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Política

DANIEL LIMA - 14/09/2024

O melhor do debate de ontem à tarde do G-1 com os principais candidatos à Prefeitura de Santo André é que, entre outras projeções que não podem ser descartadas, abriram-se  portas e janelas que sugerem indicar o desalojamento dos atuais ocupantes do Paço de Santo André. E isso se deve, entre outros fatores, à retirada do candidato oficial, Gilvan Júnior, da zona de conforto. Acabou a imunidade crítica. Finalmente o contraditório ganhou oportunidade pública. Gilvan Júnior descobriu que navegar em águas plácidas é uma coisa. Numa tormenta, é outra.

Gilvan Júnior  teve de enfrentar questionamentos em profusão. E saiu chamuscado. Todos contra Gilvan, eis o lema de Luiz Zacarias, Bete Siraque e Eduardo Leite. Forças lulistas, bolsonaristas e alckmistas esqueceram as diferenças que as separam. Todos se juntaram contra o representante do prefeito Paulinho Serra. Gilvan Serra seria a identidade política mais adequada ao que se observou ontem.

Desde que inventaram debate eleitoral, o líder nas pesquisas sofre mais esfregões. E sofre ainda mais quando o líder nas pesquisas conta com muralha protecionista da mídia. Santo André de Gilvan Júnior, filho político dileto do grupo do prefeito Paulinho Serra, é o paraíso na Terra. Nem de longe flerta com a decadência de quatro décadas.

CONTRAPONTOS

Gilvan Júnior teve de enfrentar contrapontos dos adversários. Acabou a farra de que nada o atingiria porque estaria tudo sob controle num regime imperialista que Santo André experimenta há oito anos. O marketing de Paulinho Serra é um dos pilares da popularidade que ostenta.

A corrente pra-frente-Santo André foi rompida. Tanto que à primeira pergunta, na área de Segurança Pública, Gilvan Júnior a interpretou como agressão à imagem de Santo André. Utilizou o termo “denegriu” para criminalizar o autor do questionamento. A petista Bete Siraque, com elegância, o advertiu no último bloco sobre a conotação racista do verbete utilizado pelo candidato em duas intervenções.

Gilvan Júnior se sentiu incomodado pela primeira vez num evento público. Até então só recebera lantejoulas da mídia. Menos pior que não capitulou.  Democracia não se faz com capitulações, mas com antagonismos,  resiliência e compromisso social.

Entretanto, não há como minimizar os estragos. As águas críticas que passaram ontem por Gilvan Junior tornaram Gilvan Júnior diferente das águas críticas que jamais passaram antes do debate. Gilvan Junior não será mais o mesmo de antes.

FIM DO CONFORTO

A retirada de Gilvan Junior de  um ambiente sob controle expôs virtudes e deficiências. As feras que o feriram o fizeram com capricho, mesmo sem partir para a ignorância e agressividade. Gilvan Júnior não pode reclamar de maus-tratos, embora pretendesse dar essa tipificação em algumas respostas.

O fato é que simplesmente acabou o segredo sobre a personalidade pública de Gilvan Júnior. A nota de zero a dez não passaria de cinco. A falta de carisma é compensada pelo palavreado típico de quem passou a juventude cuidando de clientes e mercadorias no varejo familiar.

Gilvan Júnior é um menino educado, carrega um sarcasmo elegante, mas ainda está longe de convencer os mais exigentes de que é um gênio  da Administração Pública e que, portanto, as diferentes funções que ocupou nos últimos oito anos seriam as provas provadas disso.  

Há alguns pontos-chave que não podem deixar de constar de uma lista de prioridades na análise do debate de ontem, entre outras razões porque são a base à compreensão de que Gilvan Júnior terá dificuldades maiores que as previstas para matar o jogo eleitoral no primeiro turno e, mais que isso, sustentar favoritismo no turno final. Vejam o que temos.

1. TODOS CONTRA GILVAN.

2. ATAQUES AS BASES FRÁGEIS.

3. ESTOCADAS INCOMODAS.

4. SENSIBILIDADE DEMAIS. 

Vamos então a breve avaliação do debate levando-se em conta justamente a vitrine acima. 

1. TODOS CONTRA GILVAN 

Em nenhum momento do debate os candidatos de oposição deixaram Gilvan Júnior fora de artilharia. Mais que concentrarem fogo no candidato do Paço Municipal, Eduardo Leite, Bete Siraque e Luiz Zacarias se autoprotegeram. Não dirigiram uma questão sequer aos respectivos aliados táticos. Mais que isso: trataram de botar em campo escadas de perguntas e respostas que reforçassem a estratégia de impactar o candidato do Paço. Eventuais questões não esclarecidas ou mal explicadas em intervenções anteriores por conta de conflito entre informação e o cronômetro, sempre tiveram esticamento em participação posterior, mesmo que a temática fosse outra.  

2. ATAQUES AS BASES FRÁGEIS 

Saúde, Educação e Segurança Pública em Santo André, de qualidade comprovadamente aquém das expectativas, como na quase totalidade dos municípios, foram persistentemente explicitadas. Gilvan Júnior fez o possível para impedir que se incendiasse o que a Administração de Paulinho Serra vende e empacota como uma das maravilhas do mundo.

Não existe humildade e reconhecimento de que Santo André tem sérios problemas em áreas vitais. O equívoco do governo Paulinho Serra que Gilvan Júnior mimetiza é tentar fazer crer que Santo André é um endereço perfeito para morar e empreender. Os adversários bem-postados no debate do G-1 não deram tréguas. Expuseram dados suficientes para neutralizar a pretensa qualidade dos serviços nessas áreas.

É verdade que Eduardo Leite, Luiz Zacarias e Bete Siraque poderiam comprovar mais ainda. Há em comum entre os adversários do Paço Municipal uma dificuldade de acentuar crítica com dados oficiais. Mas Santo André vai tão mal em Segurança, Educação e Saúde que os oponentes nem precisam caprichar.  O Ranking de Competitividade dos Municípios Brasileiros, recentemente divulgado, coloca Santo André muito aquém do PIB per capita. Apenas na área de saneamento básico, assim como os demais municípios da região, retira Santo André do fracasso. 

3. ESTOCADAS INCOMODAS 

Em nenhum momento o debate descambou para a agressividade verbal, para a esculhambação que se viu ainda recentemente num dos encontros entre os candidatos à Prefeitura de São Paulo. A temperatura morna das primeiras rodadas cedeu espaço a incursões mais sutilmente ácidas, recheadas de fair-play e também de fina ironia.

Luiz Zacarias usou várias vezes o diminutivo Gilvanzinho e “papai Paulinho” para se referir às relações entre o candidato do Paço e o titular do Paço. Zacarias não fez nada diferente do que o próprio candidato Gilvan Júnior sugere. E o que Gilvan Júnior sugere? Uma dependência discursiva do prefeito. Parte da personalidade individual de Gilvan Júnior é engolfada pelos trejeitos verbais de Paulinho Serra. E também até mesmo na articulação de respostas e ponderações. Gilvan Júnior é uma caricatura do prefeito. Talvez tenha se policiado para evitar o uso do verbete “pertencimento”, apropriado por Paulinho  Serra do léxico social de Celso Daniel.  

4. SENSIBILIDADE DEMAIS

Embora a temperatura da disputa no G-1 não tenha chegado a elevação que pudesse ser chamada de efervescência, Gilvan Júnior revelou-se sensível a determinadas intervenções dos adversários. E, lembrando Paulinho Serra, adotou postura de vitimismo. Mas soube disfarçar o peso de que todos os concorrentes o tinham como alvo único. A ordem única dos opositores, horas antes informados de que a pesquisa do Instituto Paraná foi traduzida pela Diário do Grande ABC como uma avenida larga à definição da disputa em turno único, serviu de senha informal à oposição. Nada poderia ter sido mais explosivo ao ajuntamento dos adversários. 



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