Um erro técnico da candidatura de Ailton Lima à Prefeitura de Santo André, seguido de passo em falso da campanha do prefeito Paulinho Serra: eis o resumo da ópera da novidade em Santo André faltando 15 dias para a disputa eleitoral. Os desdobramentos vão definir quem vai levar vantagem no caso.
Por enquanto e precariamente quem está ganhando esse jogo é Bruno Daniel, outro concorrente ao Paço Municipal. O irmão mais novo de Celso Daniel se beneficiaria das escaramuças sem precisar entrar na briga.
Para entender esse jogo que está sendo jogado em busca de votos é preciso começar do começo e tratar o assunto como um orientador demandado por interessados.
Vou tentar ser o mais didático possível para levar aos leitores o que transpira subliminarmente no caso. Recorro, para tanto, à notícia publicada na edição de ontem do Diário do Grande ABC. Talvez venha a contar com mais informações nos próximos dias. Vejam os pontos a serem brevemente avaliados:
Erro da campanha de Ailton Lima.
Passo em falso de Paulinho Serra.
Vantagem de Bruno Daniel.
Desdobramentos possíveis.
Não custa lembrar mais uma vez (até porque a audiência na mídia digital é rotativa, a leitura é apressada, há ignorantes às pencas e detratores a dar com pau) que o que se seguirá são conjecturas associadas a fatos, ou fatos associados a conjecturas, como queiram.
Erro da campanha de Ailton Lima
Segundo o noticiário relativamente destacado na edição de ontem do Diário do Grande ABC, sob o título “Justiça manda Ailton Lima tirar do ar vídeo sobre gasto com propaganda”, o candidato do PSB recebeu determinação da juíza eleitoral auxiliar Fernanda de Almeida Pernambuco, da Zona Eleitoral de Santo André, para retirar do ar vídeo em que afirma que o prefeito Paulinho Serra (PSDB) gastou R$ 100 milhões com propaganda.
A matéria assinala que o vídeo foi publicado em 22 de outubro. “Além de afirmar que Paulinho Serra gastou R$ 100 milhões com publicidade, Ailton Lima também afirmou que uma série de supostas irregularidades praticadas pela atual administração estraria sendo encoberta pelos meios de comunicação em razão desses expressivos gastos com propaganda”, segundo o jornal.
Escreveu mais o jornal:” A Justiça acatou a alegação da coligação (ligada ao prefeito) que afirmou o material tratar-se de divulgação de notícia sabidamente inverídica e ofensa à hora do candidato a reeleição e prefeito de Santo André”.
Mais, escreveu o Diário do Grande ABC: “A decisão determinou que o Facebook tire imediatamente o vídeo do ar, que Ailton Lima conceda direito de resposta em sua página por um período de 14 dias (o dobro do tempo em que o material foi veiculado) e estipulou multa diária de R$ 5.320,50 em caso de descumprimento”.
A campanha de Ailton Lima errou duas vezes do ponto de vista técnico, com repercussão política, como se vê.
A especificação do valor monetário relativo aos gastos de propaganda da Administração Paulinho Serra poderia ser omitida já que, ao que transpira, não era exatamente a mencionada. O montante elevado, mas não especificado poderia ser sugerido com qualquer adjetivo que levasse os eleitores a compreenderem o que seria uma suposta extravagância.
Quanto ao vínculo dos valores ao que eu chamaria diplomaticamente de qualquer coisa que significasse condescendência da mídia com a Administração, nada soaria estranho. Trata-se de praxe no mercado de notícias adocicadas, segundo a crença e a vivência dos especialistas do ramo.
Teria valido muito mais citar os casos em que a mídia coloca Paulinho Serra no berço do conforto de mentiras e meias-verdades tratadas como sucesso administrativo. Há toneladas de provas nesse sentido. Sem falar, claro, da falta de transparência em tantas questões básicas.
Aliás, no caso específico de verbas publicitárias, a falta de detalhes básicos pode ser entendida não apenas quanto ao volume despendido, mas também ou principalmente quanto aos destinos midiáticos escolhidos.
A relação entre organizações públicas e imprensa não pode ser tratada a ferro e fogo em termos de recursos liberados em forma de propaganda. Há políticas públicas que exigem o que os defensores da prática chamam de publicização.
O que a gestão de Paulinho Serra não oferece aos contribuintes é um cardápio explicativo que retire a suspeita de irregularidades ou de compadrios. Os dispêndios com propaganda precisariam, no caso, ganhar o rótulo de importância social. Seriam as campanhas publicitárias de Paulinho Serra conceitualmente nobres na aplicação de dinheiros dos contribuintes?
Passo em falso de Paulinho Serra
Para quem trombeteia aos quatro cantos (inclusive com pesquisas eleitorais sob forte suspeição não só de resultados numérico, mas de fontes de financiamento) que a eleição em Santo André está decidida no primeiro turno, causa espanto que a campanha de Paulinho Serra recorra ao Judiciário eleitoral para punir um infrator.
A conclusão é aparentemente irrepreensível: Ailton Lima incomoda o prefeito de Santo André. Não bastasse o transtorno chamado Bruno Daniel. Além do próprio Sargento Lobo, a quem faltariam mais votos, mas sobra impetuosidade oposicionista que desgasta a imagem do titular do Paço Municipal. E que, por conta disso, ele, Lobo, paga um preço previsível.
O misto de advogado eleitoral e marqueteiro Leandro Petrin, espécie de primeiro-ministro de Paulinho Serra, teria sido o agente tabajarense da operação. Deu-se, com a medida punitiva, mais visibilidade a um adversário até então oficialmente ignorado. Caiu, portanto, a máscara do cinismo eleitoral. Ailton Lima existe mesmo na campanha de Paulinho Serra. E quando um adversário existe, é sinal que preocupa. E se preocupa é preciso combatê-lo.
A visibilidade no caso, embora pareça positiva à candidatura de Paulinho Serra, porque se trata de colocar ordem no galinheiro de responsabilidade eleitoral, pode encontrar contragolpe também no campo do judiciário específico.
Leandro Petrin é espécie de primeiro-ministro da gestão de Paulinho Serra dentro de acordos e conveniências de caciques envergonhados do PT que apoiam o prefeito.
Egresso do PT e considerado um especialista em Justiça Eleitoral, Leandro Petrin olhou para o próprio umbigo da especificidade profissional e deu um chute na canela político-eleitoral ao impetrar o recurso mencionado.
É verdade que o que parece um golpe de mestre judicial, mas com sérias rachaduras político-eleitorais, poderá ganhar robustez nos próximos dias, conforme explico mais adiante. Entretanto, a decisão não apaga a barbeiragem da confissão pública de que Ailton Lima está na parada para impedir a vitória de Paulinho Serra no primeiro turno.
Ganhar no primeiro turno é quase uma obsessão de Paulinho Serra e seus apoiadores. O passado insistente de que segundo turno em Santo André significa fim de linha para quem está no Paço Municipal é o fantasma a enfrentar.
Vantagem de Bruno Daniel
Sem mexer uma pedrinha sequer do xadrez eleitoral em Santo André, o psolista Bruno Daniel acaba ganhando pontos com a trapalhada dupla dos candidatos considerados favoritos ao primeiro e ao segundo lugar na competição por votos do eleitorado em 15 de novembro.
Tudo indica que qualquer que seja o desfecho do caso, Bruno Daniel sairá no lucro. E vai ficar ainda mais entusiasmado se a carreira de Guilherme Boulos na campanha eleitoral na Capital for confirmada como ascendente nas duas semanas que faltam para se conhecer os dois finalistas. A dupla virtual Boulos-Bruno Daniel teria em larga proporção o apoio dos esquerdistas de Santo André. O que poderia esvaziar os votos potenciais da petista Bete Siraque.
Desdobramentos possíveis
Parece provável que a campanha de Ailton Lima vai recorrer da sentença da juíza substituta. Será interessante se conseguir dar um nó defensivo, como parece que pretende o candidato que já foi secretário de Desenvolvimento Econômico de Santo André.
Ao Diário do Grande ABC de ontem, na mesma reportagem que dá conta da deliberação judicial, Ailton Lima disse que já teria encontrado R$ 85 milhões de despesa publicitária da Administração Paulinho Serra com veículos de imprensa. Tudo estaria retardatariamente no Portal da Transparência da Prefeitura. O que precisa ser analisado é o conceito de transparência.
Há quem trate a notícia veiculada na campanha de Ailton Lima como fake news. Não me parece que a expressão se ajuste à situação. Caso não mencionasse o valor, e não se imiscuísse diretamente no suposto condicionamento ao que muitos chamam de cala-boca à mídia, Ailton Lima dificilmente encontraria qualquer barreira no campo da comunicação.
Talvez tenha faltado ao opositor de Paulinho Serra um Leandro Petrin como assessor eleitoral. O mesmo Petrin que, ouvido pelo Diário do Grande ABC naquela matéria, disse com a singeleza dos puros exatamente o seguinte: “Os candidatos devem debater os temas da cidade, evitando ataques e mentiras”.
O representante máximo do prefeito Paulinho Serra poderia ter dito também que, além os candidatos debater temas da cidade, evitando ataques e mentiras, poderiam ser impedidos de fugir de qualquer pergunta embaraçosa. Que tipo de pergunta embaraçosa? De questões que coloquem em xeque o modelo serrista supostamente público de enfrentar o contraditório de veículos de comunicação sem rabo preso com a Administração.
Para completar: o que ocorrer nos próximos dias em eventuais instâncias da Justiça Eleitoral possibilitará uma vantagem na reta de chegada a um dos candidatos em questão, ou sacramentará o ganho exclusivo de Bruno Daniel. Trata-se de uma vantagem pequena, claro, que se somará a tantos outros fatores. Quem disse, afinal, que se ganha eleição apenas por um ou alguns quesitos?
O desgaste provocado pela decisão judicial coloca Ailton Lima no prejuízo e Paulinho Serra no confessionário de quem quer espantar um ou mais fantasmas que aparecem no radar de complicações do primeiro turno.