Para discorrer sobre Regionalidade e Regionalização, ou Regionalização e Regionalidade, é preciso distinguir uma coisa da outra, porque as duas coisas não são a mesma coisa. Regionalização é um time de catados. Regionalidade é uma equipe.
Outro dia escrevi de passagem sobre o que vou escrever hoje. Hoje, procurarei ser mais profundo. E não abro mão disso porque tenho lido aqui e ali gente que confunde as bolas. E só confunde as bolas porque não entende nem de uma coisa nem de outra coisa.
Houvesse nas escolas da região (do Ensino Fundamental à Universidade) algo como curso extracurricular direcionado exclusivamente a esse território tão diferenciado no ambiente metropolitano do País, um curso sobre Regionalidade e Regionalização, não tenham dúvidas os leitores que, se bem administrado, contaríamos com um reforço e tanto em busca de cidadania hoje esfarelada.
Na medida em que estudantes da região não compreendem ou, pior ainda, não têm a mínima ideia do que significa morar no ABC Paulista, mais nos distanciaremos de uma arrancada mesmo que tímida de transformações.
RABO DE FOGUETE
E no caso transformações seria um rabo de foguete em que estariam envolvidos todos os agentes com poderes tanto no âmbito público como privado.
Haveria uma conscientização mais bem elaborada e sustentável de que estamos cada vez mais na roça do isolacionismo imprevidente.
Dado o que a construção de regionalidade e de regionalização significaria uma corda com a qual os agentes públicos e privados que estão no comando dos municípios da região poderiam se enforcar, não custa alertar que é perder tempo acreditar que alguém com poderes tomará a iniciativa de sugerir que escolas adotem essa pauta. Regionalidade derivada de Regionalização não teria vez.
Afinal de contas, o que é regionalização e o que é regionalidade no sentido do que temos no ABC Paulista como potencial exploratório e mudancista?
CONFUNDINDO AS BOLAS
Ainda insisto em fazer suspense porque outro dia li num jornal uma abordagem que, aliás, me fez refletir sobre o detalhamento da distância que se impõe entre uma coisa e outra coisa.
O texto se referia à regionalização como sinônimo de regionalidade e insisto em alertar que essa correlação não tem cabimento exceto como estágio preliminar a mudanças.
Confundir as bolas é algo como dizer que um catado de 11 jogadores forma uma equipe de futebol. Catado é sempre catado. Equipe de futebol é algo mais bem elaborado e comprometido.
Regionalização é um catado. Regionalidade é um time organizado. Catado improvisa sem arte coletiva, vive de voluntarismos individuais, de força de vontade sem aptidão ou técnica. Equipe desempenha ações coordenadas. O que sobra de improvisação e voluntarismo no primeiro, abunda em sistemicidade no outro, com o adicional de que a arte, a técnica e o talento resplandecem onde viceja organização.
EXEMPLO PRÁTICO
Vamos partir para um exemplo prático sobre a diferenciação entre Regionalização e Regionalidade? Vou mais longe no sonho de um curso extracurricular.
Fosse propagador motivacional do que chamaria de uma cartilha em busca da regionalidade junto a estudantes de qualquer escola, não abriria mão de, imediatamente, expor o fosso que separa uma coisa da outra.
E separar uma coisa da outra é essencial, caso contrário muitos estariam satisfeitos com os ensaios sobre Regionalização e não chegariam jamais à Regionalidade.
Imagine diante de alunos do Ensino Fundamental ter de explicar o que é Regionalização e Regionalidade se a maioria provavelmente mal sabe onde vive, ou seja, numa determinada cidade de uma determinada região próxima a São Paulo.
POUCO CONHECIMENTO
Pode parecer brincadeira, mas há duas décadas uma pesquisa junto à população da região detectou que uma imensa maioria não conseguia identificar os sete municípios locais. Ou seja: para maior parte dos entrevistados, a região exposta era formada por apenas alguns dos municípios, notadamente os mais tradicionais. Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra mal foram identificadas.
Não creio que houve mudança significativa a ponto de, ao se enunciar qualquer expressão que identifique os sete municípios, especialmente ABC Paulista, o mais conhecido, se alteraria aquele placar. Mais que isso: apenas o confirmaria.
Portanto, a primeira lição como expositor a alunos de qualquer nível educacional exigiria breve explicitação didática sobre o que somos territorialmente. É melhor não detalhar aspectos sociológicos, como Complexo de Gata Borralheira, por causa da vizinhança com a poderosa Capital. Seria perda de tempo e embaralharia as mentes.
Diferenciar Regionalização de Regionalidade exigiria metáfora como a que mencionei acima, entre equipe de futebol e catado de futebol. Acho que partiria dessa imagem para encaminhar as duas questões.
RETRATO PERFEITO
Possivelmente a alunos de faixas educacionais mais elevadas, partiria mesmo para uma ação mais factual. Discorreria, por exemplo, sobre a atuação do Clube dos Prefeitos. Acho que seria uma barbada.
O Clube dos Prefeitos, que trataria junto aos alunos como “Consórcio de Prefeitos”, não passou ao longo dos anos, com exceção da gestão de seu criador, Celso Daniel, de um catado institucional. Está incrustrado na região. Trata a região com prioridade temática como um time de catado. Lamentavelmente, não tem a menor ideia de como fazer gol no adversário – no caso, os grandes problemas da região. Vai na raça, quando ir na raça, todos sabem, não é o melhor caminho.
Portanto, o Clube dos Prefeitos é o retrato perfeito de Regionalização contando com todos os sete municípios ou com desfalques, como agora sem São Bernardo e São Caetano. Essa é a trajetória da instituição.
Para honrar o conceito de Regionalidade, o Clube dos Prefeitos teria que obrigatoriamente se estruturar com ciência e competência visando algumas prioridades decorrentes da situação econômica e social em que está engolfada a região.
No fundo, nem mesmo o Clube dos Prefeitos seria necessário para o ABC Paulista alcançar o nível de Regionalidade exigido. Bastaria, extremo dos extremos, que uma organização qualquer, pública, privada ou meio a meio, se dedicasse a estudos e soluções envolvendo diretamente ou não os sete municípios. E que tivesse como parceiros de ações organizações que detivessem controles sobre determinados estoques de conhecimento e dados.
MUITO CUIDADO!
É claro que o ideal mesmo é que tudo tenha como nascedouro a integração para valer dos Municípios, com ressonância no conjunto das organizações locais. Assim, portanto, teríamos de fato Regionalidade como suporte e impulso a grandes transformações.
Portanto, a linha divisória a separar os conceitos de Regionalidade e Regionalização é muito mais expressiva do que acreditam os especuladores semânticos de plantão, dedicados a forçadas de barra que têm um objetivo mais que enganador, porque delitivo.
Ou seja: mentir descaradamente à Sociedade Servil Desorganizada em forma de bajulação que embute, de fato, um artifício deletério: manter a ilusão de que somos um exemplo de Regionalidade usando Regionalização como sinônimo de coletivização estruturada.
Tomem os leitores muito cuidados com os vendilhões da Regionalidade. Eles podem até não saber exatamente o que fazem em forma de aplicação prática da morfologia de desdobramentos sociais, porque ignorantes, mas são inteiramente sorrateiros e sábios na formulação de projetos de suposta responsabilidade social.