O estudioso e respeitado professor e ex-secretário de Desenvolvimento Econômico de São Bernardo, Jefferson José da Conceição, finalmente se dobrou à realidade dos fatos que desfilo em meus escritos desde antes de criar a revista impressa LivreMercado, antecessora desta CapitalSocial.
Em artigo escrito hoje para o Diário do Grande ABC (seu errático parceiro do negacionismo), finalmente não só admite como enfatiza que o Grande ABC passou mesmo (e continua passando) por insidioso processo de desindustrialização.
Sinto-me feliz com a iniciativa do professor, com o qual mantenho relacionamento respeitoso, embora crítico. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Quando uma coisa e outra coisa são a mesma coisa quando não devem ser a mesma coisa, a coisa está mal-ajambrada.
BEM-VINDO AO CLUBE
Estava faltando mais alguém de peso, que entende do riscado da regionalidade do Grande ABC, para engrossar o time da histórica queda da indústria regional.
Tinha outro tema a escrever nesta edição, pensava em discorrer sobre a Cidade Capuava, a Cidade Pirelli e o Eixo Tamanduatehy, mas decidi adiar tudo isso porque a entrega da rapadura de Jefferson José da Conceição é a consagração final e irremovível de uma realidade que precisa ser destacada sempre.
E a verdade é que não somos mais a potência econômica que fomos e a razão principal disso se chama “desindustrialização”, palavra amaldiçoada pelos comodistas, pelos triunfalistas e pelos preguiçosos de plantão há muito tempo em instâncias diversas, de administrações municipais à mídia, de entidades de classe a entidade sociais. Enfim, de gente que opta sempre por ficar na janela e assistir a banda do empobrecimento passar.
PECADO CAPITAL
Não vejo nenhum pecado capital de Jefferson José da Conceição ao admitir, finalmente, que estava enganado havia muito tempo, embora procure negar esse contexto no artigo de hoje.
Embora titubeante quanto à longevidade de premissas equivocadas, Jefferson pratica o que chamaria de sinal claro de honestidade intelectual. Ao recuar e admitir que o jogo jogado nos últimos 40 anos no Grande ABC não é um jogo amistoso, de troca de passes, Jefferson da Conceição dá um passo importante adiante.
Mas vamos além da desindustrialização, é bom que se explique. Estamos apanhando de nossos adversários sem nos dar conta de que o vexame se intensificou a cada ano porque caminhamos economicamente sem eira nem beira.
Como prova de minha preocupação com o futuro da região, uma preocupação que vem desde o primeiro exemplar da revista de papel LivreMercado, em março de 1990, não tem este texto o sentido retaliador que alguns poderiam maliciosamente sugerir. Que Jefferson José da Conceição seja bem-vindo ao Clube dos Sensatos.
OUTRA PERSPECTIVA
Antes de reproduzir os primeiros trechos do artigo que Jefferson José da Conceição escreveu hoje no Diário do Grande ABC, coloco mais uma vez um tijolinho na construção da análise crítica da economia regional.
A desindustrialização é um caso tão superado, porque inegável, que a ordem do dia da institucionalidade regional deveria há muito tempo ter-se convergido a uma alternativa no setor de serviços de valor agregado para atenuar os estragos sociais cada vez mais visíveis.
Ainda não encontramos o fio da meada de recompensa parcial, mesmo que parcial, às perdas arrecadatórias e sociais da desindustrialização.
CARGA TRIBUTÁRIA
Pior que isso: os cofres públicos municipais se deslocaram principalmente ao aumento da arrecadação própria, sobremodo do IPTU, para mitigar os estragos.
Nos últimos 30 anos a carga tributária municipal cresceu exponencialmente e não houve reação alguma da sociedade, exceto em casos isolados.
A alternativa econômica à desindustrialização é muito mais importante à pauta regional do que necessariamente a reindustrialização no sentido convencional do conceito.
Portanto, a cruzada é muito mais complexa do que se imagina. E não será o setor de logística de última milha, caso de Santo André, por exemplo, que vai amenizar o quadro. Condomínios de logística geram pouco valor agregado e os salários são os menores da praça. Confundir logística de última milha com Desenvolvimento Econômico é confissão tácita de ignorância.
PROVA DA REDENÇÃO
Mas, vamos aos primeiros trechos da bem-vinda chegada de Jefferson José da Conceição ao Clube dos Sensatos, no Diário do Grande ABC de hoje, sob o título “É possível reindustrializar o Grande ABC?”:
Em diversos textos na Carta de Conjuntura da USCS, temos buscado refletir sobre a desindustrialização do Grande ABC, que é uma realidade desde os anos de 1990, com o breve oásis do período entre 2005 e 2013. É processo estrutural, preocupante e tem efeitos acentuados sobre a região. Em 1989, havia 363 mil empregados na indústria da região; em 2020, 170 mil. A região vivenciou uma queda de 21% no valor adicionado da indústria na última década. O PIB do Grande ABC, que é a somatória de riquezas produzidas regionalmente, era de R$ 164,5 bilhões em 2011, contra R$ 130,0 bilhões em 2019. A participação do PIB da região no PIB do Estado de São Paulo caiu de 7,3% em 2011 para 5,5% em 2019 – escreveu Jefferson.
NADA PRIORITÁRIO
Antes de repassar um texto que produzi em maio de 2019, que aborda a questão e o posicionamento do professor Jefferson José da Conceição, não custa um reparo ao texto de hoje no Diário do Grande ABC: o Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano (a mais ativa, interessante, prospectiva e também contraditória plataforma de valores acadêmicos no Grande ABC), jamais tratou a desindustrialização regional como tema prioritário. Mais que isso: sempre se esforçou para negar o processo. Jefferson José da Conceição é o coordenador daquela instância da USCS.
Agora, para esclarecimentos finais relativos ao artigo de hoje de Jefferson José da Conceição na página de Economia do Diário do Grande ABC, extraímos alguns trechos da análise que fiz para a edição de maio de 2019:
Inacreditável Futebol Clube
na economia do Grande ABC
DANIEL LIMA - 06/05/2019
“Inacreditável Futebol Clube” é expressão sempre utilizada quando um jogador perde um gol praticamente impossível. Decidi transplantar para o ambiente econômico regional essa marca de incompetência ou de negligência, quando não de despreparo ou pouca sorte, depois de ler um estudo da Universidade Municipal de São Caetano (USCS) que, acredite quem quiser, não só sugere que se coloque em xeque a desindustrialização na região como, pasmem, não atribui um tiquinho sequer de responsabilidade no processo ao sindicalismo egresso do movimento do fim dos anos 1970, com Lula da Silva à frente? O que os leitores vão ver na sequência é a exposição de um contraditório em defesa da responsabilidade social. Transponho a estas páginas os principais pontos da chamada Nota Técnica de professores da Universidade Municipal de São Caetano (USCS), e os respectivos contrapontos. Sob o título “A Mudança no perfil do emprego formal do Grande ABC Paulista nos últimos trinta anos, 1989-2017: como os números devem ser lidos”, poderia, se acadêmico igualmente o fosse apresentar um título semelhante, em oposição àquele enunciado. Mais ou menos assim: “A mudança no perfil do emprego formal do Grande ABC Paulista nos últimos trinta anos, 1989-2017: como negar a inegável desindustrialização e a enorme cota de responsabilidade do sindicalismo”.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
O estudo da Universidade Municipal de São Caetano é assinado por Jefferson José da Conceição, Gisele Yamauchi e Gustavo Kaique de Araújo Monea, do grupo de pesquisa do Conjuscs, Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da USCS. Jefferson da Conceição é coordenador do Conjuscs, graduado em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), mestre em Administração pelo Imes, doutor em sociologia pela USP e, entre vários cargos, foi diretor da Agência São Paulo de Desenvolvimento, além de técnico do Diese, organismo ligado aos trabalhadores. Gisele Yamauchi é economista formada pela USCS, turismóloga pela Universidade São Judas Tadeu, MBA Empresarial e Industrial pela USCS e, também, bolsista do Governo Japonês em programa de extensão da Japan International Cooperation. Gustavo Kaique de Araújo Monea conta com graduação em Ciências Econômicas pela USCS e é mestrando em Modelagem de Sistemas Complexos pela Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP. É diante desses três acadêmicos que apresento contraditório em defesa da realidade dos fatos históricos da economia do Grande ABC, especialidade que o jornalismo me obrigou a exercer diariamente.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Técnica (1) -- Tomando como base os indicadores coletados na RAIS, do então Ministério do Trabalho e Emprego, esta nota apresenta a evolução do emprego formal na região do Grande ABC Paulista (sete municípios) entre 1989 e 2017. Entre outros resultados, destaca-se a queda do número de empregos industriais, que passou de 363.333 em 1989 para 182.168 empregos em 2017, e a correspondente queda de participação percentual da indústria no total dos empregos formais na região. A indústria teve sua participação nos empregos formais reduzida de 61,71% em 1989 para 24,99% em 2017. Por outro lado, no mesmo período, o segmento de serviços viu expandir o número de empregos formais, de 120.613 em 1989 para 319.657 em 2017. Assim, a participação dos serviços mais do que dobrou, passando de 20,49% para 43,85%. Foi expressivo também o crescimento dos empregos no comércio, que aumentou de 62.913 em 1989 para 143.281 em 2017. De tal modo que a participação do comércio no total de empregos formais da região subiu de 10,69% para 19,66%. Sem negar o processo de desindustrialização pelo qual passa a região neste momento, a nota procura chamar a atenção para alguns elementos nem sempre são percebidos na análise e no debate sobre estes indicadores, como são os casos do aumento do valor adicionado por empregado na indústria, o efeito estatístico decorrente da passagem de atividades industriais para o setor de serviços e a “pejotização” das relações de trabalho.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (1) – A tentativa deliberada ou descuidada de induzir o leitor a erro de interpretação sobre a realidade industrial histórica do Grande ABC está contida numa frase da Nota Técnica de forma sútil. Releiam: “Sem negar o processo de desindustrialização pelo qual passa a região neste momento”. Ora, bolas: “pelo qual passa a região neste momento”, em se tratando de desindustrialização, é o começo do fim da picada da análise a que se propuseram os representantes da Universidade Municipal de São Caetano. É o começo, evidente, da negação do inegável. A desindustrialização do Grande ABC vem de longe e está distante, portanto, do circunstancial. É solidamente estrutural. Exceção à regra nesse período, cristalizadamente escancarado na tabela utilizada nos estudos, foi o período pós-Fernando Henrique Cardoso, e antes de Dilma Rousseff, com Lula da Silva no governo federal. Esse foi o ponto fora da curva de perdas continuadas, com alguma recuperação parcial aqui e ali no tempo. Nada que, logo adiante, não fosse completamente neutralizado e retomasse o curso anterior. O PIB Industrial do Grande ABC em 2016, última atualização do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) acusou perda real no período. Ficamos, portanto, abaixo do que parecia impossível: dos dados de 2002, quando Fernando Henrique Cardoso era presidente da República e, durante oito anos, rebaixou em 33% o valor adicional real da indústria da região. Caímos em termos absolutos e relativos, porque outros municípios avançaram consistentemente no mesmo período.
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Nota Técnica (2) -- A tabela 1 mostra diferentes movimentos na evolução da somatória do emprego total dos oito setores de atividade no Grande ABC entre 1989 e 2017. Entre 1989 e 1998, verificou-se tendência à redução do emprego total na região, que passou de 588.728 para 470.718, mas com oscilações ao longo do período, com destaque para o patamar mínimo alcançado de 421.894 em 1993. Entre 1998 até 2011, cresceu, ano após ano, o total de empregos na região: de 470.718 para 809.970, respectivamente. Entre 2011 e 2017, o total de empregos formais reduziu-se na região (à exceção do ano de 2013). No período, o emprego caiu de 809.970 para 728.957.
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Nota Explicativa (2) -- O fenômeno de avanço do emprego em outras atividades econômicas, sobretudo nas áreas de serviços e de comércio, é internacional. Portanto, não está limitado à geoeconomia do Grande ABC como se algo de extraordinário ocorresse a compensar a fragilidade industrial. No Grande ABC, a troca de postos foi mais acentuada exatamente porque a desindustrialização gerou exércitos de deserdados que buscaram não só postos de trabalho, mas também passaram a atuar como empreendedores, inclusive como terceirizados de pequenas, médias e grandes empresas industriais. Ocorreu um salve-se-quem-puder que jamais compensou o acumulado de perdas do valor adicionado, expresso no PIB Industrial.
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Nota Técnica (3) -- Não há dúvida de que os movimentos da indústria, juntamente com os dos serviços e do comércio, influenciam diretamente a evolução do total de empregos formais na região. Entre 1989 e 1993, o emprego na indústria da região caiu expressivamente: de 363.333 para 232.461. Em grande medida, isto se deveu aos planos de estabilização monetária (Plano Collor 1 e 2) e às reformas liberais implementadas no período. Estas reformas -- entre elas a abertura econômica e a redução dos investimentos públicos – impactaram acentuadamente a dinâmica de funcionamento da estrutura produtiva nacional e regional.
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Nota Explicativa (2) -- Um novo tropeço dos autores da Nota Técnica flagrantemente combativa à globalização. Eles ignoram o fenômeno sindical associado à guerra fiscal que já se impunha no País. Havia uma cultura, inclusive acadêmica, para não dizer fortemente acadêmica, a defender a exaustão da Região Metropolitana de São Paulo. Dizia-se com certa dose de razão, mas não com toda a razão, que a chamada “deseconomia de escala” praticamente tornava compulsória a descentralização industrial. Aliás, a expressão “descentralização industrial” era acentuadamente proferida pela classe acadêmica. Evitava-se o uso de “desindustrialização”. Aliás, permanece essa ojeriza. Nas entrelinhas, vendia-se a ilusão de que a indústria já não era mais importante para sustentar o equilíbrio econômico metropolitano.
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Nota Técnica (4) -- Após uma elevação no ano de 1994, o emprego na indústria do Grande ABC voltou a cair seguidamente entre 1995 e 1999: de 255.840 para 187.759, respectivamente. Houve um novo aumento do emprego industrial nos anos de 2000 e 2001, com nova queda em 2002. A explicação desta oscilação, tendencialmente para baixo, reside, de um lado, nas políticas macroeconômicas implementadas no período, que, centradas no combate à inflação e fiéis aos credos monetaristas -- como a crença na existência de uma Curva de Phillips, segundo a qual haveria um suposto ‘trade off” entre taxa de inflação e taxa de desemprego -- combinaram taxas de juros elevadas, câmbio valorizado, retração dos gastos públicos, abertura comercial acelerada e não seletiva da economia brasileira. De outro, no regime automotivo, que reduziu as tarifas de importação de autopeças e componentes e promoveu a guerra fiscal entre Estados e Municípios.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (4) -- Notem os leitores que o sindicalismo segue fora do jogo da desindustrialização regional. Quem se dedicar à economia do Grande ABC com base na Nota Técnica do Conjuscs será levado, portanto, a uma trapalhada interpretativa fenomenal. Também o olhar dos pesquisadores da Universidade Municipal de São Caetano fixou-se em políticas econômicas e macroeconômicas que passam a léguas de distância do relativo, mas sempre possível poder de ação da Administração Pública no Grande ABC. Segue o estudo, também, olhando para o próprio umbigo regional. Despreza outros territórios, paulistas e brasileiros, que, ao passarem pelos mesmos processos macroeconômicas e microeconômicos brasileiros, reagiram de forma diferente, menos ostensivamente deletérias ou mesmo refratárias ao açodamento. O regime automotivo citado na Nota Técnica é um ponto nevrálgico sobretudo na estrutura econômica do Grande ABC. As pequenas e médias empresas industriais, sobremodo familiares, foram dizimadas no período de Fernando Henrique Cardoso, em complemento ao período pós- surgimento do chamado Novo Sindicalismo. As medidas fernandohenriquistas em favor das montadoras de veículos desequilibraram de vez um jogo então praticamente perdido pelos pequenos industriais, vítimas preferenciais da socialização de pautas trabalhistas de um sindicalismo avesso ao capital. Até o então já presidente Lula da Silva reconheceu ter havido excesso sindical na região, sobremodo em detrimento dos pequenos empresários. Tratou-se de carnificina engendrada por sindicalistas, grandes corporações empresariais e um governo federal negligentemente preso ao lobby das montadoras e dos sindicatos mais poderosos.
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Nota Técnica (5) -- Entre 2003 e 2011, o total de empregos na Indústria do Grande ABC – contrariando as teses da “fuga” de empregos da região, evasão e desindustrialização – voltou a subir expressivamente: de 194.466 para 264.827. Este período é marcado pelo forte crescimento econômico do país (expansão dos salários, do crédito, do consumo e das exportações) e pela retomada das políticas industriais ativas (Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior – PITCE, de 2003 a 2007; Política de Desenvolvimento Produtivo – PDP, de 2008 a 2010; Plano Brasil Maior, de 2011 a 2014).
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (5) – O que os acadêmicos chamam de desenvolvimento econômico no período lulista não passou (e os efeitos estão aí) de uma febre contínua de consumo, tendo como base, como cansam de repetir economistas mais sérios do País, a altíssima demanda por commodities, sobretudo do mercado asiático, principalmente a China. A explosão de consumo no País não teve a correspondente ação incremental de investimentos. Criaram-se aparatos protecionistas tanto para setores empresariais quanto para deserdados sociais. A explosão do déficit fiscal que levou o Brasil à maior recessão da história resume a bobagem de acreditar que as commodities sustentariam benesses para sempre. O PIB Industrial do Grande ABC, movido a indústria automotiva, cresceu extraordinariamente. Um fôlego que teve vida curta. Nossos problemas de produção estão em patamar muito mais elevado do que uma reoxigenação consumista. O salto do emprego industrial no período, embora expressivo, ficou também muito aquém de outros municípios e da média nacional. Ou seja: mesmo quando as vacas gordas resolvem dar as caras por alguns pares de ano, a reação da indústria de transformação do Grande ABC é de intensidade muito inferior à concorrência.
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Nota Técnica (6) -- De 2012 a 2017, o emprego na Indústria do Grande ABC voltou a cair consideravelmente: de 264.827 para 182.168, de maneira respectiva. Registre-se que o emprego industrial começou a cair antes mesmo da crise econômica se acentuar no país, o que ocorreu a partir de 2015. Entre 2012 e 2017, verificou-se uma combinação bastante perversa para a região: desaceleração da economia internacional; queda no comércio com o Mercosul, gerada pela crise econômica dos países do bloco; retração no consumo e investimentos; política monetária restritiva.
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Nota Explicativa (6) -- É claro que o estudo segue a omitir a atuação sindical. As montadoras e as sistemistas da região foram beneficiadas ao longo dos anos petistas e cutistas no governo federal. Até que fissuras fiscais começaram a aparecer. Os benefícios aos trabalhadores metalúrgicos de primeira classe da região desequilibram os fatores de competitividade interna. As pequenas e médias empresas do setor, sem acesso à maioria das benemerências, seguem enfraquecidas nas relações comerciais. O Grande ABC criou um mundo de desigualdade empresarial como resultado do mundo de desigualdade trabalhista ditado pelo sindicalismo coalhado de militantes políticos. As diferenças salariais no setor industrial são aviltantes, bem como o tratamento às grandes e médias empresas em relação às demais.
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Nota Técnica (7) -- Nota-se que, como resultado das oscilações do emprego na indústria e da expansão contínua de empregos nos setores de serviços e comércio, a participação da indústria no total de empregos formais do Grande ABC caiu quase seguidamente entre 1989 e 2017: de 61,71% em 1989 o peso da indústria caiu para 24,99% em 2017.
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Nota Explicativa (7) -- De novo se configura espécie de pegadinha que pretende negar o inegável. Quando se afirma “como resultado das oscilações do emprego na indústria”, o que os autores do trabalho sugerem é a ausência de uma característica latente: a de que o emprego industrial do Grande ABC é um despencar sucessivo com breves períodos de aclives por conta de especificidades do mercado nacional e internacional. E, mesmo assim, quando os números são comparados com outras regiões industrializadas, mostram-se invariavelmente muito abaixo dos avanços circunstanciais. Aliás, avanços circunstanciais majoritariamente no caso do Grande ABC. Em outras geografias, como os principais endereços do G-22, grupo dos municípios mais industrializados do Estado de São Paulo, a regra são mais vínculos de empregos formais industriais, enquanto no Grande ABC a regra é outra, ou seja, a perda de empregos formais industriais. Uma equação inversa, portanto.
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Nota Técnica (8) -- É preciso chamar a atenção para alguns pontos menos perceptíveis em relação à queda no número de empregos industriais. Em primeiro lugar, o fato de que uma eventual desindustrialização não pode ter como métrica apenas o número de empregos formais na indústria. Isto porque o número de empregos pode decrescer, mas o valor adicionado aumentar. Isto acontece em função do aumento da produtividade, decorrente da introdução de novos equipamentos e novos métodos de trabalho. Isto ocorreu, por exemplo, entre 2002 e 2008, no Grande ABC, conforme exposto em nota técnica na 2ª Carta de Conjuntura da USCS, de maio de 2018.
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Nota explicativa (8) -- É elementar que uma coisa (queda de empregos industriais) não necessariamente tem a ver com a outra (desindustrialização). Rebaixamento de emprego industrial e desindustrialização, no caso do Grande ABC, entretanto, mantêm parceria sólida há muito tempo. Variáveis em contrário entre um ano e outro, ou mesmo em períodos menos breves, se devem ao efeito-defasagem. Há sempre um intervalo de tempo entre o refluxo da produção industrial e a quebra do estoque de trabalhadores. Sobremodo em São Bernardo, onde a influência dos metalúrgicos retarda ainda mais a velocidade de mudanças. Caso específico, entre tantos, do Programa de Proteção ao Emprego, moldado para as grandes empresas. O período citado pela Nota Técnica em referência aos dados do Grande ABC foi equivocadamente pinçado como prova em contrário da teoria exposta pelos pesquisadores do Conjuscs. A tabela que consta do estudo prova que a excepcionalidade dos anos Lula da Silva, de crescimento do PIB Industrial, teve o correspondente avanço do estoque de emprego industrial, não o contrário. Ou seja: não houve o propalado impulso de produtividade do trabalho no Grande ABC nas proporções sugeridas. Com protecionismo empresarial e trabalhista seletivo, seria mesmo impossível.
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Nota Técnica (9) -- Tomando-se os valores deflacionados, pode-se fazer uma análise comparativa dos valores adicionados pela indústria total da região e por município a cada ano. Nota-se (...) que o valor adicionado pela Indústria do Grande ABC Paulista apresentou três comportamentos distintos no período, caracterizando um processo de movimento cíclico da seguinte forma: a) tendência ao crescimento entre 2002 e 2008 (à exceção de 2006): o valor adicionado na indústria passou de R$ 28,6 bilhões para R$ 42,0 bilhões, aproximadamente); b) oscilações entre 2009 e 2010: o valor adicionado cai de R$ 42,0 bilhões em 2008 para R$ 38,4 bilhões em 2009; voltando a subir para R$ 40,5 bilhões em 2010; c) quedas sucessivas a partir de 2010 até o ano de 2015: o valor adicionado passou de R$ 40,6 bilhões para R$ 26,0 bilhões em 2015 (aproximadamente, queda de 35,9%).
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (9) -- O documento não só confirma o falso descasamento entre produtividade e estoque de trabalhadores como também comparações de períodos anteriores pela simples razão de que foram uma contínua expressão da derrocada da indústria regional. O intervalo lulista, já explicado, é uma exceção sobre a qual se pretende construir uma teoria em defesa de uma desindustrialização circunstancial ou mesmo cíclica. Pura bobagem.
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Nota Técnica (10) -- O item “c” da citação anterior – que menciona as quedas sucessivas a partir de 2010 até o ano de 2015 -- período no qual o valor adicionado passou de R$ 40,6 bilhões para R$ 26,0 bilhões em 2015 -- este sim, é bastante preocupante, tendo em vista a acentuada queda do valor adicionado na indústria da região. Esta queda do valor adicionado (cuja tendência deve ter se mantido até o ano de 2018), acrescida do anúncio da decisão do fechamento da fábrica da Ford em São Bernardo do Campo, caracteriza um processo de desindustrialização em curso, cuja interrupção depende da construção e execução de políticas públicas (das três esferas, União, Estado e Município) e privadas articuladas. Infelizmente, isto está longe de ser o cenário mais provável no momento em que escrevemos esta nota.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (10) -- Novamente se coloca atenuante à desindustrialização sistêmica do Grande ABC. “cuja interrupção depende da construção e execução de políticas públicas”, conforme a Nota Técnica. Há insistência em tratar como situacional o que é longevo, praticamente irrecuperável. Sim, praticamente irrecuperável, porque a desindustrialização do Grande ABC é muito mais grave que a média da indústria de transformação do País. Exatamente porque, entre outros fatores, o sindicalismo anticapitalista espancou investimentos e criou casta de privilegiados do setor automotivo que parametriza, ainda, as chamadas conquistas sociais. Nos anos 1980 o Brasil participava com 4,4% do PIB Industrial do mundo. Mais recentemente, não passava de 2,2%. Uma queda mais que preocupante. Pois o PIB Industrial do Grande ABC está em situação muito pior em âmbito nacional. Os números deste século, não bastassem das duas décadas finais do século passado, são denunciatórios.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Técnica (11) -- Outro ponto a observar referente aos números da indústria é o efeito estatístico – de difícil mensuração – que é a associação entre o processo de desverticalização da grande indústria (que ocorre desde a década de 1990), a expansão da terceirização de etapas do processo industrial para fornecedores diversos, o crescimento de prestadores de serviços cujo faturamento depende em boa parte da atividade industrial e como esta sequência de fenômenos se traduz em termos de queda do emprego industrial e crescimento do segmento de serviços. Em outras palavras, parte do crescimento dos empregos no setor de serviços, computados agora no setor de “serviços”, deve-se à passagem de atividades da indústria para o setor. Entretanto, é clara a dependência destes empregos em serviços da atividade industrial.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (11) -- Esse fenômeno não é exclusividade do Grande ABC. É uma realidade nacional e internacional. Ora, se a situação é semelhante em todos os municípios, as diferenças mensuráveis de participação do emprego industrial formal no conjunto de trabalhadores passam a ser objeto de avaliação mais abrangente e mais conclusiva. O Grande ABC acumula um mundaréu de empregos de serviços e de comércio em proporção inversa à queda do valor adicionado industrial, diferentemente, portanto, de grande parte dos municípios brasileiros que mais ganharam postos no PIB da Indústria de Transformação, os quais associaram as duas pontas do novelo de desenvolvimento econômico. Nada mais lógico para o fenômeno da desindustrialização continuada e inexorável do Grande ABC. Uma obviedade que a Nota Técnica pretende minimizar, quando não negligenciar.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Técnica (12) -- Uma terceira ressalva diz respeito ao processo de “pejotização” das relações de trabalho verificado também nas últimas décadas. Na busca de reduzir os custos e de torná-los o máximo possível “custos variáveis”, que oscilam conforme a evolução do próprio faturamento, e de reduzir outros elementos como os encargos sociais sobre a folha de pagamento, muitas empresas industriais passaram a demitir funcionários e recontratá-los como pessoas jurídicas (“PJs”). Esta mudança nas relações de contratação, que muitas vezes é ilegal (tendo em vista que as características de emprego, a saber, habitualidade, pessoalidade, onerosidade e comando encontram-se presentes em muitos dos casos), acaba por se refletir também nas estatísticas de emprego, reduzindo o peso da indústria no total dos empregos.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (12) -- Mais uma vez os estudiosos lançam mão de uma ocorrência generalizada nas relações trabalhistas, tornando-a específica da geografia do Grande ABC. A pejotização é geral e irrestrita no País. Alguns descolamentos estatísticos, que acentuem o incremento da medida em determinados endereços municipais ou regionais, decorrem de realidades próprias. E nesse ponto, também, entra o sindicalismo sempre arredio ao capital. Como o é o sindicalismo de São Bernardo e Diadema, principalmente, notadamente na área metalúrgica. Nada disso, claro, consta do estudo.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Técnica (13) -- Por fim, cumpre notar que, mesmo que a revitalização industrial da região volte a acontecer, ancorada na modernização do seu parque produtivo, especialmente alinhada com a chamada “Indústria 4.0”, o número de empregos formais dificilmente voltará aos patamares já observados na região em décadas anteriores. Ao contrário: a revitalização industrial poderá ocorrer com a manutenção ou queda no número de empregos formais. É sabido o impacto que a Indústria 4.0 representará em termos de automação e eliminação de postos de trabalho, especialmente aqueles que se situam nas áreas operacionais e repetitivas das empresas.
MAIS DESINDUSTRIALIZAÇÃO
Nota Explicativa (13) -- A abordagem é perfeita, nesse ponto. Mas a Indústria Digital, como chamaria a “Indústria 4.0”, ainda é incipiente no Grande ABC e no País como um todo. Estamos perdendo de goleada frente a nações mais abertas ao capital. E não se deve colocar as fichas de investimentos numa reviravolta industrial regional porque perdemos feio para outros territórios quando a planilha de mais de 200 quesitos que medem a competitividade dos municípios brasileiros é levada em consideração por grandes e médias indústrias. Somos em regra carta fora do baralho desses aportes. Temos, portanto, de, sobretudo, cuidar do que temos. Uma Scania, que se mantém economicamente forte porque tem o marcado externo como contrabalanço às oscilações do mercado nacional, é exceção à regra geral que vai muito além dos casos da Ford e da General Motors. As pequenas e médias empresas industriais anônimas debandam ou morrem sem flores e louvores. O ambiente produtivo da região é um convite à deserção, entre outros motivos porque a iniciativa privada é vista como usurpadora dos trabalhadores. Os comitês de fábricas espalhados por mais de uma centena de empresas, principalmente em São Bernardo, mostram o quanto o sindicalismo é agressivo. Não necessariamente por conta dos comitês de fábricas, inovadores em outros países, mas pelo viés ideológico que os concebeu.