A pesquisa eleitoral publicada na edição de hoje do Diário do Grande ABC sobre as eleições deste ano em São Caetano serve para pouca coisa, além de confundir muita coisa, embora as coisas que se confundem também possam esclarecer, desde que se especule um bocado. A frase é longa e proposital para exprimir meu sentimento após ler o jornal.
Há tantas interrogações que, exatamente por existirem, ajudam a tornar qualquer análise uma extensão da criatividade além dos números detectados e do juízo de valor.
Dois dados desclassificam de imediato a garantia de que estamos diante da ciência, selo de suposta segurança. Primeiro, não se publicou o contingente de eleitores que, indagados sobre em quem votariam no próximo seis de outubro, responderam de prontidão, apontando um nome com convicção.
Esse é o chamado voto espontâneo, um caminhão de certezas e convicções. Sem o voto espontâneo, todo o resto se torna precário, sujeito a chuvas e trovoadas do ambiente político-eleitoral. Uma situação, portanto, distante do ambiente nacional, por exemplo, onde direita e esquerda logo entregam os pontos de identificação.
VULNERABILIDADE
Nos casos recentes de pesquisas semelhantes em Santo André e São Bernardo, passou de 60% o total de eleitores que não se pronunciaram de imediato no apontamento de qualquer concorrente. O voto espontâneo foi tão inexpressivo que carregou as mesmas indagações de agora.
Os eleitores em Santo André e São Bernardo só abriram o bico da preferência e mesmo assim com larga margem de dúvida quando instados pela cartela circular com a identidade de todos os concorrentes. Nesse caso, fatores subjetivos prevalecem. E podem ser renegados no futuro próximo.
Experimente responder de supetão quem são seus verdadeiros amigos, nos quais você confia plenamente. Quantos nomes serão mencionados e quantos deixarão de sê-lo? Os que deixaram de ser mencionados imediatamente não são amigos de fato. Podem ser descartados em qualquer situação de risco. O amigo de verdade é o voto espontâneo. O amigo descartável porque não é amigo de verdade é o voto estimulado.
VIZINHO DO VIZINHO
Mesmo no caso de São Caetano, que é um caso especial, sem contar em mãos com a maioria que certamente está longe de dizer de bate-pronto em quem vai votar, duvido que o montante seja mesmo inferior ao que se registrou nos outros municípios.
Acredito nisso, ou um pouco menos disso, mas sempre no mesmo foco, mesmo com São Caetano sendo o que é, uma cidade territorialmente pequena, uma cidade densamente ocupada e uma cidade onde o vizinho conhece o vizinho do vizinho do vizinho. Talvez um pouco menos de incidência de resposta evasiva, talvez um pouco menos, mas nada significativo no voto espontâneo.
Dito isso, a segunda etapa de insegurança para quem quer analisar com seriedade os dados apresentados é a margem de erro estratosférica de 3,9 pontos percentuais. Três vírgula nove pontes percentuais são até sete vírgula oito pontos percentuais de elasticidade numérica. Quem tem 20% pode ter 23,9% ou 16, 1% e assim por diante. Sinceramente, não dá liga à honestidade ou segurança informativa.
De qualquer forma, não há surpresa chegar à conclusão preliminar e precária, mas que também poderá ser definida e garantida, de que há três concorrentes para valer à sucessão de José Auricchio: Regina Maura, que ganhará a oficialidade de apoio a qualquer momento, Tite Campanella, prefeito interino durante um ano, e Fabio Palacio, duas vezes seguidas concorrente nas urnas com votação expressiva.
TUDO EMPATADO
No cenário em que os três concorrem igualmente, Tite Campanella chega a 27,1% dos votos, ante 23,1% de Fabio Palacio e 20,2% de Regina Maura. Adicione 3,9 pontos percentuais em cada resultado para cima e para baixo, em confronto individual entre os três concorrentes, e veja a que ponto chega a bagunça numérica.
Um exemplo do primeiro cenário? Tite contra Regina Maura tanto pode ser 31,0% a 16,3% como, em sentido inverso, 23,8% a 24,1%. Combinações que envolvam Fabio Palacio com os outros dois concorrentes, em disputas específicas, terão resultados assemelhados. No fundo, portanto, está tudo empatado. E se está empatado está confuso e se está confuso quem é o maluco para dizer que se tem suficiente garantia de que se trata de verdade mensural?
Nos dois cenários seguintes, entre Regina Maura e Fabio Palacio e entre Tite Campanella e Fabio Palacio, chega-se a mesma conclusão. Ou a nenhuma conclusão prática. Os 30,3% a 29,8% de superioridade de Regina Maura frente a Fabio Palácio e os 36% a 29,2% de superioridade de Tite Campanella sobre Fabio Palacio estariam rigorosamente dentro da margem de erro num dos cálculos possíveis. Ou, contrariamente, disparadamente distantes quando a equação é destinar 3,9 pontos percentuais a quem tem vantagem numérica e diminuir o mesmo tanto de quem está logo abaixo.
PONTO VISCERAL
Há um ponto, entretanto, ao qual poderia dar mais atenção, mas que preferi deixar mais para baixo porque não queria desperdiçar mais uma vez a importância de relativizar a pesquisa como um todo. Há um ponto, como dizia, que me deixou encafifado.
Pensem comigo com atenção, porque acredito que pouco se deram conta disso. Quem sabe apenas um ou outro assessor mais experiente e que domine a política de São Caetano com maestria. Trata-se do seguinte: por que o cenário envolvendo Tite Campanella e Regina Maura não foi testado pelo Instituto Paraná? Por que a pesquisa colocou frente a frente, depois do trio de competidores, duas das três alternativas de escolha envolvendo duplas, e sonegou a competição entre Regina Maura e Tite Campanella?
Esse é um ponto que vai muito além do simples esquecimento ou desprezo ou qualquer outra coisa. Um embate direto entre Regina Maura e Tite Campanella poderia revelar a tendência de o eleitorado de Fabio Palacio migrar para uma das duas outras bandas. Ou também de rejeitá-los.
Entretanto, ainda mais importante que a ausência desse embate direto, e cuja efetivação não teria o poder de responder ao que apresento de imediato, é o grau de subjetividade que os eleitores de São Caetano atribuem à proximidade entre Tite Campanella e José Auricchio Júnior.
Afinal, há um histórico que precisa ser lembrado. Tite Campanella foi prefeito interino durante um ano e, publicamente, seguiu a cartilha de José Auricchio, que, vencedor eleitoral, foi julgado e inocentado no tribunal eleitoral. Ficou um ano fora do poder.
O QUE FAZER?
Conclui-se, portanto, que, supostamente, Tite Campanella é um candidato do Paço Municipal, juntamente com Regina Maura. Mas Tite Campanella não é o candidato a prefeito do Paço Municipal porque Regina Maura tem de longe a preferência. Inclusive porque em algumas arremetidas, como prefeito, Tite Campanella se aproximou demais de adversários de José Auricchio. Há entre os dois animosidade controlada.
É a esse ponto nevrálgico que chego. Afinal, se o eleitorado interpreta Tite Campanella e Regina Maura muito próximos da vontade do prefeito José Auricchio, que detém 70% de aprovação do eleitorado, como evitar que, quando as urnas forem colocadas à disposição dos eleitores, a soma das partes seja inferior à soma do adversário chamado Fabio Palacio, esse sim visto como concorrente?
O que a gestão de José Auricchio vai fazer para tornar prevalecente o voto situacionista sem correr o risco de canibalismo que favoreceria Fabio Palacio? Quem parte e reparte e não fica com a maior parte, é bobo ou não entende da arte política. Essa frase é antiga e desafiadora nesse caso.
CONTABILIDADE DE RISCO
É preciso entender que o quadro revelado no primeiro cenário da pesquisa do Instituto Paraná, que atribui 27,7% dos votos a Tite Campanella e 20,2% a Regina Maura, ante 23,1% a Fabio Palacio, não é um quadro garantidamente sustentável nas urnas, considerando-se que os três concorram mesmo. Para isso, Tite Campanella teria de deixar a federação Cidadania/PSDB.
Se os dois concorrentes estiveram juntos numa chapa, a contabilidade de risco seguirá adiante.
Acho que faltou uma abordagem especifica do Instituto Paraná, voltada a tentar descobrir o grau de governismo embutido no nome de Tite Campanella. Com o resultado, teríamos chegado, quem sabe, ao que chamaria de consolidação do voto governista a fim de se chegar a uma conclusão anda mais profunda: qual seria a margem de segurança de uma chapa que incorpore os dois governistas em contraponto à individualidade de Fabio Palacio?
Seria mais interessante manter Tite e Regina Maura juntos ou separados? Todos devem estar a fazer contas. Palacio provavelmente prefira-os separados. Poderia ter menos que os dois juntos, mas poderia ter mais que cada um dos dois separados. Como só se disputa um turno em São Caetano, quem chega em primeiro só tem que comemorar. Mesmo que supostamente tenha minoria de votos.