesse dispensar tantos cuidados.

Ou seja: não adianta tentar contrariar o plano de voo expresso com base em procedimentos parametrizados pela ciência, desviando a atenção, porque qualquer movimentação em contrário provoca sérios prejuízos.

IMEDIATISMO LATENTE

Por conta do que chamaria de imediatismo, o que parece interessar cada vez menos a vários perfeitos de plantão no Grande ABC é pensar nos próximos 10 anos, por exemplo. O eu de cada um deles até prova em contrário se esgota na próxima esquina na linha do tempo de maturação de iniciativas.

Esses prefeitos não diferem da maioria (mas não de todos, como Celso Daniel e Orlando Morando, entre alguns, por exemplo) dos antecessores, mas, à moda Paulinho Serra, que aperfeiçoou o placar de insanidades populistas, capricham nas encenações.

Do jeito que vão indo já-já o Clube dos Prefeitos vai organizar uma Secretaria Regional de Efeitos Especiais. Antes, precisará solicitar autorização ao ex-prefeito de Santo André, especialista no assunto.

Nossos atuais prefeitos fazem do marketing político-administrativo um meio cada vez mais intenso e persuasivo rumo ao sucesso eleitoral futuro dos grupos que representam e que são cada vez mais exclusivistas. E não se pode duvidar que consigam sucesso. O territorialismo submeteu o regionalismo a regime de subjugação total.

ALGUNS-POR-ALGUNS

O Grande ABC dos anos 1990, bem ou mal, contava como mote do Fórum da Cidadania o “todos-por-um-projeto-regional”. De vários anos para cá o que temos é “alguns-por-alguns-por-um-projeto territorial”. Já escrevi sobre isso sem expressar a dupla-face inspirada nos três mosqueteiro.

Como se observa, aliás, ao olhar rapidamente para o passado recente e dar de cara com um prefeito medíocre como Paulinho Serra saindo glorificado do poder. Rebaixamos os critérios de competência a níveis incalculáveis. Ou melhor: calculáveis, porque o painel de controle ao qual me refiro na manchetíssima de hoje dinamita pedra de enganação sobre pedra de enganação.  

Não posso dizer porque ainda é muito cedo, mas o fato de ser muito cedo não me impede de sugerir, ou prognosticar, ou diagnosticar o seguinte: o prefeito de São Bernardo, Marcelo Lima, vai superar largamente o escancaramento midiático quase que opressivo de Paulinho Serra, agora adotado também por Gilvan Júnior, embora sem o mesmo impacto porque o novo prefeito é a antítese do que os marqueteiros queiram que seja.

Quem se der ao luxo de passar a mão na agenda já cumprida de Marcelo Lima (e para tanto basta observar o noticiário da mídia regional, quase que integralmente pró-prefeito de plantão) encontrará um show de espetacularização.       

FESTA INSUSTENTÁVEL

O Grande ABC é uma festa de riquezas, embora, contraditoriamente, não saia dos corredores do governo do Estado e também de Brasília a esmolar recursos públicos que orçamentos municipais não comportam. O custo acumulado do empobrecimento é enorme.

Marcelo Lima é bom mesmo de palco, de ruas, de favelas, de tudo que signifique acessibilidade ao povo. Ganha de goleada de Paulinho Serra em todos os aspectos. Sobretudo na empatia. Marcelo Lima é supersônico em magnetismo. Aqueles dois olhinhos brilham como holofotes. Paulinho Serra é um teco-teco industrializado e pasteurizado.

O noticiário diário de papel não deixa dúvida alguma há vários meses sobre o que teremos de confirmação no futuro próximo com base no passado de ontem e de anteontem: a ordem geral e irrestrita é pintar cada Município e o Grande ABC como um todo com cores aberrantes e reconfortantes.

INDICADORES LETAIS

Por pior que seja o quadro regional, por pior que manchetes que expõem a realidade impossível de ser negada, nas quais as iniquidades sociais teimam em aparecer, por mais que tudo isso ocorra, prevalece o Grande ABC Panglossiano. Uma Pasárgada.

Exatamente por conta de tudo isso e para evitar contaminação que sempre é uma ameaça, valho-me de mais de uma centena de indicadores sociais e econômicos do Grande ABC para combater o bom combate.

Estar absolutamente certo no Grande ABC quando se trata de avaliação de resultados em várias áreas é missão facílima; entretanto, isso não me envaidece.

Sigo estritamente o roteiro da lógica comprovada de dados tecnicamente sustentáveis produzidos por múltiplas fontes sólidas. Não preciso inventar a roda. Estou tão acostumado a escarafunchar mais de uma centena de indicadores que a tarefa já integra o cotidiano profissional.

UM SÉCULO ATRÁS

Os amadores detestam valor agregado de informação porque vivem e sobrevivem de superficialidades calculadas e generosamente recompensadas.

Por isso não caio na armadilha da autoglorificação constante, embora não negue que,  de alguma forma, mesmo que dilacerado pessoalmente, cada novo indicador confirmado na prática é interpretado como uma esperança de que algum dia a roda do engano coletivo perderá a velocidade por fadiga de material propagandístico radioativo.

Pena que esse desenlace é cada vez mais improvável porque se aperta a cada dia o parafuso de aceleramento de projetos políticos pessoais de olho no calendário eleitoral. Tanto é que o nível de exposição diária dos prefeitos de plantão nas redes sociais, além das páginas de jornais de papel,  não tem paralelo na história.

Se o meu amigo Ademir Medici recuperar os arquivos dos jornais que circularam na região há um século, provavelmente a linguagem e os objetivos utilizados seriam semelhantes aos atuais.

MAIS PERDAS VIRÃO

O oficialismo prevaleceria em detrimento da realidade. Até mesmo velharias linguísticas, por assim dizer, como “andreenses, são-bernardenses, sul-sancaetanenses” deixam sepulturas denominativas. Pior que isso é quando se referem ao Grande ABC como uma sopa de letras indigesta em forma de ABCDMRRG.

A diferença é que há um século contávamos com um Grande ABC integralizado na Administração Pública e reunia uma população provavelmente mais confiante no futuro que confirmou a expectativa. Já agora, dividido em sete pedaços disformes, o Grande ABC olha o futuro com preocupação imensa. Vem mais desindustrialização e mais exclusão social. A primeira é irrefreável, a segunda é atenuada por programas sociais tipo Bolsa Família.

Voltando a macroindicadores, indicadores e microindicadores, há variedade de ranqueamentos preparados por organizações públicas e privadas que destroem a reputação de gente que produz manchetes adocicadas hoje e não tem como evitar amanhã a prestação de contas dos fatos documentados.  

LISTA DO DESMASCARAMENTO

Qualquer dia desses vou expor a lista de  indicadores com os quais convivo nos  estudos sobre a regionalidade do Grande ABC, isoladamente ou em confronto com outras áreas principalmente do Estado de São Paulo.

O olhar sistêmico nos dados disponíveis ou nos dados resultantes de cruzamentos que oferecem mais flexibilidade e interatividade às mudanças que sempre afloram é o olhar da cautela.

Vou dar um exemplo decorrente dessa sistemática de fazer do jornalismo não um palco iluminado aos atores prevalecentemente interessados em espetáculo, mas um compromisso social próprio de idiota. 

Ainda outro dia o despreparado secretário de Desenvolvimento Econômico de São Bernardo, Rafael Demarchi, contratou fanfarra triunfalista para festejar a tabelinha da extraordinária “Capital do Móvel e do Automóvel”, como se vivesse nos anos 1960, 1970. Mal sabe que a produção de móveis em São Bernardo foi para a cucuia na medida em que a Doença Holandesa Automotiva centralizou o crescimento econômico.

FESTA MOVELEIRA

Só é possível garantir e provar que o secretário é despreparado (não só por isso, claro), porque os dados são inapeláveis. A indústria moveleira de São Bernardo representava, em 2021, dados mais atualizados, apenas 0,7% do Valor de Transformação Industrial local. Ou seja: nem o mísero 1%.

Quanto ao número de trabalhadores numa data semelhante, em 2019, São Bernardo registrava 2.855 carteiras assinadas no setor moveleiro. Sozinha, a fábrica da Bridgestone Firestone de Santo André conta com mais trabalhadores que todo o setor de móveis de São Bernardo.

Por isso, mais importante que programar o festival de móveis na Rua Jurubatuba nestes dias, embora a iniciativa não deva ser descartada, seria a contratação de consultoria especializada para invadir as entranhas do setor e providenciar radiografia completa do que resta e, também, de eventuais projetos de potencialização.  

POUCOS AMIGOS

Mas isso parece não interessar ao prefeito Marcelo Lima. A dinâmica programática de alcance essencialmente popular, mesmo sem lastro de crescimento econômico enraizado, dita o projeto administrativo.

Imagino a cara de poucos amigos que o secretário Demarchi e o prefeito Marcelo Lima me ofereceriam como resposta num contato pessoal. O desmascaramento provoca aversão pessoal. Já estou acostumado com isso. Faz parte do roteiro.

Não custa também lembrar que tudo o que sai da boca de quem pensa apenas em poder e votos precisa ser escrutinado entre outras razões porque uma coisa e outra coisa não são pecados capitais, mas fazem parte de prerrogativas pessoais e políticas.

QUEDA ACUMULADA

Paulinho Serra detesta que se lembre da queda de 39 posições de Santo André no ranking do PIB Per Capita no Estado de São Paulo, resultado obtido por este jornalista com base na lista sempre atualizada do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). E olhem que os dados se referiam apenas aos primeiros cinco anos daquela Administração.

E sempre ressaltamos que a queda não encontra explicação exclusiva durante os cinco anos consolidados. PIB Per Capita é resultado de  longa sequência de gestores públicos no interior de um quarto escuro em que o mobiliário macroeconômico é um estorvo ou uma benesse.

O erro de Paulinho Serra, calculadíssimo, mas autodestrutivo, é que sempre arvorou para si supostos bons resultados. Como se Santo André houvesse sido fundada em 2017.

O conselho que posso transmitir aos observadores críticos que tenham ou não os dois pés, o pescoço e os bolsos na folha de pagamentos de gestores públicos é que pensem bem antes de saírem dando tiros em quem toma todos os cuidados para fundamentar análises. O painel de controle é poderoso, justo e ecumênico. Tudo que os territorialistas detestam. “Alguns-por-alguns” não é brincadeira. É projeto de poder.



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