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Sociedade

DANIEL LIMA - 05/11/2024

Não há mesmo saída para quem passa todo o tempo mentindo: é constrangedora a posição do Grande ABC no Campeonato Brasileiro de Qualidade de Vida, como poderia ser chamado o Ranking de Sustentabilidade divulgado anualmente pelo Instituto Cidades Sustentáveis. São Caetano,  em oitavo lugar na classificação geral, é exceção. Santo André, São Bernardo, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra apanham sem cessar.

Uma análise de 1997 -- que preparei para CapitalSocial, e que está logo abaixo  --, não só vai completar 30 anos como também reforça a origem da linha editorial desta publicação, sempre voltada à qualidade de vida, uma das ramificações de Desenvolvimento Econômico.

Dessa forma, que os prefeitos eleitos em outubro não esqueçam que a herança vem de longe. E que, portanto, troquem holofotes de assessorias de imprensa em forma de jornalismo e trabalhem para valer. Mas trabalhem com metodologias específicas. Estamos passando vergonha demais.

Os novos prefeitos que jamais foram prefeitos estão pegando um rabo de foguete social.  E, exatamente por conta disso, não podem repetir a velha lengalenga dos que já passaram pela experiência de dirigir um Município. Eles, no conjunto, e com algumas exceções, fracassaram.

Os resultados que estão na nova edição do Campeonato Brasileiro de Qualidade de Vida são consequências evidentes de gerações de administradores públicos à frente das prefeituras dessa região de sete cabeças conflitantes.

É A ECONOMIA!!

A insistência deste jornalista nos últimos tempos ao chamar a atenção para a burrice separatista em meados do século passado não é birra. É constatação que os autonomistas detestam. Mas, mesmo assim, mesmo retalhada, a região poderia ser outra. Fosse o Clube dos Prefeitos o que deveria ser não o que os bajuladores entendem que é. É coisa nenhuma, seus ignorantes.

Confesso que toda vez que vejo o Grande ABC que conheço retratado em dados estatísticos responsáveis, sem ficcionismos em forma de premiações fajutas, fico enraivecido.

Primeiro, porque o desfiladeiro econômico, matriz do restante, segue implacável. Segundo, porque logo-logo os triunfalistas voltam a agir. Vão consagrar um resultado manipulado aqui, outro ali, e a vida continua. Sempre com a assessoria de imprensa da maioria da mídia propagandística.

Na classificação geral do Brasileiro de Qualidade de Vida, São Caetano é a única representação do Grande ABC que perfila na Série A, com 64,03 pontos entre 100 possíveis. Ocupa a oitava posição, considerada de Alto Nível pelos organizadores do ranking. Diadema e Rio Grande da Serra estão no  extremo oposto, de Baixo Nível, ou Série C da competição. Diadema registrou nota média de 48,28 pontos enquanto Rio Grande da Serra chegou a 46,42 pontos. Santo André (53,11 pontos), Ribeirão Pires (52,10) São Bernardo (51,38) e Mauá (50,89 pontos)n ocupam a Série B do Brasileiro de Qualidade de Vida. 

QUEDA GENERALIZADA

Vou na cola do quadro publicado na edição de hoje do Diário do Grande ABC para dar a dimensão de um estrago complementar, não bastasse o estrago anterior. Entre o ranking do ano passado e o ranking de agora, as sete cidades da região acusaram queda coletiva de 4.352 posições. Ou seja: na versão de 2023, o acumulado do Campeonato Brasileiro de Qualidade de Vida do Grande ABC era de 5.921 posições. Já nesta temporada é de 10.272. Vejam o desempenho dos sete municípios:

1. São Caetano caiu sete posições, do primeiro para o oitavo lugar.

2. Santo André caiu 644 posições, da 355ª para a 999ª.

3. Ribeirão Pires caiu cinco posições, da 1.214ª para a 1.219ª.

4. São Bernardo caiu 749 posições, da 645ª para a 1.394ª.

5. Mauá caiu 671 posições, da 862ª para a 1.533ª.

6. Diadema caiu 754 posições, da 1.521ª para a 2.275ª.

7. Rio Grande da Serra caiu 1.842 posições, da 1.018ª para a 2.860ª.   

Qualidade de vida é uma preocupação eterna de CapitalSocial. Desde os tempos da revista de papel LivreMercado, antecessora desta publicação. Entre os quase nove mil textos do acervo de CapitalSocial, mais de um mil contem a expressão “qualidade de vida”. É impossível tratar o presente e o futuro do Grande ABC, além do passado, sem se dar conta de que os estragos econômicos seguidos de negligência das autoridades públicas em geral e das lideranças de outras áreas, também, sem se preocupar com os indicadores sociais. Vejam os vetores do Campeonato Brasileiro de Qualidade de Vida:

1. Erradicar a pobreza.

2. Erradicar a fome.

3.Saúde de qualidade.

4. Educação de qualidade.

5. Igualdade de gênero.

6. Água potável e saneamento.

7. Energias renováveis e acessíveis.

8. Trabalho digno e crescimento econômico.

9. Indústria, inovação e infraestrutura.

10. Reduzir as desigualdades.

11. Cidades e comunidades sustentáveis.

12. Produção e consumo sustentáveis.

13. Ação climática.

14. Proteger a vida marinha.

15. Proteger a vida terrestre.

16. Paz, justiça e instituições eficazes.

17. Parcerias para implantação dos objetivos

ENTENDA O RANKING 

A Agenda 2030 e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) surgiram em 2015 como um grande pacto supranacional para o enfrentamento dos principais desafios globais. Assinado por autoridades dos 193 Estados-membros da Organização das Nações Unidas (ONU), incluindo o Brasil, o acordo logo se apresentou como uma ambiciosa agenda comum para nações de todos os continentes. 

Com o propósito de promover universalmente a prosperidade econômica, o desenvolvimento social e a proteção ambiental, a Agenda 2030 trata de questões que requerem a participação ativa de todos – governos, sociedade civil e setor privado. No entanto, o aspecto abrangente e integrado dos 17 objetivos e 169 metas, necessário para estabelecer um conjunto de ações para países com realidades muito distintas, trouxe um desafio a mais para as cidades de modo geral, no Brasil e no mundo. 

Afinal, como implementar e levar os ODS para o nível local, onde as mudanças, políticas e investimentos também são fundamentais para o seu cumprimento? Como traduzir os compromissos definidos pela ONU em metas e indicadores monitoráveis, capazes de serem medidos e comparados ao longo do tempo, de modo que se possa acompanhar e avaliar a sua evolução? 

TRANSFORMAÇÕES 

Oferecer as ferramentas necessárias para os municípios brasileiros superarem esse desafio é uma das grandes ambições do Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades – Brasil (IDSC-BR), uma iniciativa do Instituto Cidades Sustentáveis (ICS), no âmbito do Programa Cidades Sustentáveis (PCS). 

O IDSC-BR pretende gerar um movimento de transformação na gestão pública municipal. A intenção é orientar a ação política de prefeitos e prefeitas, definir referências e metas com base em indicadores e facilitar o monitoramento dos ODS em nível local. Há um índice para cada objetivo e outro para o conjunto dos 17 ODS, de modo que seja possível avaliar os progressos e desafios dos municípios brasileiros para o cumprimento da Agenda 2030, de modo geral, e para cada objetivo que estabelece, em particular. 

Assim, o IDSC-BR – sempre segundo os organizadores -- cumpre a dupla função de auxiliar as cidades a medir seu desempenho segundo os objetivos da ONU, bem como de permitir uma série de análises que vão além dos limites municipais. É possível, por exemplo, verificar e comparar os dados das cidades em recortes territoriais mais amplos (grandes regiões, biomas, estados e regiões metropolitanas), ou agrupar os municípios de acordo com características comuns e específicas, que extrapolam as questões territoriais (como aspectos demográficos, sociais e ambientais, entre outros). 

PONTUAÇÕES AGREGADAS 

Ao conferir uma pontuação para cada ODS, o índice permite ainda outros tipos de agrupamentos das cidades, para análises e comparações nas diversas áreas temáticas abordadas pelos objetivos da ONU.  

A metodologia do IDSC-BR foi elaborada pela rede SDSN (UN Sustainable Development Solution Network), uma iniciativa que nasceu dentro da própria ONU para mobilizar conhecimentos técnicos e científicos da academia, da sociedade civil e do setor privado no apoio de soluções em escalas locais, nacionais e globais. Lançada em 2012, a SDSN já desenvolveu índices para diversos países e cidades do mundo. Assim, o trabalho também faz parte de uma série de relatórios produzidos pela rede com o objetivo de acompanhar a implementação dos ODS nos Estados-membros da ONU. 

Outro aspecto  -- segundo os organizadores --  importante é que os dados e informações do índice fornecem os subsídios necessários para a elaboração do Relatório Voluntário Local (RVL), um balanço do progresso das cidades no cumprimento da Agenda 2030. A produção do relatório é uma orientação da ONU para países e municípios, com o objetivo de facilitar a troca de experiências, sucessos, desafios e lições aprendidas. Além de ser um instrumento de transparência e prestação de contas, o RVL também busca fortalecer as políticas e instituições dos governos, bem como mobilizar apoio e parcerias para a implementação dos ODS em nível local. 

Dados e estatísticas são essenciais para impulsionar as transformações necessárias e indispensáveis tanto em nível global quanto local. Nesse sentido, o índice tem a intenção de estabelecer os ODS como ferramenta útil e efetiva para a gestão pública e a ação política nos municípios brasileiros. O monitoramento de indicadores permite guiar as prioridades dos governos locais de acordo com os desafios identificados a partir da análise de dados. 

AVALIAÇÃO ABRANGENTE 

O IDSC-BR apresenta uma avaliação abrangente da distância para se atingir as metas dos ODS nos 5.570 municípios brasileiros, usando os dados mais atualizados disponíveis em fontes públicas e oficiais do Brasil. Ao todo, o índice é composto por 100 indicadores, referentes às várias áreas de atuação da administração pública.

A pontuação do IDSC é atribuída no intervalo entre 0 e 100 e pode ser interpretada como a porcentagem do desempenho ótimo. A diferença entre a pontuação obtida e 100 é, portanto, a distância em pontos percentuais que uma cidade precisa superar para atingir o desempenho ótimo. O mesmo conjunto de indicadores foi aplicado a todos os municípios para gerar pontuações e classificações comparáveis. Diferenças entre a posição de cidades na classificação final podem ocorrer por causa de pequenas distâncias na pontuação do IDSC. 

Além da pontuação e da classificação de cada

cidade, o índice também apresenta os Painéis ODS, que fornecem uma representação visual do desempenho – o nível de desenvolvimento – dos municípios nos 17 ODS. O sistema de classificação por cores (verde, amarelo, laranja e vermelho) indica, portanto, em que medida um município está longe de atingir o objetivo. Quanto mais próximo do vermelho, mais distante de alcançar o ODS.   

QUALIDADE DE VIDA 

O Instituto Cidades Sustentáveis atua para o desenvolvimento justo e sustentável das cidades no Brasil. Com duas principais iniciativas, o Programa Cidades Sustentáveis (PCS) e a Rede Nossa São Paulo (RNSP), busca melhorar a qualidade de vida das pessoas a partir do combate às desigualdades, da promoção dos direitos humanos, da participação social, da transparência e da defesa do meio ambiente.

Por meio do PCS, o instituto atua de forma propositiva para a implementação de políticas públicas estruturantes nas cidades brasileiras. O programa oferece uma agenda de sustentabilidade urbana que inclui metodologias, ferramentas e conteúdos de auxílio à gestão pública municipal, incluindo um conjunto de 260 indicadores alinhados aos objetivos e metas da Agenda 2030. Esse material está disponível na Plataforma Cidades Sustentáveis. 

A SDSN acelera o aprendizado conjunto e tem como objetivo ajudar a superar a fragmentação do trabalho técnico e político, promovendo abordagens integradas para os desafios econômicos, sociais e ambientais que o mundo enfrenta. A rede tem um papel especial no aconselhamento à ONU sobre os ODS e a seleção de indicadores adequados para seu monitoramento, que devem representar realidades locais e serem passíveis de comparação em escala global. A Rede também cumpre o papel de desenvolver apoio aos governos e fomentar estudos e pesquisas orientados ao desenvolvimento sustentável – afirmam os organizadores. 

Para alcançar resultados concretos e comparáveis e instalar um sistema de compartilhamento de experiência para enriquecimento de ações, a SDSN Global se desenvolve em redes nacionais e regionais. Essas redes são estabelecidas para acelerar a resolução de problemas práticos para o desenvolvimento sustentável em escala local, regional e nacional. Atualmente existem mais de 40 redes nacionais e regionais, sendo duas delas no Brasil (uma de caráter nacional e outra local, dedicada à Amazônia). 

 

IBGE confirma inchaço

de nossas periferias

 DANIEL LIMA - 05/02/1997

Os novos números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE, anunciados em janeiro, confirmam a tendência de periferização e empobrecimento do Grande ABC, fenômeno que também atinge a Região Metropolitana de São Paulo. O novo censo populacional do IBGE registrou discreto crescimento demográfico de 8,09% da região, levemente superior à média nacional de 7% registrada no período de cinco anos. Visto simplesmente de forma conjunta, o Grande ABC não teria com que se preocupar. 

Mas a história é outra. Apenas Santo André, com 1,27% de crescimento populacional no período, Diadema, com 2,58%, e São Caetano, que teve a inédita taxa de decréscimo de 6,36%, ficaram abaixo da média de evolução nacional. Os demais Municípios da região apresentam taxas volumosas: São Bernardo ficou com 16,25%, Mauá com 16,23%, Ribeirão Pires com 17,16% e Rio Grande da Serra com 16,19%, isto é, mais de o dobro da média brasileira no período.

Os números são piores do que se apresentam se for considerado que o aumento de bolsões populacionais em quatro dos sete Municípios está longe de ter a correspondência de crescimento econômico de uma região que continua perdendo indústrias, sua grande base de sustentação.

Além disso o quadro de trabalhadores é emagrecido com as novas técnicas gerenciais, os investimentos tecnológicos e os efeitos da globalização econômica. Até mesmo Santo André, cuja população cresceu discretamente, viveu no período pesquisado pelo IBGE o fenômeno da periferização. Cada vez mais famílias se deslocam para zonas geográficas menos valorizadas, com infra-estrutura pública deficiente e maior vulnerabilidade no setor de segurança, onde o aluguel e o preço do metro quadrado de terreno têm estreita correspondência com a precarização da qualidade de vida.

Segundo o IBGE, a contagem realizada no ano passado constatou aumento de 21,4% da população favelada em Santo André, que se concentra em 52 núcleos e passou de 53.649 para 65.130 pessoas. Esses números são refrescos se comparados aos de São Bernardo, que conta com maiores áreas de suposta proteção dos mananciais e que, com 658.991 habitantes, passa a liderar o ranking populacional do Grande ABC, ultrapassando Santo André (624.866) pela primeira vez na história.

A explosão demográfica de São Bernardo concentrou-se na periferia e nos mananciais e tem relação também com a praticamente esgotada capacidade de Diadema absorver novas ondas de migrantes, pois é um Município de apenas 32 quilômetros quadrados de área e já densamente povoado. Houve bairros que apontaram crescimento superior a 200%, com invasão de loteamentos. Se em Santo André o crescimento da população favelada já é preocupante, em São Bernardo tornou-se caso gravíssimo, pois alcançou 60,85% entre 92 e 95, período pesquisado pelo IBGE.

No ranking dos maiores bairros de São Bernardo, o classe média Vila Baeta Neves foi destronado pelo quase todo favelado Montanhão. No Censo de 1991 do IBGE, a Vila Baeta contava com 45.598 habitantes, contra 45.204 do Centro (segundo colocado), 44.478 do Bairro Assunção (terceiro), 41.491 do Rudge Ramos (quarto), 38.690 do Ferrazopolis (quinto) e 35.018 do Montanhão (sexto). O Censo de 96 mostrou reviravolta fulminante do ranking. Com 60.878 habitantes, o Montanhão assumiu a liderança, ou seja, um avanço de 74% na taxa de ocupação demográfica.

São Caetano foi a grande exceção do Grande ABC, ao perder oito mil habitantes no período pesquisado. Do total de 149.203 moradores registrados há cinco anos, restaram 141.462. Detentora dos melhores padrões de qualidade de vida e de renda per capita da região, São Caetano tem o custo de imóveis e do metro quadrado muito valorizado. Situação que acaba por favorecer o êxodo diante de um quadro de esfarelamento econômico por que tem passado o Grande ABC.

Da mesma forma que a região vem se ressentindo do esvaziamento econômico, Guarulhos, também pegada à Capital e agora líder no ranking populacional, fora São Paulo, sofreu fortes danos nos últimos cinco anos. Nada menos que 480 indústrias fecharam as portas ou procuraram outros Municípios entre 90 e 95. Guarulhos atingiu total de 969.116 habitantes, um pouco acima de Campinas, e com uma taxa acumulada de 23% de crescimento demográfico.



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