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Imprensa

DANIEL LIMA - 09/09/2024

No dia 16 de junho de 2004 produzi a terceira edição da newsletter OmbudsmanDiário. O destaque das análises foi a criminalidade na região e a forma de tratamento do jornal. A criação da Universidade do Grande ABC voltou a ser colocada em questão. Era preciso repassar conceitos editoriais que poderiam colaborar à definição do perfil da instituição.

Após minha saída do jornal, não houve sequência dos trabalhos. Mais que isso: o que tivemos com a instalação da Universidade Federal do Grande ABC, dois anos depois, foi um fracasso de interação. Forças sociais e econômicas jamais se uniram para pautar a academia. Vejam o texto completo:

EDIÇÃO NÚMERO TRÊS  

Disse na reunião com representantes do jornal, na tarde de segunda-feira, que o atendimento às avaliações deste profissional é arbítrio dos interlocutores, incluindo-se diretores, acionistas e jornalistas. Ratifico essa informação, mas com adendo importante: insistirei sistematicamente nos enunciados que julgo de transcendental importância para o complexo editorial da publicação. Para tanto, estarei sempre sintonizado com o "Planejamento Estratégico Editorial" que preparei, entreguei e foi aprovado pela direção do jornal quando de negociações para que assumisse o cargo de Diretor de redação.  

Imaginar, mesmo que tenuamente, que vou renunciar àqueles pressupostos é confundir minha personalidade com a daquele presidente extraordinariamente incapaz (embora brilhante intelectual) sacramentada na máxima "esqueçam o que escrevi".

Até prova em contrário, e para isso é preciso muita argumentação teórica e complementaridade prática, o "Planejamento Estratégico Editorial" é a vereda sobre a qual deverei exercer este ofício.  

CRIMINALIDADE (1)

A espetacularização de manchetes de primeira página voltadas à área criminal é uma guinada editorial que se contrapõe ao perfil construído durante décadas e que, à parte qualquer julgamento sobre o valor do produto, sempre manteve a publicação a salvo de sensacionalismo. "Presos maníacos do Escort branco" é mais uma manchete das últimas semanas que enveredam pelo impacto circunstancial, em detrimento de questões mais relevantes e profundas. 

Abrir a primeira página de forma tão superficial seria por si só inflexão abrupta que provavelmente choca os leitores mais assíduos da publicação, mas há um ponto que deve ser explicitado: o Editorial.  

Está no Editorial de hoje um enunciado francamente insustentável: "O desfecho do caso (da prisão dos maníacos do Escort branco, que desde o início de abril atormentavam as mulheres do Grande ABC) joga por terra argumentos pessimistas de que a criminalidade já não tem controle, seja pela suposta inércia da polícia ou pela sofisticação dos bandidos".  

Basta dirigir-se ao site do Instituto de Estudos Metropolitanos (www.ieme.com.br), laboratório que criamos com um grupo de voluntários, para dinamitar essa sentença de triunfalismo evidente. Somos conjuntamente um dos piores endereços do Índice de Criminalidade entre os principais municípios paulistas. Ali estão dados relativos a homicídios, roubos e furtos de veículos, roubos e furtos diversos.  

Fôssemos uma região relativamente afastada do domínio da criminalidade organizada, e não um espaço em que se registra o dobro dos casos de homicídios em Nova York, cuja população é três vezes maior que a do Grande ABC, teria sentido tamanho entusiasmo.

Basta uma leitura rápida em arquivos do próprio jornal para verificar o quanto já ultrapassamos a linha de risco criminal e invadimos o campo da barbárie em determinados territórios.  

Transformar efetividade circunstancial em capacidade resolutiva estrutural é grave equívoco do jornal em qualquer instância temática. Sobretudo na criminal enraizadamente alucinante em nossas fronteiras. 

CRIMINALIDADE (2)

São Caetano aprovou ontem a chamada Lei Seca, que restringe a abertura de estabelecimentos comerciais que comercializam bebidas alcoólicas. A reportagem está concentrada em enunciados legislativos quando o melhor caminho teria sido a área criminal, inclusive com uso do banco de dados sobre as experiências vitoriosas de Diadema e Mauá.

Também faltaram dados criminais de São Caetano, disponíveis no site do Instituto de Estudos Metropolitanos (www.ieme.com.br). 

O jornal não consegue informar qualificadamente o leitor porque o problema de São Caetano não são homicídios (razão da aplicação da Lei Seca em Mauá e Diadema), mas furtos e roubos de veículos. Com todas essas observações e mais o fato de a Lei Seca também estar em estudos em Santo André, não resta dúvida de que esta sim poderia ser a manchete principal do jornal. Trocaríamos a circunstancialidade pela densidade.  

CRIMINALIDADE (3)

O leitor Dalmir Ribeiro ocupa espaço na "Palavra do Leitor" para oferecer um ângulo de análise do caso das arruaças nas imediações do Clube Atlético Aramaçan que faltou no noticiário do jornal. O major da PM Edson Sardano, que acompanhou o caso de perto, tem informações importantes sobre o assunto. O caso não está encerrado. O Aramaçan pode, inclusive, sofrer restrições à aplicação do calendário de eventos em seu salão nobre.

Se o jornal se lançar a essa empreitada provavelmente estará prestando serviços à comunidade não necessariamente pela eventual punição do clube, que é outra questão, mas sobretudo pela harmonização do problema. 

METROPOLIZAÇÃO

A notícia sobre a Urbis na edição de hoje reduz o déficit de atenção às questões metropolitanas, mas isso é apenas um pedaço do bolo: se houver encaminhamento à cobertura do evento, mais importante que a reprodução de cases municipais seria, sem dúvida, a cobertura de macrotemas que atormentam a vida do cidadão metropolitano. O escopo da programação contempla tanto uma coisa quanto outra. Não se trata de escolha de Sofia. 

UNIVERSIDADE DO GRANDE ABC

A reportagem da reunião de ontem do Consórcio de Prefeitos é apenas expositiva e não apresentou a sequência editorial lógica de insistir no estranhamento da ausência de representantes dos setores econômicos no quadro de iluminados que vai traçar o perfil da instituição.

No encontro com os editores repassei o conceito de comprometimento regional e de responsabilidade social do jornalismo. A Universidade do Grande ABC é uma embarcação pilotada por alguns protegidos oficiais sem que o jornal se apresente como âncora de uma comunidade economicamente vilipendiada na última década.

A impressão que tenho é clara: o jornal tem bons profissionais de redação mas vive traumas de indefinição editorial e, com isso, mantém acionadas as travas da interpretação judiciosa.  

Ao levar para o topo de página de "Economia" o encontro de Mercocidades, realizado ontem nas instalações da Rhodia, em Santo André, o jornal recupera-se da edição anterior. A abordagem me pareceu interessante, sob o título "Especialistas dizem que política industrial do país ignora Mercosul". 

COPA DO BRASIL (I)

O texto sob o título "Ramalhão vê o filme do rival", referindo-se ao fato de os jogadores e Comissão Técnica do Santo André estarem atentos à disputa desta noite entre Flamengo e Vitória, poderia ser destacado como bom exemplo de criatividade e interpretação. A circunstância do jogo e a importância do resultado para o Santo André foram adequadamente enquadradas. Uma sugestão: jogadores e comissão técnica não anteciparão preferência pelo adversário das finais, mas tenho informações de que os dirigentes torcem pelo Flamengo -- por causa de vantagens econômicas. 

COPA DO BRASIL (II)

A matéria que resgata jogos memoráveis do Santo André na Capital, onde enfrentará o outro finalista da Copa do Brasil, é bom aquecimento à mobilização dos torcedores. Há mais variáveis que podem ser exploradas. Creio que a partir de amanhã o jornal poderia esquentar ainda mais a cobertura das finais. Em situações especiais, a mobilização também precisa ser especial. 

ALPHARRABIO

O endereço de Dalila Teles Veras, realçado no "Cultura e Lazer" de hoje, é um farol de inteligência regional que não pode ser esquecido. Só houve excesso espacial no tratamento gráfico dos números. Parametrizado com o anúncio à direita, a impressão inicial resvalava para uma peça publicitária. 

ECONOMIA REGIONAL

Ao esconder da primeira página os dados da Paep sobre o encolhimento da indústria regional o jornal age como avestruz. Está provado que não se trata de medida profilática, porque se o fosse o Grande ABC não teria descambado tanto nos últimos anos. Embora a cobertura tenha sido de boa qualidade, o jornal poderia ter-se aprofundado nos dados. Entre outras razões porque a entrevista coletiva foi marcada com antecedência. Se o problema for de efetivo pessoal, está explicado. 

CASO CELSO DANIEL

O jornal publicou na edição de ontem ("Blat critica monopólio da polícia em investigações") notícia que não faz qualquer menção ao caso Celso Daniel, embora a questão abordada seja de interesse regional por causa da morte do prefeito. Não é novidade que o promotor de Justiça do Estado e ex-integrante do Gaeco José Carlos Blat seja opositor à exclusão dos promotores públicos nos inquéritos criminais, como parece estar-se encaminhando a decisão do STF (Supremo Tribunal Federal).

Nada mais correto que ouvi-lo, entretanto, porque ele é uma das peças mais notórias do tabuleiro de xadrez das disputas extrapoliciais. Além disso, o assunto fará parte do debate programado para dia 25 no Legislativo de Mauá. 

O caso Celso Daniel está implícito na controvérsia porque a decisão do STF poderá compulsoriamente retirar o empresário Sérgio Gomes da Silva da prisão. Como se sabe, Sérgio Gomes foi denunciado pelo Ministério Público Estadual como mandante do crime. Anteriormente, tanto a Polícia Civil quanto a Polícia Federal consideraram evento ocasional o sequestro seguido de assassinato. 

Fica a sugestão para que se ouça alguma autoridade policial sobre a possível decisão do Supremo. Um delegado da Capital, cujo nome posso repassar ao jornal, fez duríssimas críticas à infiltração do Ministério Pública nas apurações policiais. Espero que o jornal -- como todos os jornais -- sempre democrático com promotores públicos, também o seja com autoridades policiais. 



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