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Economia

DANIEL LIMA - 12/09/2024

Um artigo na terça-feira e uma curta reportagem-chamada na edição de hoje do Diário do Grande ABC colocam dois sindicalistas e toda a classe de sindicalistas na condição de conselheiros especiais da Economia do Grande ABC. Estamos vivendo tempos esquisitos.

A mesma economia que contou com intenso trabalho destrutivo da classe sindical, não bastassem outros agentes na operação que transformou a região em Detroit à Brasileira, agora se veria entregue a especialistas improváveis. Sindicalistas confessadamente ideológicos não seriam mesmo especialistas improváveis.

Estamos vivendo os fins dos tempos institucionais. Qualquer um se acha no direito de se proclamar salvador da pátria. Que tenham essa pretensão, porque liberdade de expressão deve contemplar a todos. Só não podem acreditar que os minimamente conhecedores da história regional comprem bugigangas argumentativas que pretenderiam implantar.

E as bugigangas argumentativas que pretendem vender embutem vitimismo insano. A classe sindical tem sim muita culpa no cartório de notas de desindustrialização econômica e de documentos que comprovam o  esfacelamento econômico e social.

ARTIGO DO DIÁRIO

Num artigo à página dois do Diário do Grande ABC de terça-feira, Rafael Marques, ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e representante dos trabalhadores da Ford durante quase três décadas trata do espaço físico deixado pela multinacional.

Rafael Marques faz especulações, no bom sentido do termo, sobre o destino da área. Sob o título “Um milhão de m2 sem destino”, Rafael Marques questiona o andar da carruagem da ocupação econômica do terreno adquirido inicialmente pela Construtora São José com a finalidade de instalar uma grande operadora de galpões logísticos. Em seguida, o terreno foi negociado com a Prologis, também do setor de logística.

Os detalhes sobre o negócio propriamente dito pouco importa ao conceito do texto que decidi abordar, com base em alguns trechos do artigo. Veja um desses trechos:

 É preciso que o poder local, especialmente nesse terreno da Ford, que tem o histórico de resistência de seus trabalhadores, estabeleça uma relação com a nova proprietária. Temos que estar atentos para que, da mesma forma que a Construtora São José especulou, a Prologis não faça a mesma coisa. É importantíssimo que, durante o período eleitoral, se discuta a manutenção da área industrial, mesmo que inativa, preservando o zoneamento e garantindo a geração de riqueza, de empregos e oportunidades que reerga a cidade, que vive um congelamento de investimentos, de ideias e de desenvolvimento. Em um momento eleitoral, esse é um debate que tem que ser feito pelos que pleiteiam a vaga de prefeito de São Bernardo.

CONTRAPONTOS 

Vamos fazer uma breve avaliação desse trecho do artigo do sindicalista?

1. O que empreendedores privados têm a fazer no terreno  ocupado pela Ford de tantos embates entre capital e trabalho é problema dos empreendedores privados. O intervencionismo estatal é típico de regimes autoritários que pretendem centralizar tudo e entregar a poucos poderes sempre suspeitos.

2. O máximo que um prefeito em situação específica do caso Ford pode fazer e provavelmente já o tenha feito é manter relações com os empreendedores sobre o destino de mercado que sempre terá o controle dos investidores. São Bernardo, salvo algumas exceções setoriais sem grande impacto diante o peso da desindustrialização liderada pelos sindicalistas (e que teve outros agentes e situações como chagas de agravamento) não conta com poderes nem oficiais nem teóricos para interferir no destino daquela área, destinando-a ao uso industrial subjacente no artigo do sindicalista.

3. Discutir arbitrariamente o futuro daquele espaço já é uma agressão institucional e constitucional, a depender do grau de intervenção. Quanto mais num período eleitoral, como sugere o sindicalista. A criatividade combinada com a irresponsabilidade e multiplicada pelo populismo em período eleitoral serve como combustível a barbaridades decisórias. 

CLUBE DOS PREFEITOS

Na edição de hoje, sob o título “Falta vontade a prefeitos para voltar ao Consórcio, declara Teonilio Barba”, o ex-presidente do mesmo sindicato dos metalúrgicos e hoje deputado estadual critica a ausência de São Bernardo e de São Caetano no Clube dos Prefeitos. Um vácuo que vai completar dois anos. Numa análise retrospectiva do valor médio da atuação daquele entidade, não se alterou praticamente nada em termos de relações dos agentes regionais. Pior que isso: rusgas pessoais e institucionais aumentaram a beligerância e o divisionismo desse bicho de sete cabeças. 

JOGO ELEITORAL

Não vou perder meu tempo acompanhando a entrevista do sindicalista no ramal audiovisual do Diário do Grande ABC. É disso que se trata a matéria que chama à entrevista. Teonílio Barba faz um jogo de cena político-eleitoral num ambiente  dominado pelo populismo.

Teonílio Barba sabe tanto do histórico e das realizações pífias do Clube dos Prefeitos como este jornalista conhece astronomia ou osteoporose. Apresenta-se nesse momento como conselheiro farsante, para ser reto e direto. Veja um trecho da reportagem de hoje: 

 Falta vontade política aos prefeitos para voltar ao Consórcio. Os prefeitos não podem ter vaidade, (pensar que) só porque não gosta de um ou de outro vou sair. Não pode ser assim. O Consórcio é um instrumento da sociedade, de mais ou menos três milhões de pessoas que vivem na região. O Grande ABC deve ser o quarto ou quinto faturamento do país”. (...)  Tem que haver cobrança da sociedade civil organizada, das associações comerciais, universidades, dos nossos polos científicos de conhecimento, dos polos empresariais, enfim. Há muita gente que pode ajudar a forçar a barra para que os sete prefeitos atuem de maneira unificada em defesa da região” – sustentou.

CONTRAPONTOS

Vamos aos contrapontos às declarações do sindicalista-consultor: 

1. Há no acervo de CapitalSocial o total de 885 textos que tratam diretamente ou indiretamente do Clube dos Prefeitos. Não existe nada que se assemelhe ao conhecimento acumulado e às projeções, perspectivas e críticas à atuação de uma entidade. Por isso, as declarações de Teonilio Barba ingressam no terreno populista e desprovido de qualquer consistência.

2. Prova disso é quando se refere à “sociedade civil organizada” do Grande ABC. Nada mais espetacularmente vexaminoso. O Grande ABC é uma terra sem eira nem beira, dominado por uma casta de mandachuvas e mandachuvinhas que querem tudo, menos que a sociedade civil organizada exista. Por isso o que temos mesmo é sociedade servil desorganizada.

3. As instituições as quais se refere o entrevistado (associações comerciais, academias e outras mais) não passam de corporações que olham para o próprio umbigo de ambições individuais e grupais. Procurem onde quiserem um único movimento consistente e duradouro colocado em defesa da sociedade fragmentada. Não existe nada. Só existiu o Fórum da Cidadania, que morreu de morte matada.

4. O resumo da ópera do Clube dos Prefeitos que já completou mais de três décadas é lacrimejante para quem sonha com uma Cidade João Ramalho em regionalidade. Jamais deixou de ser o comando do Clube dos Prefeitos uma cidadela de individualidade municipalista num suposto coração de regionalidade, seguida de protagonismo individual estelar, de corporativismo setorial e de partidarismo carreirista. Perguntem ao deputado Teonilio Barba se ele tem alguma ideia do que essa trajetória significaria para explicar o Clube dos Prefeitos como peça descartável de uma integração regional fajuta. Perguntem. Só são capazes de responder sem enrolar quem conhece a história da região. E particularmente do Clube dos Prefeitos. Aliás, Teonilio Barba talvez nem entenda por que chamo o Consórcio de Prefeitos de Clube dos Prefeitos há 300 anos.   

EXAGEROS E OMISSÕES

Por eventualmente melhores que sejam as intenções de sindicalistas preocupados com o futuro da região é preciso que eles entendam o buraco temporal que os separa hoje do ontem. O hoje é consequência de um ontem que eles ajudaram a erguer em forma de reivindicações exageradas, de corporativismo excessivamente voltado ao próprio umbigo e uma participação institucional incapaz de enxergar o Grande ABC como um todo, não apenas as grandes corporações industriais. As pequenas indústrias foram dizimadas.

Os prefeitos que se escafederam da farsa chamada Clube dos Prefeitos contam com o salvo-conduto de que não compartilharam de uma esculhambação geral da entidade que se lançou nos braços do carreirismo populista inaugurado pelo prefeito Paulinho Serra. Ele loteou a instituição movido por voos ambiciosos.



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