Administração Pública

Uma sugestão para Morando
levar ao governador Tarcísio

  DANIEL LIMA - 20/07/2023

Maior liderança da região junto ao novo governador do Estado, o prefeito Orlando Morando, de São Bernardo, poderia aproveitar uma sugestão que faço nesta edição (não a dividi com ninguém até agora) e atacar para valer as complicações na área de saúde pública. Como se sabe, os problemas não têm endereço específico de infortúnios como alguns sugerem insistentemente por razões que vão muito além do além.  

Chego mesmo a duvidar da autoria de obviedade tão imensa. Afinal, o que não faltaram e não faltam na região ao longo de décadas são representantes no Legislativo Paulista.  

Não li nada sobre o que proponho ao longo de décadas de leituras e, por isso, não corro o risco de plágio mesmo involuntário. 

Pesquisei pra burro na Internet para ver se encontrava algo semelhante ao que proponho agora, e não encontrei absolutamente nada.  

DESPROPORCIONALIDADE  

Se confirmada tal aberração, a constatação é  que somos mesmo uma terra deserdada de criatividade sustentável e inadiável. Vamos aos finalmentes, então?  

Orlando Morando poderia solicitar ao governador Tarcísio de Freitas o que chamaria de desmembramento do Departamento Regional de Saúde da Região Metropolitana de São Paulo, que comporta 39 municípios – praticamente metade da população do Estado.  

A outra metade, ou seja, os mais de 600 municípios, contam com 16 Departamentos Regionais de Saúde sob o guarda-chuva paulista. 

A Baixada Santista, as regiões de Araçatuba, Araraquara, Barretos, Bauru, Campinas e tantas outras, todas menos ou semelhantemente populosas em relação ao ABC Paulista, contam com departamentos próprios, vinculados diretamente à estrutura estadual. 

RECADO DADO  

Na visita que fez recentemente a São Bernardo, quando se inaugurou mais um investimento na área de saúde que contou com reforço estadual de R$ 150 milhões, o governador Tarcísio de Freitas falou durante 20 minutos e se referiu às dificuldades de conciliar oferta e demanda na área. O orçamento estadual é curto e dos municípios também. 

Tarcísio de Freitas chegou inclusive a anunciar o que chamou de Loteria Paulista, cujas receitas líquidas iriam diretamente aos cofres do Estado e repassados aos municípios,  segundo critérios específicos.  

Técnico que rompe com o perfil convencional de político, Tarcísio de Freitas disse rapidamente durante o encontro em São Bernardo, diante do anfitrião Orlando Morando, que há duas formas de combater o déficit de eficiência generalizado no Estado.  

Primeiro, reorganizar os instrumentos de que o Estado conta ao adotar medidas internas, de gerenciamento e uso intensivo de tecnologia digital. Segundo estabelecer com rigor atenção especial à regionalização. 

Houve quem,  descuidado e afoito,  entendesse na mídia regional que “regionalização” da saúde estadual reuniria similaridade, ou fosse mesmo igual, à “regionalidade” no sentido organizacional do ABC Paulista. Não é bem assim. Aliás, não tem nada a ver com isso. 

CONCEITOS DIFERENTES  

Regionalização é um conceito flexível em termos de gestão porque não necessariamente está circunscrito a aplicação em determinados municípios próximos territorialmente.  

Tanto é verdade que o Estado de São Paulo regionalizou o sistema de saúde em 17 departamentos geográficos, ou seja,  sem levar em conta qualquer resquício de regionalidade.  

Não foi isso que o governador  disse naquele encontro. Tarcísio se referiu estritamente à regionalização. Resgatei na Internet a íntegra do discurso. Pouco mais de 21 minutos de gravação.  

Regionalidade é outra história, portanto. Regionalização é uma especialidade organizacional coletiva que não dispensa necessariamente regionalidade, mas que não depende de regionalidade. Mais que isso: regionalização em determinadas situações dispensa regionalidade.  

GESTÃO ESPACIAL  

Exemplo: a gestão da saúde regional adviria de forma mais próxima da regionalização da gestão da saúde estadual no interior do mapa de departamentos específicos.  

Um Departamento Regional do ABC Paulista dentro do macromapa de regionalização da saúde do Estado de São Paulo provavelmente proporcionaria muitas vantagens não só aos cofres do governo estadual como também aos cofres locais. Sem contar outras vantagens em forma de qualificação geral do insumo público demandado, segundo o governador, por mais de 30 milhões de paulistas.  

O governador do Estado que caminha para ser o maior cabo eleitoral nas próximas eleições municipais (acima de Lula e de Bolsonaro) não inaugurou em São Bernardo o placar de comentar a regionalização da saúde estadual em forma de mais organização técnica e de atendimento. 

LANÇAMENTO ESTADUAL  

Em abril, quatro meses após tomar posse, Tarcísio de Freitas reuniu quase 200 prefeitos no Palácio dos Bandeirantes,  quando deu o pontapé inicial da regionalização dos serviços públicos de saúde em todo o Estado.  

Tarcísio de Freitas reconheceu, segundo o noticiário, a necessidade de investimentos no setor, mas fez ressalvas. “Temos o problema claro de financiamento na Saúde, mas não adianta se não arrumarmos a gestão” – disse. Deixou um recado nas entrelinhas: não pretende fazer novos repasses aos municípios sem antes cuidar de sério levantamento.  

Se agora, em julho, Orlando Moando foi contemplado com recursos do Estado, a mensagem que se passa é de que o prefeito de São Bernardo ofereceu ao governo do Estado as provas de que estaria habilitado ao repasse.  

Por isso, transformar a medida em privilegio, como se pretendeu vender de forma agressiva e retaliatória, não parece ser a conclusão mais ajuizada.  

Os demais municípios da região que armazenam demandas de repasses especiais provavelmente ainda não atingiram o grau de confiança do governador ou o dinheiro não dá imediatamente para todos e quem está mais próximo tem sempre a preferência. Qualquer governo adota essa filosofia. 

DADOS QUANTIFICADOS  

Uma das propostas do governo do Estado para desafogar os hospitais de alta complexidade é melhorar a atualização dos leitos já existentes em hospitais de médio porte, diz o noticiário daquele encontro.  

O secretário estadual de Saúde, Eleuses Paiva, estimou que o percentual de ocupação dessas vagas gira entre 20% e 25%, ou seja, haveria hospitais com sobras de leitos.  

O que se tem como certo é que o governador do Estado colocou a saúde pública debaixo do braço e não dá trégua a processos que provoquem reviravoltas produtivas. E conta com dois reforços nesse sentido, entre tantos menos visíveis: o secretário estadual Eleuses Paiva e o presidente do Conselho de Secretários Municipais de Saúde (Cosems) e secretário de Saúde de São Bernardo, Geraldo Reple Sobrinho.   

Além disso, também em patamar de semelhante importância, atua o consultor da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e coordenador do Projeto de Regionalização da Saúde, Renilson Rehem. 

PALAVRA DO SECRETÁRIO  

Veja o que disse o secretário estadual num encontro em São José do Rio Preto, durante a mesa de abertura do projeto: 

“O objetivo do programa é a diminuição das desigualdades entre as regiões para aumentar a eficiência do gasto público, ampliar a oferta de serviços, fazer as filas andarem e reduzir a distância que as pessoas precisam percorrer para conseguir atendimento. Atualmente, os municípios aplicam até 40% do seu orçamento na saúde, mas, devido à falta de integração das unidades, muitas vezes o cidadão ainda não tem suas necessidades atendidas. O projeto prevê a adequação dos ambulatórios médicos de especialidades e hospitais estaduais às necessidades regionais, efetivamente descentralizando o sistema de saúde” – afirmou o secretário. 

INSUSPEITABILIDADE  

Se você acha que ainda é possível ter mais informações sobre o processo já desencadeado, então leia mais um trecho das declarações do secretário estadual:  

“O projeto de regionalização é importante para discutir a saúde não mais com uma visão municipal, mas com uma visão da assistência à saúde numa região. Cada município vai apresentar os seus gargalos, as suas dificuldades, e nós vamos, conhecendo a capacidade instalada de cada Município e a demanda histórica que temos na região, cruzar esses dois lados para ver a velocidade de atendimento e ampliar o acesso da população àquelas unidades que nós já temos construídas na região”.  

Se há alguém insuspeito no ABC Paulista para defender a relativização do conceito de regionalidade ao lançar mão do derivativo “regionalização” é exatamente este jornalista.  

Minha jornada diária pró-regionalidade é a mais longeva da praça. Por isso, como princípio básico à reorganização da saúde pública no ABC Paulista, a proposta que faço em forma de sugestão ao prefeito Orlando Morando é integralmente sólida.  

Não seria a ruptura no Clube dos Prefeitos, entidade da qual tanto Morando quando o prefeito de São Caetano, José Auricchio, se afastaram, que impediria a medida.  

Regionalização da saúde sob a batuta do Estado dispensa regionalidade num primeiro estágio de implantação e reestruturação. Quem sabe, mais tarde, sempre sob o controle estratégico do governo do Estado, a regionalização ganhe força de tração e chegue ao estágio de regionalidade, numa cooperação ideal para quem enxerga o movimento das pedras de interesses públicos acima de partidarismos políticos.  

CORONAVÍRUS   

Para completar, sem a garantia de que não voltaremos ao assunto: o desastre regional no combate ao Coronavírus, rivalizando óbitos com o Distrito de Sapopemba, na Capital, diz praticamente tudo sobre a ineficiência tanto do Clube dos Prefeitos, então sob a influência do prefeito Paulinho Serra, quanto do modelo do próprio governo do Estado que passou, ou seja, de amplitude excepcionalmente abrangente do Departamento Regional de Saúde da Região Metropolitana de São Paulo.  

É preciso inserir uma nova configuração na área tendo como uma das premissas as especificidades orgânicas geográficas, geoeconômicas e geosanitárias que nos afligem. Regionalização é isso. Regionalidade pode esperar. Nesse caso.

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