A Economia do Grande ABC sofreu queda livre no Ranking Estadual de PIB per capita neste século. Queda livre poderia ser chamada também de decadência insofismável.
Estamos num desfiladeiro continuo. Diadema, de administração com viés socialista desde 1982, lidera a derrocada. E Mauá, do Polo Petroquímico, é o único endereço que se salva.
Caímos no período de 21 anos nada menos que 232 postos na classificação.
Minha vontade era botar “decadência” na manchetíssima desta análise. Mas o que se chama em redação de “ditadura gráfica” não permitiu, ou limitaria o escopo do enunciado.
SOMANDO DERROTAS
O título que você lê aí em cima é demarcado pelo total de caracteres. São duas linhas de no máximo 24 toques cada. “Decadência consome 10 espaços.
Se pudesse furar o bloqueio gráfico, teria dado o seguinte título: “Grande ABC decadente perde 232 postos no Ranking de PIB per capita no Estado”.
De qualquer forma, mesmo sem “decadência” explícita, o que temos é isso mesmo e muito mais.
Descer a ladeira do Ranking Estadual não é surpresa para quem, como eu, ocupa-se da economia do Grande ABC há pelo menos três décadas e meia.
TURMA DO SONO
A turma da acomodação e da vagabundagem detesta que eu tenha esse currículo. Eles prefeririam as trevas da informação.
Trevas da informação tanto podem ser omissão quanto manipulação. Junte as duas porções e você terá o retrato do refratário Grande ABC em encarar seus fantasmas.
Essa é a primeira vez que decidi investigar o comportamento da economia da região em relação a todos os endereços paulistas. Há muito tempo dedico atenção a um grupo de municípios que integram o G-22. O resultado desse alargamento é uma lástima que remete à sistêmica derrocada.
TODOS OS MUNICÍPIOS
Decidi investigar o comportamento econômico da região em conexão com os demais municípios paulistas (são 645 no total). Deixei de lado apenas Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, menores porções da região e que não passam de 2% do PIB regional.
Deixei Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra de fora porque coletei à unha todos os dados desta análise. Poderia ter incluído os dois municípios, mas os considerei dispensáveis porque não alterariam a ordem do desastre.
Mauá é o endereço fora da curva de perdição do Grande ABC no período que começa em 2000 e termina em 2020. A base de cálculo é 1999, o último ano do século passado. Os dados de 2021 e de 2022 ainda não foram anunciados pelo IBGE. O mesmo IBGE que anunciou o PIB dos Municípios Brasileiros de 2020 em dezembro do ano passado. O Grande ABC perdeu 5,92% do PIB Geral. Desde 2015, marco de abertura da crise deflagrada pelo governo Dilma Rousseff, o Grande ABC perdeu 22% do PIB Geral.
MAUÁ ISOLADA
O Ranking Estadual de PIB per capita é uma criação deste jornalista. Não há nada nesse sentido nos organismos oficiais. Os dados brutos são do IBGE. PIB per capita é o total de riquezas geradas dividido pelo total de habitantes. PIB Geral não leva em conta essa divisão. PIB Geral é o PIB em estado completo, quantificado sem relativização de qualquer espécie.
Mauá ganhou nove pontos na classificação geral do PIB per capita no Estado de São Paulo nos 21 anos deste século. Ocupava a posição 233 em 1999 e subiu para a 224 em 2020. A produção de riqueza do Polo Petroquímico faz toda a diferença.
No outro polo de destaque (agora negativo) do Grande ABC está Diadema, atingida em cheio no setor industrial a reboque da indústria automotiva da vizinha São Bernardo. Diadema ocupava a posição 80 no ano de 1999 e caiu para a posição 224 em 2020. Nada menos que 156 degraus abaixo entre os 645 municípios. Uma catástrofe.
Os outros três municípios da região escrutinados também sofreram duras baixas. Especialmente Santo André e São Bernardo. A queda de Santo André foi de 34 degraus ante 39 de São Bernardo. São Caetano perdeu 12 posições. Entre uma soma e várias perdas, chega-se a 232 degraus abaixo.
Santo André era a 134ª colocada em 1999. A decadência municipal e regional, combinada com o crescimento relativo dos concorrentes, rebaixou Santo André para a o 168º lugar em 2020. São Bernardo caiu relativamente um pouco mais. Exatamente 39 postos no ranking: era 34ª colocada em 1999 e passou para a 73ª posição em 2020. São Caetano contava com a 15ª posição em 1999 e caiu para a 27ª posição no mesmo período.
Os resultados dos cinco municípios do Grande ABC são mesmo tenebrosos. Sempre com exceção de Mauá. Tanto que o Município que divide com Santo André as vantagens do Polo Petroquímico obteve o maior crescimento do PIB per capita nos 21 anos. Avançou em média 1,34% a cada temporada.
SOBE E DESCE
Em 1999, o PIB per capita de Mauá registrava R$ 7.368,18 mil. Aplicando-se a inflação do período de 21 anos, com o uso do IPCA, Mauá deveria registrar PIB per capita de R$ 25.791,58 em dezembro de 2020. Conseguiu mais que isso: R$ 35.864,96b mil. Crescimento de 28,09% no período, em termos reais, ou 1,34% ao ano.
A queda de Diadema é impressionante. Tanto que em 1999 o PIB per capita em valores nominais (sem considerar a inflação) era bastante superior ao de Mauá: R$ 11.114,45. Atualizada pela inflação do período, em 2020 Diadema deveria contar com PIB per capita de R$ 38.905,02. Entretanto, chegou a apenas R$ 35.282,92 mil. Uma queda de 9,31%, com baixa de quase 0,5% em média por ano.
PERCENTUAL BAIXO
O crescimento do PIB per capita de Santo André nos 21 anos não passou de 1% ao ano, pois atingiu 21,08% no período. O PIB per capita de Santo André em 1999 registrava R$ 9.201,16 mil, que em valores atualizados de dezembro de 2020 significariam R$ 32.207,74 mil. No campo da realidade, o PIB per capita de Santo André em 2020 chegou a R$ 40.812,01 mil.
São Bernardo cresceu pouco mais que a metade de Santo André no período. O PIB per capita da Capital Econômica do Grande ABC em 1999 registrava em valores nominais R$ 14.088,99 mil – ou R$ 49.317,10 em valores inflacionados até 2020. Como chegou a R$ 57.566,99 mil, o crescimento real de 14,33% no período significa média anual de avanço de apenas 0,68%.
Completando o quadro regional pesquisado, São Caetano registrou crescimento anual médio de apenas 0,50% no período de 2000 a 2020. Em 1999, o PIB per capita nominal de São Caetano correspondia a R$ 22.016,46 mil que, em valores atualizados a dezembro de 2020, significariam R$ 77.066,42 mil. Na prática, chegou a R$ 86.200,01 mil.
CONCORRENCIA MELHOR
Para se ter ideia mais precisa e de razoabilidade interpretativa mais condizente com o quadro, pegamos três exemplos municipais extra-região para demonstrar o quanto o Grande ABC bate cabeça econômica. Sorocaba, Barueri e Jundiaí, que integram o G-22 de CapitalSocial (o grupo dos maiores municípios paulistas) avançaram muito mais no período: Sorocaba cresceu 42,92%, ou média anual de 2,04%. Barueri avançou 47,415 em 21 anos, média anual de 2,26%. E Jundiaí cresceu 58,36% no período, média anual de 2,78%.
Uma comparação entre dois municípios também pode auxiliar na interpretação dos números. Santo André e Sorocaba tinham praticamente o mesmo PIB per capita em 1999: R$ 9.201.16 mil e R$ 8.712,91 respectivamente. Já em 2020, Santo André contava com R$ 40.8121,01 ante R$ 53.427,50 mil de Sorocaba. Ou seja: o que era vantagem de 5,30% de Santo André no início da corrida, passou a ser vantagem de Sorocaba de 23,61%.
COMENDO POEIRA
Um outro exemplo tem reflexos sociais e econômicos ainda amais impactantes. Em 1999, São Bernardo e Jundiaí contavam com praticamente o mesmo PIB per capita: R$ 14.088,99 mil ante R$ 14.408,47 da cidade do Interior. Vinte e um anos depois São Bernardo registra R$ 57.566,99 mil enquanto Jundiaí chegou a R$ 121.121,33 mil. Ou seja: o que era vantagem mínima de Jundiaí em 1999, de 3,2%, passou a ser de 52,47%. Uma goleada implacável.
O Estado de São Paulo como um todo cresceu em termos reais à média de 1,87% ao ano no período. O PIB per capita paulista em 1999 registrava em valores nominais R$ 9.250,35 mil e passou para R$ 53.263,00 em 2020. Avanço real, descontada a inflação, de 39,21%. Quase 50% acima de Santo André, quase o triplo de São Bernardo e quase quatro vezes mais que a média anual de São Caetano. E acima do 1,34% de média anual de crescimento de Mauá, único ponto positivo da região.