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Economia

DANIEL LIMA - 25/04/2022

Esta não é a primeira vez que faço cotejamento entre Santo André e Sorocaba no campo econômico e as repercussões sociais como exemplo simbólico de transformações econômicas. É preciso atualizar os dados e, na medida da necessidade, incorporar novos condimentos explicativos.  

Sorocaba e Santo André eram cidades muito semelhantes no passado, mas são menos no presente. Passaram-se 20 anos neste século e as alterações vão se acentuando. Santo André vem perdendo o jogo seguidamente. Sofreu uma virada no placar econômico. As consequências sociais emergem mais lentamente.  

São vários os vetores que aproximam e distanciam os dois municípios como símbolos do redirecionamento de investimentos industriais rumo ao Interior do Estado. 

É claro que subliminarmente as lições que serão expostas nesta breve série ultrapassam os dois municípios. São, portanto, nuances de transformações de investimentos no Estado de São Paulo. 

PALAVRA MALDITA  

Desindustrialização é uma palavra-conceito maldita entre mandachuvas e mandachuvinhas no Grande ABC. Desde 1990 nas páginas de LivreMercado/CapitalSocial, desindustrialização me causou inúmeros desafetos empoleirados na Administração Pública e na Academia engajada.  

Aliaram-se à minha luta pequenos e médios empresários e  trabalhadores em geral, mesmo os sindicalizados não fanatizados. 

MAL DE 40 ANOS  

Desindustrialização é um mal responsável pela degringolada do Grande ABC nos últimos 40 anos.  

Santo André é o exemplo mais drástico. “Viveiro Industrial” virou sucata no Hino Oficial. 

Posto isto, vamos em frente. O que pergunto aos leitores é se estão preparados para um desafio que se apresenta de forma materializável, ou seja, com provas abundantes. 

A pergunta-base é a seguinte: você sabe o que é desindustrialização?  

Parece bobagem perguntar, mas o endereço não são exatamente os leitores frequentes desta revista digital, mas alguns participantes do jogo político-econômico do Grande ABC. 

APURANDO O CONCEITO  

O presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de ABC disse em entrevista ao Diário do Grande ABC (e aqui transformada em extensão com minha participação de abelhudo) que a desindustrialização é generalizada no País.  

Essa declaração foi a fonte para buscar um exemplo prático de que não se trata de verdade se o conceito de desindustrialização (ou de industrialização) for devidamente apurado.  

Santo André e Sorocaba estão na arena explicativa de forma pedagógica.  

Desindustrialização no sentido mais explícito do conceito tem a roupagem simples de menos Valor Adicionado da Indústria de Transformação num determinado período de maturação econômica.  

Se determinado endereço contava com “x” de Valor Adicionado e num período posterior apresentava um “x” menos brilhante, pronto, a desindustrialização estava configurada. 

CARACTERIZAÇÃO  

Isso é simplificadamente o que caracteriza desindustrialização. É perda em valores absolutos em qualquer comparação ao que se obtivera antes em forma de Valor Adicionado.  

Desindustrialização relativa é outra coisa e não necessariamente configura desindustrialização no sentido essencial do termo.  

Não necessariamente na desindustrialização relativa o setor de transformação sofre as durezas de perdas absolutas, mas se lança às águas da desindustrialização comparativa, por assim dizer. 

QUEDA DUPLA 

Santo André é um endereço tipicamente de desindustrialização relativa e de desindustrialização absoluta, real. 

Sorocaba é um endereço claramente de desindustrialização relativa e de industrialização absoluta. 

Santo André é, portanto, duplamente desindustrializada. 

Sorocaba é metade desindustrializada e metade industrializada. 

CAMPO MINADO  

Santo André inteiramente desindustrializada é um campo minado no presente e no futuro, porque não encontrou alternativas ao longo dos anos em outros setores para reparar os danos colaterais. 

Sorocaba relativamente desindustrializada segue um caminho de fortalecimento da qualidade de vida e de investimentos. 

Faço esse jogo de palavras e conceitos com o propósito de prender a atenção dos leitores a um aprendizado ao qual me dediquei e me sinto na obrigação de repassar. Muitos economistas renomados esquecem desse diferencial.  

Os espertalhões ufanistas usam suposta desindustrialização generalizada e espalhada por todo o território nacional para minimizar internamente o ritmo cruel de omissões e enganações. Querem confundir para reinar na obscuridade.  

PROVAS PROVADAS  

A verdade de hoje menos que a de ontem e muito menos que a de anteontem é que é possível encontrar arautos da intocabilidade industrial do Grande ABC. Gente que se ofende quando ouve ou lê o verbete “desindustrialização”.  

Entretanto, depois do período apurado de 35 anos e de quase 300 empresas do tamanho trabalhista de uma  Toyota de São Bernardo que desapareceram do território regional, não é mais possível bater o martelo na teimosia de um triunfalismo devastador do futuro.  

Não pretendo esgotar hoje tudo que anotei nesse confronto econômico entre Santo André e Sorocaba tendo como âncora analítica os conceitos flexíveis de desindustrialização e industrialização. Vou apresentar na sequência o suficiente para deixar o leitor encafifado.  

Um exemplo? O leitor sabia que a participação relativa do PIB Industrial de Sorocaba é semelhante à participação relativa do PIB Industrial de Santo André tendo o PIB Geral como marco indexador?

RELATIVIDADE ENGANADORA  

Traduzindo: quando se somam todas as atividades econômicas que geram o PIB Geral (indústria, comércio, serviços, administração pública, agronegócio) Santo André e Sorocaba são quase irmãos gêmeos no setor industrial: 23,81% para Sorocaba e 21,30% para Santo André. Menos de dois pontos percentuais a separar os dois endereços. O que supostamente não seria nada. 

Do ponto de vista do conceito raso de desindustrialização, de desindustrialização em números relativos, Santo André e Sorocaba perderam muita participação neste século e, portanto, poderiam ser colocadas no mesmo saco de estragos.  

No intervalo de 2000 a 2019 (dados mais atualizados), a participação relativa do PIB Industrial de Sorocaba caiu 43,04% (de 41,80% para 23,81%), enquanto Santo André caiu 43,80% (de 37,89% para 21,30%). Repararam nos números?  

PAPAGAIADA?

Ora, ora, perguntariam os mandachuvas e mandachuvinhas de plantão: “Então por que tanta papagaiada em torno da desindustrialização de Santo André e do Grande ABC como um todo se a badalada Sorocaba também viveu a mesma situação neste século?”.  

O demônio está nos detalhes. O paralelismo no placar da desindustrialização relativa de Santo André e de Sorocaba está condicionado à estrutura econômica dos dois municípios. E é nesse ponto que está o pulo do gato da separação de corpos interpretativos e factuais.  

O PIB da indústria de transformação de Sorocaba em 1999 representava 77,39% do PIB Industrial de Santo André. Em valores nominais daquela temporada, Santo André registrava R$ 2.256,54 bilhões, enquanto Sorocaba não passava de R$ 1.746,38. Na ponta da pesquisa, em 2020, houve inversão de resultado: Santo André passou a ter 72,78% da indústria de Sorocaba: R$ 8.877,89 para a cidade do Interior e R$ 6.461,59 para Santo André.  

JOGO DE INVERSÕES  

Na outra ponta, no PIB Geral, ou seja, contando-se todas as atividades econômicas, Sorocaba perdia para Santo André ao registrar 70,16% de participação. Já no ano 2020, Sorocaba contabilizava novos números da virada: Santo André passou a estar atrás com 81,37% de participação.   

Notaram o paralelismo entre o desempenho dos dois municípios quando se colocam o PIB Industrial e o PIB Geral em disputa? 

Tradução? No caso específico de endereços em fase de industrialização ou em fase de desindustrialização, a atividade primária da economia faz muita diferença.  

FAZENDO A DIFERENÇA  

Sorocaba, repito, sofre de desindustrialização relativa como o Brasil de maneira quase generalizada, mas Sorocaba não sofre de desindustrialização absoluta, como muitos endereços nacionais. Diferentemente disso: cresce. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.  

O desempenho industrial de Sorocaba, com consequente fortalecimento de outras atividades, é largamente o diferenciador do sucesso frente a Santo André.  

Temos no campo econômico ao longo deste século o que estamos assistindo nos últimos tempos nos confrontos entre Palmeiras e Corinthians. Ou seja, um massacre atrás do outro. 

FUTEBOL É DIFERENTE  

A comparação é proposital, mas tem uma complementação: é muito mais provável que o Corinthians reduza a diferença que o distancia do Palmeiras no campo de luta em tempo muito mais curto, infinitamente mais curto, do que Santo André de Sorocaba.  O mais provável mesmo é que Sorocaba amplie a diferença. 

Essa projeção está fundamentada nos números do início do século e nos números de 2019. A base de cálculo de crescimento do PIB é o ano de 1999.  

O PIB Per Capital de Santo André era 5,60% superior ao de Sorocaba: R$ 9.201,16 ante R$ 8.712,91. Vinte anos e uma combinação de desindustrialização dupla (de Santo André) e de desindustrialização apenas relativa (Sorocaba),  o Município do Interior estava 30,01% à frente de Santo André no PIB Per Capita: R$.54. 878,75 ante R$ 42,209,54.  

CAINDO PELAS TABELAS  

No ranking dos maiores municípios paulistas (exceto a Capital, excluída pelo poder descomunal) Santo André ocupava em 1999 a 12ª colocação no PIB Per Capita do G-22, enquanto Sorocaba não passava do 13º lugar. Já em 2019, ou seja, 20 anos depois, Santo André caiu para a 16ª posição, enquanto Sorocaba subiu para a 10ª colocação.  

No PIB Geral, e, portanto, sem o enquadramento per capita, Santo André ocupava a quinta posição em 1999 e caiu para a 11ª em 2019. Sorocaba manteve em 2019 a nona posição de 1999.  

DIFERENTE NO GRAMADO  

O PIB Geral desconsidera a demografia de cada Município, ou seja, o número de habitantes. O PIB Per Capita é sempre mais aconselhável a investigações econômicas porque a riqueza geral construída é dividida pelo número de habitantes.  

Vou avançar no confronto entre Santo André e Sorocaba numa próxima edição.  

Santo André só está melhor que Sorocaba nos gramados de futebol do Estado: o Ramalhão está na Série A-1 e o São Bento na Série A-2. No circuito nacional, as duas equipes têm a precariedade da Série D do Campeonato Brasileiro como infortúnio duplo.



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