Clique aqui para imprimir




Sociedade

DANIEL LIMA - 19/07/2023

Um aperto aqui, outro aperto ali e a movimentação de peças no embate da Família Klein, do fundador da Casas Bahia, ganha novos encaminhamentos. O filho que se sente lesado reagiu contra o filho que supostamente o lesou e o resultado mais imediato é a substituição do advogado do filho acossado. A briga promete mais emoções para quem gosta de drama familiar.  

Se fosse definir os novos significados dessa disputa que por alguns bilhões de reais, talvez a expressão “briga de cachorros grandes” seria a mais apropriada, remetida ao tamanho corporativo dos dois escritórios de advocacia que começarão a medir forças.  

Saul Klein contratou o escritório de Alberto Toron. Agora, Michael Klein se defende com o escritório de Daniel Bialski. 

PESOS PESADOS  

Alberto Toron é um colecionador de clientes famosos, casos de Fernando Bittar, do sítio de Atibaia, Dilma Rousseff, Aécio Neves, João Paulo Cunha (Mensalão), Suzane von Richtohfen (assistente de acusação), Nicolau dos Santos Netto, entre outros. 

Já o Escritório Bialski Advogados Associados tem como expoente Daniel Bialski de fama conturbada. Atuou como advogado do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, da então primeira-dama Michelle Bolsonaro, que solicitou investigação pelos ataques que sofreu nas redes sociais. Também tem no currículo a fama de defender traficantes e policiais corruptos. Já representou o ex-delegado do Denarc (Departamento Estadual de Prevenção e Repressão ao Narcotráfico) Pedro Pórrio, condenado em 2016 a oito anos de prisão por extorquir membros que participaram da quadrilha do traficante colombiano Juan Carlos Ramires Abadia. Mais recentemente, o escritório defendeu o técnico Cuca, contratado pelo Corinthians, e o lateral-direito do Corinthians, Rafael Ramos, envolvidos em casos de violação sexual (Cuca) e racismo (Rafael Ramos).  

FORÇA DA NECESSIDADE   

A retirada do experiente João da Costa Faria, respeitado profissional de São Caetano, não seria obra do acaso. Provavelmente ele continuará a dar assessoria jurídica ao primogênito da Família Klein,  mas ficará em posição secundaria.  

A contratação do escritório de Daniel Bialski, marca que aparece em casos de grande repercussão, não teria nada a ver com eventual surto de estrelismo do contratante. Daniel Bialski está chegando porque supostamente a batata de Michael Klein estaria assando.  

Quem acha que uma denunciada fraude em assinaturas atribuídas a Samuel Klein, morto em dezembro de 2014, não é nada, provavelmente subestima tudo que é importante.  

A denunciada infração criminal teria alterado a ordem do jogo de definições societárias da Casas Bahia e interferido diretamente na partilha familiar.  

É disso que se trata, basicamente, a reação de Saul Klein, que se sente prejudicado com supostas artimanhas do irmão mais velho.  

PARECER PREOCUPANTE  

O inquérito policial que trata do assunto, na Capital, teve parecer inicial preocupante para o primogênito Michael. O material encaminhado pela defesa de Saul Klein, com a garantia de que tudo estaria fundamentado em profundo estudo grafotécnico, agora está sendo analisado pelo Instituto de Criminalística.  

Não é fácil nem producente, quanto menos ético e moral, atribuir a terceiro a falsificação de documentos que embutem milhões e milhões de reais em ações de uma empresa e o inventário do fundador.   

Os especialistas contratados por Saul Klein examinaram atentamente todas as características das assinaturas atribuídas a Samuel Klein. E chegaram à conclusão de que seria algo como alguém que diz conhecer de cor e salteado um determinado caminho, como usuário frequente, mas mover-se como um deficiente visual, obrigado a cuidadosos passos.  

DILÚVIO DE ASSINATURAS  

Foi mais ou menos assim, mas de forma técnica e cientifica, que pode ser interpretado o relato minucioso de dois grafotécnicos contratados pela defesa de Saul Klein sobre o perfil de cada assinatura atribuída ao patriarca dos Klein, um desbravador do varejo brasileiro. 

A substituição de João da Costa Faria possivelmente seja autoexplicativa aos pragmáticos do Direito:  mesmo com toda a experiência acumulada com o histórico de atenção a Michael Klein,  ele não conseguir conter o dilúvio que supostamente fraudadas assinaturas de Samuel Klein provocariam.  

O estrondo da operação teria alterado significativamente tudo na distribuição de ações da Casas Bahia e no inventário de Samuel Klein, e exigiria frondosas relações no Sistema Judiciário.  

SIGILO DE JUSTIÇA  

Além de trocar de representação de defesa, Michael Klein também tomou a decisão, orientado que foi, para requerer sigilo de Justiça tanto num caso quanto no outro.  

Sigilo de Justiça é uma trava na porta à curiosidade de terceiros. No sigilo de justiça nem mesmo as partes têm acesso aos dados processuais. Apenas o Ministério Público, o magistrado e algum servidor autorizado poderão ter acesso enquanto perdurar o sigilo.  

Segredo de Justiça é algo semelhante. Nesse caso,  não foi adotado pela defesa de Michael Klein, o acesso é limitado às partes e os seus advogados.  

Quem conhece os bastidores judiciais sabe que a medida carrega porções de inutilidades práticas. O sigilo de Justiça e o segredo de Justiça são facilmente driblados, quando se pretende driblar. E geralmente tem alguém disposto a isso. 

Um exemplo? Quando a promotora criminal Gabriela Manssur, num inquérito apressado, impreciso e direcionado a incriminar Saul Klein, construiu a narrativa de moças inocentes tomadas de assalto sexual nas residências do namorador de Alphaville, não faltou imprensa a espetacularizar a operação.  

FRENTE AMPLA  

UOL e Folha de S. Paulo, empresas do mesmo ninho corporativo, estouraram o escândalo. Em seguida, o Fantástico entrou em campo. O acesso ao inquérito foi uma farra, embora sob segredo de Justiça.  

A imprensa goza de liberdade suficiente para não revelar fontes. E quem demanda por cobertura da imprensa sabe como chegar até a imprensa. Impedimentos formais sucumbem.  

O então ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello, em sentença liminar que anulou decisão de primeira instância que impôs censura ao site Consultor Jurídico, disse que a imprensa não pode ser proibida de noticiar um processo porque está em segredo de Justiça. “Esse tipo de decisão é censória e viola os princípios constitucionais da liberdade de imprensa e da liberdade de expressão.  

Para o então ministro, a proibição configura “clara transgressão” à ADPF 130, ação do Supremo que estabeleceu que nenhuma lei pode restringir a liberdade de imprensa e nem a livre manifestação de pensamento.  

SUPREMO PARECER  

O caso se referia à decisão da juíza Fernanda de Carvalho Queiroz. Ela havia proibido o Conjur de publicar notícias que encenava o assassinato de Isabela Nardoni.  

Mais importante que filigranas jurídicas que colocam a liberdade de imprensa em risco quando da aplicação do princípio em casos sob segredo de Justiça ou sigilo de Justiça é, nesse caso familiar, a tomada de decisão dos novos defensores de Michael Klein.  

O questionamento é automático: por que tanta preocupação com as informações que passaram a trafegar nas mídias se anteriormente a água fervente que impactava o filho mais novo dos Klein corria livre, leve e solta?  

A QUEM INTERESSA?  

O sigilo de Justiça interessa mais a quem nesse caso de disputas entre os Klein? Até que ponto, também, será possível armazenar exclusivamente nos dispositivos legais, um eventual arsenal de provas e contraprovas que exigiriam publicidade?  

Fosse o caso dos Klein algo restrito à Família Klein, não haveria razão alguma de contestar a fechadura pública com o sigilo de Justiça. Mas a situação é diversa e mais abrangente.  

O próprio advogado substituído agora se pronunciou a respeito quando inquerido pelo jornal Estadão a responder à demanda de Saul Klein.  

João da Costa Faria fez uma defesa voluntarista de Michael Klein. Deixou o campo de luta circunscrito à questão familiar e se meteu mato adentro de desaprovação moral a Saul Klein com referências à vida pessoal e intima do namorador de Alphaville. 

Isso significa dizer que do ambiente familiar a ser inequivocamente protegido a briga entre os irmãos Klein ganhou dimensão social e de interesse público. Ou não é verdade que as supostas violações contra mulheres que teriam sido praticadas por Saul Klein, num inquérito policial que ainda está longe de se encerrar, fizeram a festa da mídia espetaculosa? 



IMPRIMIR