O grupo do prefeito reeleito (mas não empossado e possivelmente judicialmente descartado José Auricchio Júnior) não quer perder a guerra em mais que provável turno extra para decidir quem dirigirá São Caetano nos próximos quatro anos.
Por isso o vale-tudo está estabelecido para sufocar a candidatura oposicionista mais forte, do ex-vereador Fabio Palacio.
Vale tanto tudo que até fake news sobre o time de futebol da cidade, o São Caetano Futebol Limitada, faz parte de especulações que ganham formato conceitual de fake news.
Primeiro, é melhor destrinchar a situação turva que definiria o candidato oficial do Paço. Está em plena tentativa de execução formal o descarte de Tite Campanella, eleito presidente do Legislativo e compulsoriamente levado ao cargo de prefeito interino.
Ou seja: à plataforma óbvia da candidatura a prefeito. Ninguém vira presidente de Legislativo numa situação excepcional como a de São Caetano sem integral conexão com o futuro eleitoral imediato. Exceto se o grupo que comanda a Administração de São Caetano for um manada de cavalgaduras.
Pressões grupais
O que parecia certo se tornou nebuloso. Integrantes do grupo menos transparente que dá suporte a José Auricchio teriam descoberto que Tite Campanella não seria de total confiança.
O entorno de José Auricchio é semelhante ao que dá suporte em Santo André a Paulinho Serra, mas com nuances próprias. Compartilha-se o poder municipal de forma bastante discreta. Peças importantes da gestão de José Auricchio são cuidadosamente controladas por subdivisões do poder municipal. As decisões mais importantes são compartilhadas de acordo com a temática envolvida. Disputa eleitoral é um compartimento explosivo.
A alternativa administrativa mais palatável para alguns integrantes do grupo de controladoria eleitoral é o filho do prefeito, Thiago Auricchio, deputado estadual.
O problema é que a iniciativa criaria áreas de risco que superariam as restrições a Tite Campanella. Thiago não teria nada a oferecer de vantagem eleitoral quando comparado a Campanella. Pelo contrário. Já carregaria o nome desgastado do pai eleito com apenas 32% dos votos disponíveis. Pior: mais jovem e inexperiente, possivelmente afastaria até mesmo parcelas significativas do eleitorado de Auricchio, o pai.
E a tradição dos Campanella no eleitorado mais idoso, que representa um quarto da população de São Caetano?
Dinastia dos Auricchios
Há mais prejuízos à vista. A dinâmica de mobilidade eleitoral de ocupação do Paço de São Caetano seria seccionada. Thiago configuraria perspectiva de eventuais novos oito anos dos Auricchios no poder municipal. Que se somariam aos 12 cumpridos pelo pai.
A projeção resultaria na longa dinastia dos Auricchio neste século em São Caetano. Em 28 anos, pai e filho ocupariam o cargo máximo durante 20 anos. São Caetano vem desabando no ranking dos 20 maiores municípios do Estado de São Paulo. Entra ano, sai ano, os indicadores econômicos comprometem a energia da livre-iniciativa e engraxa as engrenagens do que poderia ser chamado de Custo São Caetano – a carga fiscal municipal é cada vez mais pesada para o conjunto da população.
Por conta da supremacia dos Auricchios, há dissidências internas. Em oposição à desconfiança gerada por Tite Campanella, supostamente menos sujeito ao encabrestamento coercitivo diplomático, São Caetano apresentaria o contrassenso de uma alternativa que consolidaria uma hierarquia familiar desafiadora às naturais ambições de outros agentes políticos.
Palacio em vantagem
A iniciativa de troca de Campanella por Thiago Auricchio alimentaria o discurso oposicionista de Fabio Palacio. E destruiria um dos pilares de desgaste do candidato derrotado em novembro -- o de que seria inexperiente para ocupar a chefia do Executivo.
Thiago Auricchio conta com idade e currículo inferiores. Deputado estadual em primeiro mandato, Thiago Auricchio deve a vitória aos votos obtidos em todo o Interior do Estado. Em São Caetano não passou de 15 mil, mesmo com todo o aparato do Paço Municipal.
Quanto mais alternativas para se chegar ao nome que supostamente disputaria o turno extra em São Caetano, determinado pela Justiça Eleitoral, mais a gestão sob controle organizacional de José Auricchio Júnior se colocaria aos olhos da população como colcha de retalhos de inquietações.
Crime eleitoral explícito
A constatação formal do impedimento judicial de posse de José Auricchio Júnior lubrificaria o marketing eleitoral do oposicionista Fabio Palacio. A indicação do filho carregaria toxidade de votos que sufragaram o pai.
Portanto, não haveria mais, como houve no turno único de novembro, qualquer resquício de dúvida sobre o crime eleitoral cometido pelo então prefeito candidato à reeleição. Ou seja: o discurso desclassificatório utilizado pelo prefeito José Auricchio durante o processo eleitoral simplesmente capitularia. E se estenderia à candidatura do filho, provavelmente em dosagem muito superior à de qualquer outro indicado pelos situacionistas.
Filho impedido?
Para complicar a situação dos defensores da candidatura de Thiago Auricchio (e que o levaram a declarar ao Diário do Grande ABC de ontem estar disposto a disputar a eleição e ocupar o cargo do pai eleito), há barreiras jurídicas -- segundo o advogado Arthur Rollo, um dos maiores especialistas em Justiça Eleitoral. Um posicionamento jurídico dele em vídeo é massificado nas redes sociais. No material provavelmente disseminado pelos opositores de José Auricchio, o especialista afirma com base na Constituição Federal que Thiago Auricchio está impedido de concorrer porque o pai teria de ter renunciado seis meses antes da disputa de novembro.
A matéria é complexa e permite interpretações variadas. Arthur Rollo admite que existe a possibilidade de a estratégia esticar ainda mais o mandato interino de Tite Campanella.
De qualquer forma, tenha condições legais ou não de concorrer, a infiltração do filho do prefeito numa eventual nova disputa pelo comando de São Caetano não esconde a movimentação que contraria o grupo defensor da titularidade de Tite Campanella na chapa situacionista.
Franco-atiradores
Francos atiradores que atuam como aliados do prefeito José Auricchio estão à caça de materiais bélicos que possam desgastar a candidatura de Fabio Palacio. Por isso seguem com narrativas especiais que pretendem contaminar a opinião pública de São Caetano.
O assassinato social do então candidato a vice-prefeito Saul Klein segue rendendo ataques viscerais. No fim de semana um panfleto assinado por conhecido mercenário político-eleitoral explorou impiedosamente o caso. Seguiu rigorosamente -- mas com tintas sem qualquer rebuscamento intelectual -- a trilha de mão única de informação do Fantástico e da Folha de S. Paulo.
O assassinato eleitoral de Saul Klein está no pacote do assassinato social. Redes sociais associam a candidatura de Fabio Palacio às denúncias contra Saul Klein. Uma consequência natural do jogo político. Eles formavam a principal chapa de oposição a José Auricchio.
Numa outra frente que atinge o ex-executivo e herdeiro da Casas Bahia, alimenta-se a versão de que o São Caetano Futebol Limitada, presidido por Nairo Ferreira, estaria pretendendo incluir a sede social numa suposta venda do clube-empresa. A sede social integra o acervo imobiliário do Município e está cedida em regime de comodato. Por trás da operação que destila picaretagem da grossa, estaria a Geni da vez da política em São Caetano. Saul Klein, claro.
Sem pé nem cabeça
O noticiário não tem pé nem cabeça, mas gerou reação mais que programada de agentes políticos ligados a José Auricchio que, em tom de irritação mais que cinematográfica, condenam a pretensa iniciativa. Tudo não passa de uma encenação com a finalidade de criar dificuldades éticas a Fabio Palacio. As fragilidades do noticiário são profundas.
Primeiro porque Saul Klein não é mais dirigente nem patrocinador do São Caetano. Está ligado à Ferroviária de Araraquara.
Segundo porque Saul Klein e Nairo Ferreira são tão próximos quanto João Doria e Jair Bolsonaro.
Terceiro porque Saul Klein há muito tempo, ainda mecenas do São Caetano, encaminhou verbalmente pedido à gestão de José Auricchio para que fosse encerrada a concessão de uso das instalações municipais, por conta dos custos elevados.
Quarto porque não há nexo ao se incluir numa operação de venda das ações do São Caetano Futebol Limitada uma área sem qualquer vínculo com a atividade esportiva, cuja demanda por aprovação legal seria desgastante e improvável.
História mal contada
A história é tão mal contada e tão bem articulada politicamente que não falta na praça quem caia no conto do vigário esportivo. É a expressão latente de fake news tão condenada nas redes sociais, mas que, quando utilizada em jornais impressos, caso do noticiário do Diário do Grande ABC, ganha rotulagem de verdade.
Negociações em torno do São Caetano Futebol Limitada, como disse o presidente Nairo Ferreira ao Diário do Grande ABC de hoje, são o grande sonho de consumo para impedir que a agremiação empresarial desapareça.
Disputar a Série A-1 do Campeonato Paulista com algum poder de competitividade ainda é possível com dinheiro de patrocinadores oficiais da Federação, distribuído aos clubes de acordo com o desempenho nas últimas edições. Resta saber qual será o dia seguinte.
O São Caetano não é atratividade negocial a grupos de investidores que levem planilhas a sério. A dívida superior a R$ 40 milhões é impeditivo cavalar. A história de sucesso dentro de campo neste século foi manchada ao longo da última década.
Há opções no mercado muito mais interessantes. Saul Klein tem o controle da Ferroviária, por exemplo, com menos de R$ 3 milhões. E desistiu do Santo André antes de alçar voo rumo ao Interior porque houve especulação de que estaria disposto a pagar R$ 7 milhões, um valor que jamais foi cogitado entre outras razões porque elevado demais.
Quando futebol e política entram no mesmo campo de disputa das urnas, os resultados são sempre danosos. Geralmente a verdade dos fatos é a primeira a ser eliminada.